07
de outubro de 2012 | N° 17215
VERISSIMO
Do centrão
desconsolado
A
Turma do Apagador era uma elite, invejada e destratada com a mesma intensidade
No
meu tempo de frequentador de aulas (estudante seria um exagero) era assim. A
não ser quando a professora ou o professor designasse o lugar de cada um
segundo alguma ordem, como a alfabética e nesse caso eu era condenado pelo
sobrenome a sentar no fundo da sala, junto com os Us, os Zs e os outros Vs os
alunos se distribuíam pelas carteiras de acordo com uma geografia social
espontânea, nem sempre bem definida mas reincidente.
Na
frente sentava a Turma do Apagador, assim chamada porque era a eles que a
professora recorria para ajudar a limpar o quadro-negro e os próprios
apagadores. Nunca entendi bem por que se sujar com pó de giz era considerado um
privilégio, mas a Turma do Apagador era uma elite, vista pelo resto da aula
como favoritos do poder e invejada e destratada com a mesma intensidade.
Quando
passavam para os graus superiores os apagadores podiam perder sua função e
deixar de ser os queridinhos da tia, mas mantinham seus lugares e sua pose,
esperando o dia da reabilitação. Como todas as aristocracias tornadas
irrelevantes.
Não
se deve confundir a Turma do Apagador com os Certinhos e os Bundas de Aço. Os
Certinhos ocupavam as primeiras fileiras para não se misturarem com a Massa que
sentava atrás, os Bundas de Aço para estarem mais perto do quadro-negro e não
perderem nada.
Todos
os apagadores eram Certinhos mas nem todos os Certinhos era apagadores, e os
Bundas de Aço não eram necessariamente certinhos. Muitos Bundas de Aço, por
exemplo, eram excêntricos, introvertidos, ansiosos – enfim, esquisitos. Já os
Certinhos autênticos se definiam pelo que não eram. Não eram nem puxa-sacos
como os apagadores nem estranhos como os Bundas de Aço nem medíocres como a
Massa e nem bagunceiros como as Criaturas do Abismo, que sentavam no fundo. Sua
principal característica era os livros encapados com perfeição.
Atrás
dos apagadores, dos Certinhos e dos Bundas de Aço ficava a Massa, dividida em
núcleos, como o Núcleo do Nem Aí, formado por três ou quatro meninas que
ignoravam as aulas, davam mais atenção aos próprios cabelos e, já que tinham
este interesse em comum, sentavam juntas; o Clube de Debates, algumas
celebridades (a garota mais bonita da aula, o cara que desenhava quadrinho de
sacanagem) e seus respectivos círculos de admiradores, e nós do Centrão
Desconsolado, que só tínhamos em comum a vontade de estar em outro lugar.
E no
fundo sentavam as Criaturas do Abismo, cuja única comunicação com a frente da
sala eram os ocasionais mísseis que disparavam lá de trás e incluíam desde o
gordo que arrotava em vários tons até uma proto-dark, provavelmente a primeira
da história, com tatuagem na coxa.
Mas
isso tudo, claro, foi na Idade Média.
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