sexta-feira, 12 de outubro de 2012



12 de outubro de 2012 | N° 17220
DAVID COIMBRA

Sorte na vida

Eu aqui afago com afeto as minhas dúvidas acerca da tese de que o PT perdeu votos devido ao julgamento do mensalão. Suspeito que quem está desiludido com o PT já o estava ANTES do julgamento.

O que o PT tinha, e não tem mais, era o idealismo. Foi essa a imagem que tornou o PT atraente e poderoso. Projeto, projeto, o PT nunca teve. Não era um partido comunista, de jeito nenhum. Há padres, grandes empresários, capitalistas de todos os matizes que são petistas acerbos. O que, exatamente, o PT era?

Lula, que é maior do que o PT, nem de esquerda se pode dizer que foi algum dia. Lula, se vivesse nos anos 40, seria um Perón, um Getúlio. Com a sensibilidade e a inteligência de um Perón e de um Getúlio, soube alçar-se ao poder.

Compreendeu que, nessa escalada, precisava fazer algumas concessões. Entre elas, o idealismo do PT. Porque ser idealista significa mover-se por valores que estão acima de ganhos. Lula queria ganhar. Para ganhar, havia de sacrificar certos valores. Lula ganhou. Lula é um vencedor. Um dos maiores da história do Brasil.

Os brasileiros compreenderam isso, o que os fez estimar Lula e desiludir-se com o PT. Logo, calculo que o PT perdeu muito pouco com o julgamento, exatamente porque não havia muito mais a perder. Lula? Lula não perdeu nada. Como já disse, Lula sabe ganhar.

Li que o ministro Lewandowski foi vaiado em um aeroporto e que, temendo a violência popular, pediu reforço em sua segurança. Isso porque estaria sendo brando em seus julgamentos no caso do mensalão.

Li também que o ministro Joaquim Barbosa, ao contrário, transformou-se em ídolo pop. As pessoas o abordam na rua para cumprimentá-lo e as crianças pedem para tirar foto ao seu lado. Isso porque estaria sendo duro em seus julgamentos no caso do mensalão.

Tais informações fazem concluir que José Dirceu está certo: houve prejulgamento no caso do mensalão. Parte da imprensa e parte da população condenaram os réus a priori. Mesmo sem conhecer as minudências do processo, como Barbosa e Lewandowski conhecem, os brasileiros exigem a condenação dos acusados.

Talvez a maioria dos brasileiros esteja certa. O problema é que talvez não.

Ver um juiz de notório saber, como Lewandowski, absolvendo, e outro de notório saber, como Joaquim Barbosa, condenando, vê-los a ambos, tão respeitáveis e tão bem preparados, fazendo interpretações de tal forma distintas do mesmo processo, ver isso me deixa aflito. Como me deixou aflito saber que um juiz liberou os assaltantes que atiraram naquela senhora no Bom Fim, enquanto outros juízes os prenderiam.

Sou amigo muito próximo de alguns juízes e desembargadores. Por isso, sei que os magistrados, em geral, tentam ser técnicos na administração da Justiça. Mas, ainda assim, a amplitude de possibilidades de interpretação da lei me deixa inseguro.

Você tem uma pendência e apela para a Justiça. Você precisa mais do que uma boa causa e um bom advogado. Você precisa de um bom juiz. Se você for acusado, torça para pegar um Lewandowski; se você for acusador, torça para pegar um Joaquim Barbosa.

Mais do que mérito, é preciso ter sorte na vida.

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