30
de outubro de 2012 | N° 17238
CLÁUDIO
MORENO
O sol e a sombra
Dentre
as inúmeras histórias, verdadeiras ou inventadas, que a Antiguidade nos legou,
talvez nenhuma seja tão conhecida quanto a visita que Alexandre Magno fez a Diógenes,
o filósofo maltrapilho, no ano de 336 antes de Cristo.
Nunca
teremos um relato definitivo deste encontro notável, já que nem um, nem outro
deixaram qualquer registro das palavras que trocaram naquele dia. Foi a partir
do depoimento de algumas testemunhas que escritores, pintores e historiadores
construíram, ao longo dos séculos, uma verdadeira teia de versões, que diferem
no detalhe mas concordam no principal.
A
divergência entre os vários relatos não conseguiu diminuir a importância da
cena, pois ali se encontraram, frente a frente, um grande filósofo e um grande
guerreiro. Nada podia ser mais simbólico: de um lado, um dos maiores sábios de
toda a Grécia, que passou a vida demonstrando sua aversão por qualquer espécie
de poder; do outro, o jovem macedônio, que seria conhecido e respeitado por
todo o Mundo Antigo como o maior chefe militar de todos os tempos.
É Plutarco
quem conta: tendo conquistado a Grécia, Alexandre, que já conhecia o renome de
Diógenes, foi a Corinto para vê-lo. Os políticos locais receberam-no com honras
de chefe de Estado, assim como os filósofos – menos Diógenes, que parecia não
dar a mínima para sua presença na cidade.
Alexandre,
magnânimo, não se importou em inverter o protocolo, indo ele mesmo, com uma
pequena comitiva, procurar o filósofo, que tomava sol no meio da rua, num subúrbio
da cidade. Ao ver o grupo que se aproximava, Diógenes soergueu-se sobre os
cotovelos e fitou serenamente o rei, que o saudou polidamente e perguntou se
poderia fazer alguma coisa por ele.
“Sim”,
respondeu Diógenes, “sai da minha frente, que estás fazendo sombra para mim”. Alexandre
ficou tão impressionado com aquele despojamento e aquela corajosa altivez que,
no caminho de volta, teria confessado aos companheiros, que riam da
excentricidade do filósofo: “Pois eu, se não fosse Alexandre, juro que gostaria
de ser Diógenes”.
Lições
como esta sempre deixaram bem claro que, para os antigos, a sabedoria na vida não
significa necessariamente profundos conhecimentos teóricos, mas antes um
inconfundível espírito soberano, capaz de resistir serenamente às sereias do
poder e da ambição, que sempre atraem os incautos para os recifes da incerteza.
Alexandre,
que, antes de ser soldado, tinha sido discípulo dileto de Aristóteles, deve ter
compreendido perfeitamente o que Diógenes, à sua maneira, acabara de lembrar: o
conhecimento é um sol que nos aquece; o poder, este, sempre será uma sombra.
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