17 de outubro de 2012 |
N° 17225
MARTHA MEDEIROS
Simples
“Afugento qualquer pretensão
filosófica que dificulte o trato com as coisas simples.” Quando li essa frase
de Nélida Piñon, tive vontade de ampliá-la, imprimi-la e pendurá-la na parede,
só não o fiz porque não seria preciso: trago esse conceito já aderido na pele e
na alma.
Talvez por isso tenha gostado
tanto do novo livro do David Coimbra, Uma História do Mundo, que poderia ser
considerado um projeto ambicioso, não fosse o David um homem consciente do
tempo em que vive: quem, hoje, consegue dedicar-se a calhamaços com milhares de
páginas? A vida exige dinamismo. David conseguiu apresentar um panorama
histórico desde o neandertal até o início da civilização moderna em 260 páginas.
E, nessas 260 páginas, além de
traduzir informações sérias para uma linguagem divertida, ele conecta passado e
presente utilizando trechos de Marcel Proust, Charles Bukowski e Mario
Quintana, e ainda faz graça ao explicar de onde veio o nome da banda Jethro
Tull. David é pop. A história do mundo também pode ser. Como?
Simples.
A simplicidade é a principal
porta de entrada para a sabedoria. Dois, três degraus, e a pessoa está dentro.
Uma vez seduzida, ela então irá decidir se deseja se aprofundar no assunto, e
aí, lógico, irá buscar novos acessos que a façam imergir no que lhe interessa,
e a viagem se tornará ainda mais excitante e talvez ininterrupta, mas o que a
faz iniciar esse percurso rumo ao conhecimento é a curiosidade, a atração e a
identificação com um linguajar que estabelece uma agradável comunicação.
O professor Cláudio Moreno faz o
mesmo com suas crônicas sobre a Grécia Antiga. Alain de Botton elimina ao menos
seis cabeças do monstro de sete que sempre foi a filosofia. Paulo Leminsky e
demais poetas da geração anos 80 demonstraram que poesia não precisava ser
necessariamente chata e incompreensível. A simplicidade sempre foi um dom,
apesar de levantar suspeitas.
Os impressionistas (Van Gogh,
Monet, Cézanne, entre outros) foram inicialmente desprezados pelos críticos da
época. As primeiras exposições desses artistas que hoje são considerados gênios
se deram no “Salão dos Recusados”. Os impressionistas eram assim denominados
porque pintavam a impressão em detrimento do detalhe. E toda impressão pode ser
rapidamente confundida com impostura.
A simplicidade concentra a
verdade das coisas – não toda a verdade, mas o seu núcleo, um ponto de partida
universal, de onde tudo poderá se tornar mais abrangente, grandiloquente e
complexo, à escolha do freguês.
Segundo o filósofo e escritor
Eduardo Gianetti, muita gente só se impressiona com o que não entende bem. Já a
simplicidade é direta, translúcida e estabelece rápida conexão. Para desconsolo
dos herméticos.
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