quarta-feira, 10 de outubro de 2012



10 de outubro de 2012 | N° 17218
MARTHA MEDEIROS

Porto Alegre – Belém: 4 mil quilômetros

É comum ressaltarem a distância que existe entre o sul e o norte do país. Já estive em algumas capitais do Nordeste, mas, por seu apelo turístico, essas cidades dão uma sensação de inclusão, nem que seja inclusão dentro de um cartão-postal. Mas agora conheci Belém do Pará, e isso sim é estar longe de casa.

A começar pelo vocabulário gastronômico. Cupuaçu, tacacá, tucupi, tambaqui, maniçoba, pupunha. Nunca vi tanta variedade de sabores. Me rendi ao delicioso peixe filhote e ao arroz de jambu, e provei o sorvete de bacuri achando graça, já que para nós bacuri não é fruta, e sim o jeito que chamamos a molecada. Sorvete de bacuri. Mais estranho que isso, só mesmo bombom de queijo. Voltei de lá quase com o mesmo shape da Gaby Amarantos, pois uma entre tantas cordialidades do paraense é presentear com chocolates. Vivi por quatro dias uma Páscoa fora do calendário.

Só que agora é época de celebração ainda mais importante: o Círio de Nazaré, que acontece no próximo domingo. A religiosidade do povo é atávica. Diziam: “Fique pra ver, você não pode imaginar o tamanho da festa”. São 2 milhões de pessoas na rua, acompanhando a procissão agarrados a uma corda de sisal de 400 metros de cumprimento, todos grudados em sua fé. E grudados também pelo calor.

De madrugada os termômetros marcam 24 graus, a temperatura mínima deles. Às 8h, já se está perto dos 30, e daí pra frente, só com ar-condicionado ou vira-se mingau. Invariavelmente, chove no meio da tarde. E não chove pouco, cai uma água decidida. Pode-se acertar o relógio pela pontualidade da enxurrada.

A cidade tem lindas edificações portuguesas, principalmente em torno da Praça do Relógio, mas podia ser mais limpa. O centro de compras mais concorrido é o famoso mercado Ver-o-Peso, onde se encontram frutas, verduras, peixes, ervas, amuletos, artesanato e muitos visitantes – menos a visita da Vigilância Sanitária, ouvi dizer. Pitoresco.

O que fui fazer nesse fim de mundo? Participar da Feira Pan-Amazônica do Livro, e ao entrar no Hangar, o moderno Centro de Convenções da cidade, ficou evidente: fim de mundo é não ler. Eram inúmeros expositores reunidos em uma megaestrutura, e um vasto público adolescente prestigiando não só os livros, mas as apresentações de música, dança e teatro que aconteciam sem parar.

Um evento grandioso e agregador, o quarto mais importante do Brasil. Não esperava tanta efervescência, e menos ainda que minhas linhas fossem populares junto à linha do Equador. A receptividade foi a mesma que costumo ter no Sul. Lembrei que sou gaúcha de sangue índio, e me senti em casa.

Só a dona de uma loja de discos é que não foi com a minha cara. Tentou me empurrar a Banda Calypso, mas acabei levando um CD de jazz. Pareceu provocação. Espero que ela tenha me perdoado. Falta de molejo, sim, é que é tecnobrega.

“Fim de mundo é não ler” não é sacada minha, e sim o genial slogan do último Salão do Livro do Piauí, que também fica longe à beça.

Nenhum comentário: