20
de outubro de 2012 | N° 17228
NILSON
SOUZA
O nome do
feitiço
Acompanhei,
de longe mas atento, o recente encontro da Sociedade Interamericana de Imprensa
realizado em São Paulo. Em meio ao catastrofismo geral dos editores de jornais,
captei uma frase alentadora do professor Rosental Calmon Alves, que foi meu
contemporâneo no Jornal do Brasil e hoje leciona jornalismo na Texas University,
dos Estados Unidos. Disse ele para uma plateia de profissionais assustados com
o cenário de incertezas resultante da transição aparentemente inexorável do
papel para a web:
– O
contador de histórias é eterno. Existe desde o tempo das cavernas.
Por
coincidência, na mesma noite em que li a declaração de meu companheiro de
ofício, vi um filme sobre o início da carreira literária da autora de Harry
Potter, Joanne Rowling, mais conhecida por J. K. Rowling, assinatura adotada –
segundo a história – para evitar que leitores meninos rejeitassem o livro
escrito por uma mulher.
O
filme Magia além das Palavras, descrito como uma biografia não autorizada da
escritora, relata as incontáveis vezes em que ela encontrou fechadas as portas
das editoras para as quais mandou o manuscrito de Harry Potter e a Pedra
Filosofal, primeira obra da série do menino bruxo que a tornou célebre e rica.
Depois
de várias rejeições, um avaliador mais sensível encantou-se com o texto e a
mulher decolou para o sucesso. Mais do que isso, seus livros despertaram o
gosto pela leitura em milhões de crianças e adolescentes em todo o mundo,
destruindo a tese pessimista de que a Era de Gutenberg havia chegado ao fim.
O
que esses livros têm de especial? A resposta é tão óbvia quanto emblemática:
boas histórias. Harry Potter é uma aventura surpreendente, que prende o leitor
em cada página como se lançasse sobre ele o feitiço paralisante (Immobulus, na
linguagem da bruxaria). Pelo menos comigo foi assim.
Sei
que tem gente que não gosta, muitos sem sequer terem aberto um dos livros da
série, mas tudo bem. O importante é que a garotada adorou, meninos e meninas de
10 anos leram volumes de mais de 600 páginas, sem pressão de ninguém, sem a
obrigação de fazer ficha de leitura, sem o risco de levar zero em literatura.
Talvez
o jornalismo esteja precisando de magia semelhante para conter a debandada de
leitores para o mundo online. Em vez disso, estamos nos juntando à manada. Se
todos estão indo para lá, vamos também. E dê-lhe multimidiar, mesmo que os
conteúdos sejam rasos como poças d’água no asfalto. “O último é a mulher do
padre”, como gritava um dos meus amigos de molecagem quando a turma resolvia
trocar de brincadeira. Ninguém quer ficar para trás, ninguém quer parecer
retrógrado. Será?
Riddikulus
é o nome de outro feitiço inventado por dona Rowling. É utilizado pelos
bruxinhos para transformar o Bicho-Papão em algo menos aterrorizante ou mesmo
em algo engraçado. Acho que estamos precisando dessa magia, para continuar
contando histórias que emocionam, que surpreendem e que não deixam os leitores
fugirem para o desconhecido.
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