segunda-feira, 22 de outubro de 2012



22 de outubro de 2012 | N° 17230
LUIZ ANTONIO DE ASSIS BRASIL

Homem-massa

“Vivemos sob o brutal império das massas!” – eis o refrão do espanhol Ortega y Gasset (1883 – 1955). Falamos da década de 30 do século passado. Ortega foi, no Brasil dos anos 50-60 do mesmo século, uma espécie de enfant terrible da filosofia.

Todos o liam. Sua mensagem era forte, original. Mesmo nas escolas católicas progressistas ele era objeto de estudo e provas. Esse ardor, entretanto, arrefeceu nas décadas seguintes, substituído por outros pensadores que inventavam a pólvora e possuíam forte presença midiática. Foi uma pena, porque reler Ortega é constatar o quanto suas ideias não morreram.

Esse é o fio condutor de um livro de Jéferson Assumção recém-lançado pela Bestiário: Homem-massa: A Filosofia de Ortega y Gasset e sua Crítica à Cultura Massificada. Não se trata de uma obra de louvor ao filósofo, mas uma reflexão e, diríamos nós, uma atualização de sua doutrina, aplicando-a aos dias que correm. Assim Jéferson Assumção institui uma nova taxionomia, ao falar no “pós-homens-massa”, articulando-a com os modernos meios digitais.

Segundo Assumção, o homem de hoje potencializa sua desagregação massificada, levando-o a ter uma conduta que se imola à parafernália tecnológica e, assim, passa a ser “homem-massa customizado, o que significa dizer que na aparência esse homem é diverso – sob o influxo das modas estilísticas – mas, na verdade, é tão massificado quanto no tempo de Ortega, “inautêntico e diminuído ao elemento fundamental do consumidor, em vez de responsável por fazer sua própria vida [...] pois segue sendo educado pelo mercado e pelos usos da sociedade desvitalizada pelo pragmatismo utilitarista, materialista e agora pela internet para se comportar como massa, invertebrada e vaga”.

Por outro lado, não podemos diabolizar o tempo que corre, pois, como nunca hoje é possível visibilizar culturas anônimas que não possuem o glamour das culturas hegemônicas, mas são igualmente fortes e dotadas de intensa identidade.

A solução, proposta por Jéferson, deve ser encontrada na oposição entre essas duas circunstâncias; disso resultará a consciência de que podemos ser massa, mas podemos discuti-la à luz dessas novas tecnologias tendentes à massificação. O que era um problema dicotômico pode revestir-se de complementariedade e opções de escolha: nem somos condenados a uma redutora autonomia que gira em torno de nosso umbigo, nem precisamos sucumbir ao vórtice cruel da contemporaneidade massificadora.

Em suma: é Ortega de volta, e pela mão de quem o conhece e sabe interpretá-lo.

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