terça-feira, 30 de outubro de 2012



30 de outubro de 2012 | N° 17238
PAULO SANT’ANA

Eu sou um imbecil

Resolvi parar um pouco para pensar.

Será que não estou com a razão?

Acontece que recebi cerca de 40 mensagens de leitores que afirmam categoricamente que aprovam que os presidiários gaúchos morram de doenças ou enforcados por seus colegas.

Não são poucas nem eventuais as mensagens, elas se posicionam de modo enérgico a favor do morticínio nos presídios.

Muitas dessas mensagens dizem taxativamente que “são poucos os presos que morrem nos presídios do RS” (120 por ano, segundo ZH).

Declaram que tinha de morrer muito mais pelos crimes que cometem contra a população.

Não há nenhum equívoco, elas querem que os presos sejam maltratados, que morram por doenças e sejam enforcados (a maioria dos que morrem assassinados pelos outros presos dentro da prisão é pela via do enforcamento).

Eu preciso realizar uma profunda reflexão. Certamente, essas pessoas que me escrevem desse jeito são gente de bem, trabalhadora, têm família etc.

Então eu penso: será que não sou eu que estou errado? Será que os governantes e as autoridades penitenciárias estão com razão ao permitir esse holocausto?

Sinceramente, estou duvidando dos meus princípios e de que eles não são de humanidade.

Eu devo estar errado. Essa gente toda que me escreve é que está certa, preso tem de ser escorraçado e tem de morrer.

É muita gente escrevendo com este ponto de vista. A maioria, já que escrevi que não durmo direito com essas milhares de mortes em 10 anos, respondeu-me dizendo que eu não tenho de dormir direito por causa das pessoas assaltadas e assassinadas pelos presos.

Nem sei quem são os presos que morrem nas prisões, não sei que crime cometeram, podem ter sido delitos leves.

Mas os que escrevem aprovando o genocídio não querem nem saber que crimes cometeram os presos mortos ou assassinados. Eles não só querem que eles continuem a morrer por doenças e assassinatos como também acham que são poucos, que muitos mais deveriam morrer por essas razões.

Dou-me finalmente por vencido. Eu é que estou errado e os que me escrevem estão certos.

Porque chega uma hora em que a gente, que pensa de um jeito, tem de refletir que está errado e certos são os que querem os presos torturados, doentes de morte e assassinados.

Esta gente é respeitável e sou obrigado a acatar a sua opinião.

Não adianta mandar contra a maré. Se isso é o que pensa a sociedade, é assim que tem de ser feito. Deve-se respeitar a maioria. E a maioria prega a desgraça dos presos. Eu já tinha de ter desconfiado disso quando só encontrei indiferença entre os gaúchos, durante 41 anos, quando eu defendi bons tratos para os presos, o que não queria dizer absolutamente que não tinham de pagar por seus delitos.

Ou eu fui educado erradamente, ou, então, eu estou pensando errado, o meu raciocínio não está batendo certo. Afinal, chega um dia em que a gente tem de fazer um exame de consciência e ter a humildade de considerar que se está errado.

Está bem, vocês venceram, os presos têm de passar fome, têm de morar em esgotos, têm de ser maltratados, têm de não ser atendidos em suas doenças e têm de ser assassinados.

E eu me declaro solenemente um imbecil.

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