08
de outubro de 2012 | N° 17216
L.
F. VERISSIMO
Choques do
novo
Na
noite de 29 de maio de 1913, quase tiveram que chamar a polícia para conter uma
revolta que começara no interior do Theatre des Champs-Elysees em Paris e
ameaçava transbordar para a rua. A revolta era da plateia contra o balé Ritos
da Primavera, de Igor Stravinsky, com coreografia de Nijinski para o Ballet Russe,
de Sergei Diaghilev.
Não
se sabe o que provocou as primeiras manifestações de desagrado da plateia, que
foram num “crescendo” até se transformarem em rebelião: se a música de
Stravinsky ou a coreografia de Nijinski. Suponho que o balé tenha ido até o fim,
apesar das vaias e da iminência de invasão do palco pelo público, com o risco
de linchamento de bailarinos.
Hoje
você ouve a música de Stravinsky e não consegue entender o que revoltou tanta
gente. E não dá para imaginar uma coreografia tão estranha que destoasse do que
se vê hoje em qualquer palco. O que aconteceu com a plateia no Theatre des
Champs-Elysees na noite de 29 de maio de 1913 foi o mais notório exemplo do
choque do novo na história da arte.
Criadores
incompreendidos que precisaram esperar anos para o reconhecimento da sua
novidade foram muitos, mas nenhum episódio reverberou tanto, na sua época e
depois, quanto a violenta rejeição de Ritos da Primavera. Até se pode dizer que
a revolta da plateia naquela noite de primavera foi uma espécie de rito de
passagem. Depois dela, nenhum choque do novo foi tão grande, ou pelo menos tão
barulhento.
Qualquer
vanguardista lhe dirá que fica cada vez mais difícil espantar a burguesia.
Coisas como a exposição de animais esquartejados como arte podem enojar, o que
não é o mesmo que chocar. É como se tivesse ficado na nossa memória coletiva o
comportamento daquela plateia em 1913 e nos preocupássemos em não repetir o
vexame. Nada mais nos choca, e se chocasse não diríamos.
Mas
também não deixa de haver uma certa nostalgia pelo tempo em que a arte nova
despertava paixões, mesmo paixões reacionárias. E ela tinha uma importância que
perdeu, agora que se aceita tudo.
TCHAU
Vou
parar de escrever. Mas não festeje, é só por um mês. Férias. Volto no dia 8 de
novembro. Até lá.
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