segunda-feira, 29 de outubro de 2012



29 de outubro de 2012 | N° 17237
J. A. PINHEIRO MACHADO

A vitória do bife com ovos e batata frita

Paris

Na França, a boa gastronomia não é uma pose. Sentar à mesa para uma boa comida e um copo de vinho, antes de tudo, é um fator de unidade nacional. É o prazer que, desde sempre, estabeleceu uma invisível mas poderosa linha de aproximação entre os reis mais poderosos e os plebeus mais desafortunados. No país, não há preconceito contra nenhum tipo de comida. Não por acaso, a segunda maior operação mundial do McDonald’s, depois dos Estados Unidos, é exatamente na França.

Da mesa real ao banquete republicano, os franceses perceberam, há séculos, o poder universal da boa mesa, nas ceias tardias e nas refeições mais íntimas, para a troca de confidências e a expressão de sentimentos. Jean-Robert Pitte, um historiador ilustre, não hesita em colocar a boa gastronomia como pilar essencial da grandeza do país. A propósito, Pitte lembra Brillat-Savarin que aconselhava os reis: “As refeições podem ser um meio de governar”.

Poucos franceses compreenderam tão bem esse fenômeno nacional como o chef Joël Robuchon, que, além da sua “oficina” na Etoile e do Atelier da Rue Montalembert, no 7º arrondissement de Paris, comanda restaurantes em Mônaco, Tóquio, Macau, Las Vegas, Nova York, Londres e Hong Kong. Mas, atenção: não são franquias.

O comando é pessoal, com virtudes evidentes, mas obriga-o a passar mais tempo em aviões do que propriamente na cozinha. O esforço vale a pena. No conjunto, seus restaurantes já conquistaram 28 estrelas na avaliação implacável dos tribunais mais temidos do país: os guias de restaurantes, Michelin à frente.

Na semana passada, um documentário na TV francesa fez a justa celebração desse ícone nacional. Começando nos anos 1980, Joël conquistou a glória máxima das três estrelas do Michelin apenas três anos depois de abrir as portas. Em 1994, seu restaurante foi consagrado com o título de Melhor do Mundo pelo International Herald Tribune.

É difícil apontar uma só das razões do triunfo desse trabalhador infatigável. Talvez uma delas seja o fato de jamais ter abandonado a sua raiz popular, transformando um simples purê de batatas numa das elaborações mais espetaculares das mesas mais refinadas do mundo.

Outro best-seller das mesas de Robuchon é a surpreendente geleia de caviar e couve flor, com adeptos fervorosos em todos os continentes, cujo sabor já foi considerado pelos críticos mais severos como “inexcedível”.

Talvez o sucesso dessa delicada especialidade seja realizar uma síntese pessoal do famoso chef, combinando o caviar, uma iguaria clássica da aristocracia, com a couve flor, um legume que o proletariado adora. Coerente com essa síntese admirável, diante das câmaras da TV, Joël Robuchon não se constrangeu em revelar seu prato favorito, sua escolha diária, no almoço e no jantar: bife com ovos e batata frita. Um cardápio que, muito mais do que caviar e couve flor, sem dúvida aproxima príncipes e plebeus.

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