CARLOS
HEITOR CONY
Palavras, palavras
RIO
DE JANEIRO - Aprendi alguma coisa de útil ao acompanhar os debates no STF da ação
penal 470. A começar pela dicotomia do assunto, que para alguns era o mensalão
e, para outros, a própria ação penal 470. A lição que aprendi, tardiamente, é a
fragilidade dos sinônimos -que, em linguagem verdadeira, não existem.
Enquanto
na literatura o uso de sinônimos é recomendado, e as boas metáforas são
permitidas e até elogiadas, na linguagem jurídica cada palavra tem significado
próprio, exclusivo. Shakespeare repetia vocábulos ("words, words, words").
Gertrude Stein não fez por menos: "A rosa é uma rosa, uma rosa". Apollinaire
comparou as nossas incertezas humanas aos caranguejos; terminou sua famosa
estrofe com uma repetição: "à reculons, à reculons" -recuamos,
recuamos.
Pulando
para o STF: no julgamento relativo à formação de quadrilha, o Ministério Público
falou em "quadrilha" e "associação" -obrigando o revisor do
processo a absolver os acusados. Em textos literários, as duas palavras podem
ser entendidas como sinônimos. Na austeridade do texto jurídico, são
completamente diversas.
A
Associação Brasileira de Imprensa e a Associação Cristã de Moços não podem ser
consideradas quadrilhas, que são associações permanentes ou eventuais com o
objetivo de cometer crimes. Como citaram vários ministros, são "societas
sceleris".
Repetir
palavras é considerado crime em literatura. Há o caso do repórter que foi
advertido pelo seu chefe a respeito de repetições.
Na
reportagem seguinte, o rapaz foi cobrir a agressão de um pescador que sovou a
mulher por causa de peixes. No texto do repórter, está dito que "João da
Silva chegou da pescaria, jogou na pia uma fiada de peixes e pediu: 'Mulher,
frite os mesmos'".
Nenhum comentário:
Postar um comentário