Esta
coluna foi veiculada no dia 10 de agosto de 2003.
21
de outubro de 2012 | N° 17229
VERISSIMO
Champignons
recheados
Tinham
se separado, mas mantinham relações cordiais ou, como as descrevia o Marcelo,
saudavelmente hipócritas. Encontravam-se para tratar dos papéis do divórcio, da
venda do apartamento, etc., e conversavam civilizadamente. O que era
surpreendente, já que o casamento terminara com a Helena ameaçando atirar uma
frigideira na sua cabeça.
Foi
numa dessas conversas civilizadas que a Helena, depois de hesitar, finalmente
pediu. Iria receber umas amigas para jantar. Será que o Marcelo poderia fazer
os champignons recheados para ela servir?
Marcelo
não respondeu logo. Ficou saboreando o momento e pensando em várias respostas
que poderia dar. Ah, quer dizer que a frase que voou na direção da minha cabeça
junto com a frigideira, “E leve as suas malditas receitas!” foi esquecida?
Antes de escolher a resposta, Marcelo ganhou tempo.
–
Quem são as amigas? – Você não conhece. Marcelo sorriu. Escolhera uma resposta
irônica.
–
Você ainda tem aquela frigideira?
Combinaram
que a Helena compraria os ingredientes e deixaria na sua cozinha. O Marcelo
iria lá à tarde, prepararia os champignons e deixaria instruções sobre como
aquecê-los. Prevendo que Helena banira qualquer coisa que pudesse lembrar as
suas “malditas receitas”, Marcelo levou seu próprio jogo de facas e os esqueceu
na casa da ex-mulher. Foi buscá-lo na manhã seguinte.
Helena
custou a atender ao interfone. Recebeu-o na porta do apartamento de camisola e
com cara de sono. Não, não sabia que já eram 11h, fora dormir tarde. Ele tinha
esquecido o que mesmo na cozinha?
–
Facas, facas. – Entre.
A
mesa do jantar ainda estava posta. Para dois. Duas garrafas de vinho vazias,
uma emborcada. Dois copos, dois pratos de sobremesa e um cinzeiro sujos.
–
Era só uma? – Uma o quê?
–
Amiga. – Ah. Sim.
Helena
ficou em silêncio. Marcelo fez um sinal com a cabeça na direção do quarto de
dormir. Perguntou:
–
Ele ainda está aqui?
–
Não! Só jantou e foi embora. Eu não...
–
Muito bem. Então eu preparei o alimento para você dar a outro homem. Fui o
fornecedor no meu próprio corneamento.
–
Ninguém corneou ninguém, Marcelo. E eu recebo quem eu quero e dou comida para
quem eu quero!
– Os
meus champignons recheados, não senhora!
–
Pois quer saber? Ele odiou! – O quê?!
–
Odiou. Disse que já comeu muito melhores.
–
Ah, é? Ah, é?
No
fim daquela tarde, Marcelo telefonou para Helena. E pediu:
–
Convida ele de novo.
–
Quem? – O cara de ontem. – Eu não!
–
Convida, Heleninha. Pensei em fazer meu suflê de quatro queijos.
– Eu
não tenho a menor intenção de convidar ele pra jantar outra vez.
–
Pô, Heleninha. Ele merece outra chance. E eu também.
A
Helena cedeu. Só não aceitou o pedido do Marcelo para ficar escondido na
cozinha e espiar o homem comendo o seu suflê e talvez gemendo de prazer.
Perversão, não.
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