30
de outubro de 2012 | N° 17238
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Quanto mais .............. pior
Meu
amigo Daniel superou 40 dias de luto da separação, aguentou no osso o divórcio,
chorou horrores e debulhou suas lágrimas em copos de bourbon, parou de atender
ao telefone e se trancou no quarto.
No 41º
dia, ele ressuscitou. E voltou a sair e se divertir. Já estava esquecendo o
quanto amava sua ex. Já estava esquecendo que foi amado pela ex.
Um
homem somente apaga um amor no momento em que encontra outro. Daniel se
enamorou por uma bancária. Badalou vários finais de semana com Heloísa, ria com
a franqueza de um adolescente.
Apaixonado?
Sim, mas seria o último a saber. Todo apaixonado é o último a saber que está apaixonado.
O mundo inteiro sabe, menos o próprio apaixonado. Não adiantava contar a Daniel
que ele estava apaixonado, ele jamais me escutaria. O apaixonado é surdo também.
Para
comemorar a nova fase de sua vida, Daniel convidou Heloísa para almoço em
restaurante francês nos fundos de um casarão.
Ele
pediu cordeiro com purê de beterraba; ela, filé mignon com acompanhamentos
silvestres.
Ele
pediu um vinho chileno; ela avisou que não poderia beber (pois ainda iria
trabalhar), e se contentou com uma Coca-Cola.
– Coca-Cola
light?
– Não,
senhora, só temos Zero – avisou o garçom.
– Ok,
não vou me desesperar por um detalhe – replicou.
O
casal soltou os braços sobre a toalha para diminuir a distância das cadeiras,
ambos se olhavam firme e forte numa hipnose infindável, hipnose à moda antiga,
de relógio de bolso balançando.
A
mesa estava sobrando entre os dois. Ele se debruçava no prato para arrancar um
beijo, ela se levantava para acariciar sua testa. Nada poderia estragar aquele
bem-estar. Quase nada.
Mas
quando a Coca pousou na mesa, Heloísa gelou, derrubou o arranjo de flores e
fugiu para o banheiro soluçando a seco.
Ele
olhou a Coca com calma: Será que tinha uma barata?
Não
achou coisa alguma, até que leu um nome. A marca decidiu homenagear seus
consumidores nas latinhas.
Era
o nome de sua abominável ex: Carolina.
“Quanto
mais CAROLINA melhor”
Heloísa
não aguentou a provocação, ardia de ciúme do passado dele.
Quando
um refrigerante faz uma campanha dessas, não cogita de que existem desafetos no
mundo, ódio familiar, revolta interior, tristeza reprimida, viuvez, gente que
levou o fora ou foi corneado ou enganado. Imagina apenas que todos se gostam e
que todos vão adorar ver seu nome ou de sua namorada na embalagem.
Daniel
amaldiçoou o azar, criou teorias da conspiração, não duvidou da perseguição da
megera, cogitou a hipótese de ela subornar o garçom para trazer aquele
refrigerante.
– Como,
entre milhares de opções, surge em minha mesa logo o nome daquela vagabunda?
Não
poderia responder. Heloísa recusou carona e seguiu sozinha para o emprego. Não
havia mais felicidade para ser dividida.
Do
copo dela, só ficou o limão.
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