sábado, 30 de dezembro de 2017




42% das mulheres relatam ter sofrido assédio sexual, aponta Datafolha



Eram 5h40, ainda estava escuro. Maria, 45, caminhava as três quadras diárias até seu carro para mais um dia de trabalho quando um homem de moto parou ao seu lado. "Eu quero você", disse, sem rodeios, e começou a atirar dezenas de notas de dinheiro em sua direção. "Faz um boquete que eu te dou toda essa grana", ele falou. Depois desceu da moto e tocou em seus seios e em sua genitália. Só a soltou quando ela começou a chorar e implorar para que parasse.

Maria, que teve seu nome alterado para não ser identificada, não foi a única vítima desse assediador. "O guarda da rua disse que depois ele fez isso com mais cinco pessoas", conta ela. Tampouco foi a primeira ou a última vítima de assediadores no país.

Quatro em cada dez brasileiras (42%) relatam já ter sofrido assédio sexual, aponta pesquisa nacional do Datafolha –com 1.427 mulheres entrevistadas e margem de erro de dois pontos percentuais.

ASSÉDIO SEXUAL
Para especialistas e representantes de grupos feministas, o número não surpreende. Elas dizem, inclusive, que a quantidade real de vítimas deve ser maior, mas que há receio delas de contar e também falta de percepção do que é assédio ou não.

"O assédio sexual tem um problema que é a falta de entendimento de que ele é uma violência. As mulheres vivenciam isso, mas entendem que é algo que faz parte de ser mulher.

Essa identificação precisa ser trabalhada", afirma Juliana de Faria, fundadora da ONG Think Olga. Os dados ligados ao tema costumam variar em diferentes pesquisas. Um estudo feito em 2016 pela organização ActionAid, por exemplo, mostrou um índice ainda maior: 86% das 503 brasileiras entrevistadas já haviam sofrido assédio em público.
Datafolha assédio
LOCAL, RENDA E COR
O levantamento do Datafolha mostra que um terço das mulheres (29%) conta ter sido assediada na rua, e um quinto (22%), no transporte público. O trabalho é citado por 15%, a escola ou faculdade, por 10%, e a violência em casa, por 6%. Uma mesma entrevistada pode ter relatado mais de um tipo de assédio.

Além das mais novas, quem sente mais o problema são as mais escolarizadas e as que têm maior renda familiar. Segundo a promotora Maria Gabriela Manssur, isso pode ser explicado principalmente pelo acesso à informação.

"A falta de campanhas educativas, de acesso à Justiça e de coragem para denunciar entre as mais pobres influencia. Elas podem perder o emprego, além de sofrer um julgamento social ainda maior."

A delegada Sandra Gomes Melo, chefe da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher do Distrito Federal, ressalta que, apesar de haver uma diferença nos tipos e locais de violência, todos os estratos de mulheres sofrem assédio.

"A violência não escolhe só a pobre, só quem tem escolaridade, só a mais nova. Talvez a mulher rica não vá sofrer tanto nos meios de transporte, porque não usa, mas vai sofrer no trabalho, por exemplo."

A cor da pele, porém, é um fator influente. Entre as pretas e pardas, aproximadamente 45% dizem já ter sido assediadas, ante um índice de 40% entre as brancas.

"A mulher negra, como é hipersexualizada, sofre um assédio mais incisivo. O local dela não é o da beleza, é o de suprir necessidades carnais. Há uma dupla discriminação", diz a advogada Thayna Yaredy, que é negra e representante do coletivo Rede Feminista de Juristas.

A pesquisa também indicou aumento nos relatos de assédio conforme o tamanho da cidade. Nos municípios com até 50 mil habitantes, 30% dizem ter sido vítimas, enquanto nos que têm mais de 500 mil moradores a taxa sobe para 57%.
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CAMINHO DAS PEDRAS


Para estudiosas do tema, o combate ao problema passa inevitavelmente pela conscientização da população –tanto de homens quanto de mulheres– e por uma mudança na abordagem pelo poder público, seja nas polícias, na Justiça ou entre os legisladores.
O Código Penal só considera crime o assédio sexual quando há uma relação hierárquica entre as partes. A cantada na rua, por exemplo, é tida como contravenção penal, sujeita a multa. "Existe esse vácuo entre a importunação ofensiva ao pudor e o estupro", diz a promotora Maria Gabriela Manssur.

Dois projetos de lei que tramitam no Congresso pretendem preencher esse "vácuo" criando um novo tipo penal. Eles propõem no mínimo dois anos de prisão para quem constranger, molestar ou importunar sexualmente alguém, mesmo sem contato físico. Aprovados no Senado em outubro, os textos de autoria de Humberto Costa (PT-PE) e Marta Suplicy (PMDB-SP) agora estão na Câmara.
Juridicamente, o assédio que Maria sofreu ao ser abordada pelo motoqueiro é estupro, já que foram cometidos "atos libidinosos" por meio de ameaça –mesmo que não tenha havido "conjunção carnal".

Apesar das piadinhas que ouviu na delegacia, pelo menos desta vez ela foi denunciar. A situação 13 anos atrás foi diferente. Por mais de uma década, ela guardou para si o fim de tarde em que foi arrastada para debaixo de um viaduto e estuprada por um desconhecido.

Hoje, todos os dias ela pega carona com uma vizinha para percorrer os três quarteirões entre sua casa e seu carro. Seu filho, de dez anos, a acompanha a todo lugar.
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30 DE DEZEMBRO DE 2017
LYA LUFT

Novo ano novo

Primeiro, eu entendia que ano novo era mano novo, e ficava feliz com mais um bebê em casa, eu desde sempre louca por crianças e bebês. Até hoje, seguidamente, sonho que tenho um ou vários no colo. Depois, fui entendendo que não era mano, e sim ano, e também compreendi, vagamente, essa questão dos números com que demarcamos nossa vida - em geral, para nos atormentarmos um pouco mais.

O ano novo espia na esquina como um garoto arteiro, cheio de novidades malucas para nos surpreender.

O ano novo espreita nos espelhos como uma velha bruxa de longas unhas roxas para nos arranhar enquanto dá suas risadinhas sinistras.

O ano novo espera na porta da frente para a gente abrir, abraçar, aceitar e achar que vai ser feliz todos os trezentos e tantos dias - e algumas vezes, em muitos dias, e semanas, ou meses, a gente é feliz mesmo.

O ano novo é uma estrelinha que nos contempla lá do céu, como diziam, em tempos tão antigos: meu irmãozinho morto antes de eu nascer tinha virado estrelinha e cuidava de mim. (Me inquietava um pouco que também visse meus pecadinhos, que eram palavras feias, mentiras e botar a língua para os adultos pelas costas deles.)

O ano novo é uma esquisitice, mas vale porque, apesar de tudo, a gente celebra. Quase uma continuação do Natal, só que geralmente com mais festa, e dança, e espumante, promessas para os seres amados, e promessas para nós mesmos - mais cobrança do que promessa, aquela lista velha e chata como o mundo: fazer exercício, não beber, não comer, não ir demais às baladas, não fumar, não se matar com nenhuma droga, aliás, ser melhor filho, irmão, pai, mãe, colega, amigo, chefe, qualquer coisa dessas em que tantas vezes agimos como feitores de escravos ou carrascos.

E assim, dia a dia, o novo ano nos espera, e nós esperamos por ele.

Que Deus ou os deuses nos deem um aninho manso, colorido, bondosinho, gentil, não só para nós pobres humanos sempre tentando escapar dos males, mas para este mundo tão bagunçado, violento, chato, porque já nem as notícias de mortandades, desgraças, tufões, inundações, corrupções e bondades com os corruptos, e crueldades com os miseráveis pobres engaiolados como animais (não!, os direitos dos animais não permitiriam!), nos impressionam muito. Estamos calejados.

Enfim, que seja um aninho bem suportável para a maioria. Para alguns - os escolhidos -, que seja glorioso: a maioria do pessoal merece. Sobretudo os amados da minha família, os amigos, os leitores, e os homens justos que ainda sobrevivem nesta terra.

Um bom ano a todos nós.

LYA LUFT


30 DE DEZEMBRO DE 2017
MARTHA MEDEIROS

Encontros e colisões


Tenho uma quedinha pelos significados antagônicos das expressões ao encontro de e de encontro ao. Perceba a sutileza, até parece poesia: ao encontro de/de encontro ao.

Arnaldo Antunes já terá se debruçado sobre isso? Adélia Prado? Antonio Cícero? Claro que não, eles não têm a obrigação de escrever um artigo edificante sobre o fim do ano. Mesmo que não pareça, é o que estou tentando fazer.

Uma pequena troca de posição ("de" no lugar de "ao", e vice-versa) e temos um mundo novo, outro olhar, tudo se transforma.

Ir ao encontro é abertura. Ir ao encontro de um novo amor, ou de um ex-amor, de um amor para sempre. Alguém que você sabe que está esperando sua chegada, que irá jogar tudo para o alto ao ver você entrar pela porta, que lhe dará a certeza confortante de que está sendo aguardado e de que nada, nada impedirá o happy end desta história.

Ir ao encontro de um sonho que estava criando mofo na sua imaginação. De repente, o sonho se realiza e uma chuva de papel picado cai sobre sua cabeça e você nem percebe o quanto isso é cafona, de tão inatingível que tudo parecia, mas aconteceu.

Ir ao encontro de um desafio que irá justificar sua passagem por este planeta. Escalar o Aconcágua? Apoiar uma organização humanitária? Fazer um teste para atriz? Ir ao encontro do que você intuiu antes mesmo de planejar, ir ao encontro daquilo que você queria ser antes mesmo de entender a fundo o que é ser alguém.

Ir ao encontro da serenidade, da angústia zero. Permitir que as perguntas fiquem sem respostas e não sofrer nem um pouco por isso. Ir ao encontro das surpresas que redefinirão quem você é, mesmo que você pense que já sabe quem é (não, nunca se sabe com certeza). Ir ao encontro do pânico e do êxtase que às vezes (quase sempre) reúnem-se no mesmo acontecimento.

Ir ao seu próprio encontro, ao encontro daquela faceta secreta que você ainda não trouxe à tona por medo de se conectar com as partes ignoradas da sua identidade. Há muitos "eus" dentro deste você que você é, mas que ainda não se permitiu ser por inteiro. Ir ao encontro deles, de todos esses eus desconhecidos, é um abraço gigantesco em si mesmo.

Que 2018 seja um esplendoroso "ao encontro de", e não um indesejado "de encontro ao". Crash! "De encontro" é colisão.

Bater de frente com a namorada, brigar com amigos por causa de política, ficar estremecido pela divergência de opiniões, mergulhar no estresse. Tivemos fartura dessas colisões em 2017, algumas necessárias, mas todas desgastantes. Ainda que 2018 seja um ano eleitoral (o que propiciará muitos "de encontro"), vale sonhar com um candidato que nos levará "ao encontro" de um ideal comum, de uma sensatez administrativa, de uma visão pluralista e de uma consciência social que beneficiará a todos. Estamos merecendo ir ao encontro desta utopia.

"De encontro" é conflito, choque, obstrução da caminhada. O que eu desejo para 2018? Que não seja atravancado por fake news, agressões, baixarias. Que seja leve e desimpedido. Que elegantemente flua.

MARTHA MEDEIROS


30 DE DEZEMBRO DE 2017
CARPINEJAR

O presépio da família

Não tiramos o presépio depois do Natal. Ele fica até janeiro.

Transformamos a churrasqueira em gruta de igreja - sem carne espetada no período de um mês. É nossa pia de água benta à espera de benzer a testa.

É assim desde criança. Os rituais mantêm a família unida.

Somos mais do presépio do que do Papai Noel. O Bom Velhinho de vermelho nunca desceu pela chaminé porque tem uma criança surgindo na manjedoura.

Minha mãe me ensinou a montar o teatro bíblico, a fazer uma maquete do solo com papel especial, a colocar algodão imitando nuvens, a recolher pinhas, palha e barba-de-pau das árvores para compor o cenário rural. Nossos Reis Magos - Melquior, Baltazar e Gaspar - perderam as mãos e colamos com bonder. O burro e as ovelhas estão amarelados pelo tempo, mas seguem zunindo e balindo. O anjo caiu algumas vezes do prego do portal e rejuntamos as suas asas.

É a mesma turma desde pequeno. Bonita porque quebrou e se refez, humana e falível como a gente, com a história explicada dezembro a dezembro aos filhos e netos. Deixaram de ser apenas esculturas, porém réplicas em miniatura da resiliência familiar. São pedras onde depositamos os nossos laços. Há a casa no sangue e a casa no espírito, que começa com o presépio.

Não valorizamos as luzes piscando, não esnobamos com decoração o pinheiro na sala, mantemos o costume de privilegiar as sombras e a simplicidade da reencenação de Cristo, criada por Francisco de Assis.

E as crianças desfrutam do direito de colocar no presépio os seus brinquedos prediletos. Já teve Barbie ladeando a Nossa Senhora, já teve Playmobil ajudando o carpinteiro José, já teve miniaturas de Kinder Ovo puxando conversa com os pastores.

As modas mudam, as épocas variam, e amadurecer talvez seja não evoluir no amor: preservar o olhar puro e pobre do nascimento para todo o sempre.

CARPINEJAR


30 DE DEZEMBRO DE 2017
CLAUDIA LAITANO

oração ao tempo

Filhos homenageando o pai, avô cantando com os netos, pai dividindo o palco com os filhos. 2017 foi o ano em que três nomes seminais da mítica geração que reina na MPB desde os anos 1960 criaram projetos artísticos envolvendo a família.

No disco Caravanas, um dos melhores de 2017, Chico canta pela primeira vez com os netos Clara e Chico Brown. Na parceria com o neto de ouvido absoluto, Massarandupió, a letra de Chico compara a areia da praia baiana onde brincava o bacuri Chico Brown com a areia da ampulheta que marca a passagem do tempo: "Ó mãe, pergunte ao pai/ Quando ele vai soltar a minha mão/ Onde é que o chão acaba/ E principia toda a arrebentação/ Devia o tempo de criança ir se/ Arrastando até escoar, pó a pó/ Num relógio de areia o areal de/ Massarandupió".

Pelo menos outras duas canções do disco remetem à passagem do tempo e à finitude: Tua Cantiga ("E quando o nosso tempo passar/ Quando eu não estiver mais aqui/ Lembra-te, minha nega/ Desta cantiga/ Que fiz pra ti") e Jogo de Bola (do narrador que "Em priscas eras/ um Puskás eras/ A fera das feras da esfera", mas, sem amargura, aplaude ao ver "rolar a pelota nos pés de um moleque").

Idealizado por Bem, um dos oito filhos de Gilberto Gil, o show que celebrou os 40 anos do álbum Refavela, lançado em 1977, passou por Porto Alegre no início de dezembro. No palco, além de convidados como as cantoras Céu e Maíra Freitas, filha de Martinho da Vila, e de Moreno Veloso, filho de Caetano, três gerações da família Gil: o patriarca, os filhos Nara e Bem, a nora e dois netos ainda crianças. Gil aparece apenas no fim do espetáculo, abençoando a releitura de suas canções e enfatizando que aquele não era um show dele, mas para ele: a reverência de jovens músicos a um disco que não envelheceu um segundo nesses 40 anos.

Poucos dias depois, foi a vez de Caetano desembarcar na cidade com os filhos Moreno, Zeca e Tom. Se Refavela era uma homenagem a Gil, o show dos Veloso foi uma celebração da família - da essência compartilhada pelo sangue e pelo convívio, às diferenças que tornam cada elemento único e distinto. Dos quatro, Zeca parecia o menos à vontade no palco, mas foi uma canção sua a mais surpreendente do show, a impactante Todo Homem Precisa de uma Mãe. A sintonia entre quatro estrelas de brilho próprio - ainda que uma delas seja um gigantesco astro-rei - marcou um espetáculo que celebra pais, mães, irmãos, avós, cidades e tudo mais que completa o sentido da palavra família: história, biografia, legado, finitude.

Composta quando Caetano tinha pouco mais de 30 anos e incluída no show, Oração ao Tempo ajuda a entender o sentido dessas passagens de bastão entre gerações: "Quando eu tiver saído/ Para fora do teu círculo / Tempo, tempo, tempo, tempo/ Não serei nem terás sido/ Tempo, tempo, tempo, tempo/ Ainda assim acredito/ Ser possível reunirmo-nos/ Tempo, tempo, tempo, tempo/ Num outro nível de vínculo/ Tempo, tempo, tempo, tempo". Na arte, a eternidade do espírito, e na família, a permanência da matéria e dos afetos, a nossa redenção e a nossa esperança. Para 2018 e além.

CLAUDIA LAITANO


30 DE DEZEMBRO DE 2017
J.J. CAMRGO

MODELOS QUE IRRIGAM A ESPERANÇA

É regra geral que o principal subproduto do sofrimento seja a revolta, coerentemente mais intensa durante o transe doloroso, mas que pode se perpetuar no espírito de quem sofre como uma amargura residual, persistente. Para desespero dos terapeutas da alma e entusiasmo dos fabricantes de antidepressivos. A associação desse sentimento com o desenvolvimento de culpa pode produzir sequelas emocionais insuperáveis. 

Com graus variáveis de sucesso, as vítimas de tragédias pessoais podem ser recuperadas para a vida útil e tidas com reequilibradas a julgar pelo retorno ao trabalho, a leveza do sono ou a espontaneidade do sorriso. Outros seguem remoendo a dor e subjugados por ela pela vida afora, sem trégua e sem remissão. Esses tipos, em geral, emagrecem, porque não conseguem dar uma pausa no culto à adversidade, nem para um prazer tão primitivo quanto o de comer.

Boris Cyrulnik era judeu, nascido na França, passou parte de sua infância nos campos de concentração da Alemanha de Adolf Hitler. Presenciou a morte de seus pais, irmãos, avós e amigos, e foi o único sobrevivente do grupo. Resgatado desse circo de horrores, perambulou por vários lares adotivos, carregando apenas a vida e a esperança.

Permaneceu analfabeto até a adolescência, mas conseguiu se formar em medicina, na qual elegeu a psiquiatria e desenvolveu a teoria da resiliência, baseado num conceito da física que a define como a propriedade de um corpo de recuperar a sua forma original após sofrer um choque ou deformação, ou na linguagem psiquiátrica, a capacidade de retomar o desenvolvimento depois de uma agressão traumática. 

Ou seja, dar uma utilidade ao sofrimento. No mundo contemporâneo deformado pelo egocentrismo, sempre me encantou a existência desses tipos que, marcados pela tragédia pessoal, encontraram forças não apenas para submergir, mas secar as lágrimas e tratar de mobilizar a sociedade com a única intenção de poupar famílias desconhecidas da mesma dor que os flagelou.

Francisco Assis Neto foi um desses raros exemplares. Tendo perdido um filho amado que não conseguiu ser transplantado do coração, abraçou fervorosamente a causa da doação de órgãos, fundou a Adote, uma ONG voltada para a conscientização da população, e literalmente batalhou pela causa até os últimos dias de sua vida. No final de setembro, dentro das comemorações da semana da doação de órgãos, nos encontramos pela última vez, durante uma homenagem que recebemos no Palácio Piratini. Impressionaram-me a postura, o destemor e a naturalidade com que falou da alegria pelo reconhecimento do seu trabalho. 

Comentou dos projetos que tinha e do quanto ainda havia por fazer nos próximos anos. Só ele e eu sabíamos o quanto o câncer avançado inviabilizaria tudo aquilo, mas um resiliente não morre antes de morrer. Um tipo como o Chico devia ter o visto de permanência renovado indefinidamente. Um mundo tão escasso de nobreza devia ser poupado de um tal desperdício, ainda mais quando não há peças de reposição.

O ano novo encanta pela possibilidade de recomeçar. Recomecemos na expectativa de que possamos melhorar a vida dos outros. O Chico nunca desistiu de tentar. Então, que seja por ele.

J.J. CAMRGO


30 DE DEZEMBRO DE 2017
DAVID COIMBRA

Coisas do mundo


Amoda agora nos Estados Unidos, na Europa e no Japão é as mulheres se casarem consigo mesmas. Sério. Tem até curso para isso. Elas passam três meses estudando como deve ser a cerimônia do enlace e o relacionamento que terão com elas próprias. Ao cabo dessa preparação, promovem a festa. Convidam amigos e parentes, gastam alguns milhares de dólares em decoração, comida e bebida, e cortam triunfalmente um bolo em várias camadas, como uma pirâmide asteca, tendo uma única noiva se equilibrando no topo.

Parece que esse ritual faz muito bem para a autoestima das nubentes.

Francamente, eu não me escolheria para casar comigo. Em primeiro lugar, porque conheço meus defeitos melhor do que ninguém, e eles me irritam. Fosse eu o meu próprio cônjuge, sei que nada do que dissesse me convenceria a mudar. Já tentei, neste longo tempo em que sou solteiro da minha pessoa, e não adiantou. Por que um casamento mudaria algo?

Tem outro problema: acharia estranho me chamar de marido de mim e mais estranho ainda me chamar de esposa. Você dirá que é o machismo entranhado em minh?alma, e concordarei: esse é um dos meus defeitos arraigados. Afinal, sou do IAPI.

É verdade que, não raro, converso comigo mesmo e nós quase sempre concordamos. Ou seja: temos opiniões semelhantes, o que é importantíssimo em qualquer relação. No entanto, muitas vezes, digo e faço besteiras, o que me leva a me repreender com rigor. Está certo que quase sempre me perdoo, mas a desilusão já aconteceu: sei que não sou quem gostaria de ser.

Eu até me casaria comigo se eu fosse, por exemplo, a Irina Shayk. Nossa, como deve ser legal ser a Irina Shayk. Você não sabe quem é? Vá ao Google. Melhor: vá ao YouTube e veja a Irina Shayk em movimento. É a mulher mais linda do mundo. Você até pode dizer que não existe isso de mulher mais linda do mundo. É porque ainda não viu a Irina Shayk. Veja-a e diga se você não se casaria consigo se você fosse ela.

Bukowski, o velho safado, queria ser Arturo Bandini.

Arturo Bandini é personagem dos romances de John Fante. Quando brigava com alguma de suas mulheres e ela o insultava, Bukowski reagia gritando:

- Não me chame dessas coisas! Eu sou Bandini! Eu sou Arturo Bandini!

Isso me dá a certeza de que Bukowski se casaria consigo mesmo se por acaso ele fosse Arturo Bandini. Mas ele era Bukowski, o que talvez o desagradasse tanto, que bebia para esquecer. Não foram poucas as vezes em que bebi para me esquecer de mim.

Dos personagens da ficção é claro que eu preferiria ser o Capitão Rodrigo, bravo e alegre, amigo leal e inimigo aguerrido, solitário como o tigre e conquistador como o leão, um guerreiro cantante, que sacava do violão ou da guitarra com a mesma perícia e que, ao ser desafiado por alguém que julgava bom, ponderava:

- Um homem não briga debalde.

Sim, eu seria muito mais atraente, para mim, se fosse o Capitão Rodrigo.

Mas, como o Capitão Rodrigo só existe na literatura e Irina Shayk é mulher, sabe quem eu escolheria ser?

O Paulinho da Viola.

Paulinho da Viola tem a serenidade da sabedoria, é um homem de bem com a vida, que cuida da mulher, dos filhos e dos amigos com devoção. Paulinho da Viola trabalha com marcenaria nas horas vagas. Como deve ser bom trabalhar com marcenaria e fazer, para as pessoas, coisas realmente úteis, como uma mesa ou uma cadeira ou uma pequena caixinha de música da qual salta uma dançarina e faz uma menina sorrir. Mas o melhor, em ser o Paulinho da Viola, é que ele canta uns sambas macios e os canta sorrindo e, no maior deles, disse a frase que resume tudo o que sempre digo para mim:

"As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender".

DAVID COIMBRA

30 DE DEZEMBRO DE 2017
GESTÃO PÚBLICA

O que avançou (e o que não avançou) em 2017

Confira o andamento, ao longo do primeiro ano de mandato, de alguns dos principais compromissos assumidos pelo prefeito Nelson Marchezan

SERVIÇO PÚBLICO

Valorização do funcionalismo

NÃO ANDOU

-Alegando dificuldades financeiras do município, a atual gestão determinou o pagamento parcelado dos servidores e tentou, na Câmara, alterar o regime de trabalho do funcionalismo. O 13º salário será pago em parcelas ou mediante empréstimo bancário. As medidas provocaram greve.

Reorganização administrativa

FOI CUMPRIDO

-Por meio de projeto enviado à Câmara e aprovado em plenário, a promessa de reduzir o número de secretarias de 29 para 15 pastas foi cumprido. De acordo com a justificativa do projeto, o município teria uma economia mensal superior a R$ 473 mil.

MOBILIDADE URBANA

Priorização do transporte coletivo

FICOU PARA 2018

-O decreto 19.836 estabeleceu prazo até 31 de julho de 2018 para que pelo menos 40% da frota tenha câmeras instaladas, e até 31 de dezembro de 2018 para que todos os veículos tenham GPS e reconhecimento facial. O município informa que ainda está trabalhando em um projeto de reformulação das paradas de ônibus e desenvolvendo um plano de implantação de corredores preferenciais nos maiores gargalos do transporte coletivo com previsão de implantação para março de 2018. O estímulo às tecnologias verdes depende de um projeto remetido à Câmara Municipal que prevê o aumento da vida útil de veículos com tecnologias sustentáveis.

Transporte coletivo sustentável

NÃO ANDOU

-Conforme resposta encaminhada via e-mail pela EPTC, "empresas de ônibus e empresas de veículos com tecnologias renováveis estão trocando informações e detalhes técnicos" para avaliar a implantação dessas tecnologias em Porto Alegre.

Uso de tecnologia

AVANÇOU

-O sistema de reconhecimento facial foi instalado em cerca de 300 ônibus (cerca de 20% da frota) e deverá estar em todos no final de 2018. Tramita na Câmara Municipal um projeto de lei com novas regras para os táxis: redução da vida útil dos veículos de 10 para seis anos, acionamento do taxímetro pela impressão digital do motorista, realização de exame toxicológico a cada seis meses, adoção do cartão de crédito em 100% da frota, padronização de vestuário e atendimento, entre outros pontos.

SEGURANÇA PÚBLICA

Utilizar pardais para coibir furto e roubo de carro

DEVAGAR

-Os pardais ainda não são utilizados para monitorar placas de maneira regular, abrangente e constante. A iniciativa segue em testes em três pontos na cidade, mantidos em sigilo. Conforme a Secretaria Municipal de Segurança, "a partir da análise dos resultados, a ação deve se tornar mais abrangente em 2018".

-Por enquanto, o município conta com 27 câmeras de monitoramento (diferentes dos pardais) capazes de registrar placas. Elas remetem as informações para um sistema que emite um alerta em caso de registro de furto ou roubo. Até o momento, foram identificados cerca de 150 veículos furtados, roubados ou clonados. 27 foram recuperados. O sistema também mostra carros com licenciamento vencido.

Reconhecimento facial para segurança

DEVAGAR

-Segundo a EPTC, o reconhecimento facial é usado atualmente, em parte da frota, apenas para a fiscalização do sistema de bilhetagem eletrônica. Desde setembro, quando começou a ser instalada a biometria facial no transporte coletivo da Capital, até o início de dezembro, 23.886 cartões foram bloqueados em razão de suspeita de fraudes. O reconhecimento facial só deverá abranger todos os veículos em 2018.

Integração policial

AVANÇOU

-Vêm sendo realizadas ações integradas como operações conjuntas entre Guarda Municipal, BM, Polícia Civil e Exército, além da integração operacional dos centros de comando do Estado e da Capital. A integração das câmeras de monitoramento inclui 1,2 mil equipamentos do município e 65 do Estado. Segundo a Secretaria Municipal da Segurança, desde março, a Ronda Ostensiva Municipal já atuou em mais de 250 ações. O município também contribuiu com entrega de equipamentos como 78 viaturas para a Brigada Militar, consertadas pela iniciativa privada com intermediação da prefeitura.

Proteção à mulher

NÃO ANDOU

-As conversas com o governo estadual para estabelecer uma parceria ainda estão em fase inicial.

- A ideia é fazer isso ao longo de quatro anos - diz a responsável pela Coordenadoria da Mulher da Secretaria de Desenvolvimento Social e Esporte de Porto Alegre, Fernanda Machado.

-Por enquanto, segue funcionando o Centro de Referência da Mulher (criado em 2011), que atende mensalmente de 170 a 280 mulheres vítimas de violência.

EDUCAÇÃO

Investimento em Educação Infantil

AVANÇOU

-O número de crianças atendidas na pré-escola aumentou de 13.804 para 14.773 - 969 novas vagas, crescimento de 7% no ano. A expansão ocorreu por meio da entrega de novas escolas, ampliação de espaços e implantação de turmas de Educação Infantil em cinco colégios de Ensino Fundamental. Ainda resta uma demanda reprimida por vagas para cerca de 1,5 mil crianças. Segundo a Secretaria Municipal da Educação, ela deve ser suprida pela ampliação da rede comunitária. Há promessa de geração de mil novas vagas por meio de edital de chamamento público em 2018.

Educação em tempo integral e contraturno escolar

NÃO ANDOU

-As 99 escolas municipais oferecem turno integral ou atividades no contraturno, mas houve uma redução de aproximadamente 400 crianças atendidas em tempo integral. A prefeitura argumenta que não houve redução de vagas, mas "baixa adesão" ao serviço oferecido pelo município.

SAÚDE

Ampliar atendimento de oito postos de saúde até as 22h

AVANÇOU

-Dois postos passaram a atender até as 22h - mantido esse ritmo, os oito postos estariam contemplados até o final do mandato. A Unidade de Saúde São Carlos passou a atender com horário ampliado em março, e a Unidade de Saúde Modelo, em abril. No horário estendido, as duas realizaram 18 mil consultas, com 90% de resolutividade.

Informatizar atendimento em postos de saúde

AVANÇOU

-Em fevereiro, foi lançado, em parceria com o TelessaúdeRS-UFRGS, o aplicativo DermatoNet. Por ele, o paciente pode ser atendido pelo médico de família no posto de saúde, ter sua lesão na pele fotografada e enviada via web para um especialista. O diagnóstico é enviado para a unidade de saúde em até 72 horas, evitando deslocamentos. Em novembro, a fila de 5.830 pessoas esperando atendimento foi zerada, segundo a prefeitura. Também foi criado um serviço para consultas oftalmológicas a distância. Para 2018, estão previstas novas ações destinadas a reduzir a fila de espera por consultas especializadas.

Ampliar Saúde da Família

AVANÇOU

-O número de Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASFs) passou de cinco para sete, e as equipes de Saúde da Família, de 201 para 214. Houve ampliação de sete equipes de saúde bucal, que eram 93 em janeiro e chegaram a cem agora. O número de equipes de Consultório na Rua se mantém no mesmo patamar de janeiro.

PARCERIAS

Busca de PPPs

DEVAGAR

-A carteira de projetos da Secretaria Municipal de Parcerias Estratégicas apresenta nove iniciativas sujeitas a parcerias como PPPs, concessão ou adoção: iluminação pública, orla do Guaíba, Hospital Presidente Vargas, Mercado Público, Mobiliário Urbano, Centro de Eventos, Parques e Praças, Saneamento e Resíduos Sólidos. Nenhum se concretizou ainda. Em dezembro, foi assinado um termo de parceria com a Caixa para estruturar a PPP de resíduos sólidos, cujo edital deve ser lançado em 2018.

30 DE DEZEMBRO DE 2017
ECONOMIA

Mínimo de 2018 terá o menor reajuste desde o Plano Real

COM AUMENTO DE 1,81%, o valor passa a ser de R$ 954 em 1º de janeiro
O reajuste do salário mínimo em 2018 será o menor desde a criação do Plano Real, em 1994. O presidente Michel Temer assinou decreto que eleva o mínimo em 1,81%, de R$ 937 para R$ 954.

O novo valor entrará em vigor a partir de 1º de janeiro. Anunciado discretamente em um decreto presidencial, o reajuste surpreende ao trazer aumento menor do que o sinalizado pelo próprio governo.

Em agosto, a Lei de Diretrizes Orçamentárias previa alta do mínimo de 4,84%, para R$ 979. Uma semana depois, o governo revisou a previsão para baixo e tirou R$ 10 do salário ao reduzir para R$ 969, o que indicaria 3,41%. O valor anunciado na tarde de sexta-feira, porém, é ainda menor. Foram retirados mais R$ 15.

Antes, o menor reajuste anual do mínimo havia sido concedido em 1999, quando aumentou 4,62%. A inflação acumulada em 12 meses era, porém, menor que o reajuste: 3,14%. Por isso, houve aumento real de 1,48% aos trabalhadores e pensionistas naquele ano. Desde então, o mínimo sempre teve reajuste superior à inflação, exceto em 2011, quando subiu 5,88% e ficou pouco abaixo da inflação de 5,99%.

No Plano Real, o maior aumento nominal do mínimo ocorreu em 2003, quando o salário subiu 20%, ao passar de R$ 200 para R$ 240. Quando o real foi adotado como a moeda brasileira, em julho de 1994, o mínimo era de R$ 64,79.

No decreto assinado na sexta- feira, o governo também detalha o valor diário mínimo pago ao trabalhador, que passará a ser de R$ 31,80 e a hora trabalhada, em R$ 4,34. Esses valores são usados como referência para os novos contratos intermitentes de trabalho - quando o empregado atua por hora ou dia e, por isso, deve receber pelo menos proporcional ao salário mínimo.

Diferentemente do governo, o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) entende que o cálculo do salário mínimo deveria levar em conta a cesta básica mais cara no país. Desta forma, o valor, hoje, seria de R$ 3.731. Para o Dieese, essa é a quantia mínima necessária para o sustento de uma família com quatro pessoas. O valor é 3,9 vezes maior do que o salário estipulado pelo governo.

30 DE DEZEMBRO DE 2017
RBS BRASÍLIA

2018 SERÁ MESMO O ANO DA VIRADA?

Depois de três anos mergulhado em uma profunda crise política e econômica, o Brasil entra em 2018 depositando todas as esperanças nas urnas. Infelizmente, é expectativa de mais para cardápio de menos. Apesar das revelações que atingiram os principais partidos e lideranças do país, desde o final dos anos 80 não chegamos às vésperas de um período eleitoral com tantas incertezas. O novo não apareceu. E, a essas alturas, é até melhor mesmo que não seja inventado um salvador da pátria.

É certo que, com o financiamento público, teremos uma eleição mais barata. Mas o índice de renovação na Câmara e no Senado - em cerca de 40% nas últimas eleições - dificilmente alcançará níveis revolucionários. Quem tem mandato se beneficiará da estrutura dos gabinetes. Os partidos também devem priorizar, na partilha do fundo eleitoral, aqueles que já são deputados ou senadores. O novo presidente da República, portanto, deverá encontrar um parlamento semelhante ao que já existe, inclusive com os mesmos vícios. O consolo é que as estruturas de fiscalização estão mais afiadas.

Depois da polarização política, de um impeachment, de um governo de transição e de escândalos de corrupção que atingiram os principais partidos, como será a escolha para presidente? Essa é a grande questão de 2018, que já começa com força total a partir do julgamento do ex-presidente Lula. Líder nas pesquisas, ele será uma figura estratégica da eleição - independentemente de sua situação jurídica. Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT) sonham em deslanchar, caso o petista se inviabilize. 

Do outro lado, o desafio do tucano Geraldo Alckmin é se viabilizar como candidato dos partidos de centro, enquanto o presidente Michel Temer busca alguém para defender o seu legado e Jair Bolsonaro (PSC) ainda surfa na onda dos efeitos da polarização. O tom dos debates será determinado pelo tamanho da reação da economia. Depois de tantos desvarios, se conseguirmos retomar um mínimo de estabilidade, já estaremos no lucro.

MICO DO ANO - O presidente Michel Temer poderia ter encerrado o ano sem o mico do indulto de Natal. Foi obrigado a desistir de um novo decreto para não aumentar o desgaste.

CAROLINA BAHIA

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017



Retrospectiva 2017 

Fazer retrospectivas, hoje, onde o presente é tudo, é meio retrô. Retrospectivas são mais velhas que andar a pé, a Sé de Braga e o big bang - se é que ele existiu. Mas é fim de ano, e mesmo com essas toneladas de fotos, frases, palavras, acontecimentos, aborrecimentos, alegrias, nascimentos, mortes, escândalos, delações, debates, controvérsias e bombas norte-coreanas, o cronista cumpre sua tarefa de biografar o cotidiano, ou, no caso, o ano. Biografia desautorizada. Uns chamam 2017 de ano de "extremos". Ano "intensíssimo" é mais adequado. 

O que dizer do ano que começou com Trump e seu discurso "imprevisível", com Hollywood errando o anúncio do melhor filme e encerrando o secular "teste do sofá", pelos caras que tinham a árdua tarefa de "entrevistar" candidatas a estrelas. Meryl Streep atacou Trump e ele contra-atacou. A Time indicou como personalidade do ano as mulheres que denunciaram casos de assédio sexual. Uma corajosa denunciava e as outras iam atrás dizendo "me too". 

Num ano considerado meio fraco, A Bela e a Fera e Mulher Maravilha, com protagonistas femininas, foram os filmes mais rentáveis e Star Wars - Os últimos Jedi faturou US$ 450 milhões no fim de semana da estreia. O show continua. Em janeiro, em um acidente aéreo, faleceu Teori Zavaski e algumas teorias a respeito até agora não estão comprovadas. Dizem que 2017 empoderou o indivíduo, ano de gritar por direitos humanos, protestos contra censuras e preconceitos, mas os Três Poderes, "independentes e harmônicos entre si", parecem mais empoderados que os cidadãos. 

A política e a economia nos tontearam, com um ex-presidente condenado, o atual sob suspeita e os milhões de desempregados, mas a menor inflação dos últimos 19 anos e, quem sabe, este "descolamento" da economia da política nos ajude, enquanto a Lava Jato segue - já prendeu uns 100 meliantes. Poder Executivo tentando emplacar as próprias reformas, Poder Legislativo fracassado e conhecidos problemas com o Judiciário mostram que está difícil a melhora. Tomara não seja impossível. 

Vamos ter esperança, não apenas esperar. Falo de flores em meio aos tumultos. De Porto Rico veio o refresco, Despacito, com seu ritmo ligeirinho, sua letra sugerindo sedução sem pressa e semanas em primeiro lugar nas paradas. Despacito lembra os sucessos La Bamba (1987) e Macarena (1996), e mostra que a música é a linguagem universal capaz de cosas buenas. Dela precisamos para seguir vivendo, sonhando e dançando. Hoje a galera quer dançar mais do que ouvir música, mas isso é outra história. 

A separação da Catalunha, a renúncia do Tiririca, o ex-futuro-candidato Luciano Huck, a delação do fim do mundo que não acabou com o mundo e o anúncio de casamento de Meghan Markle, 36 anos, atriz, ativista, divorciada e de origem negra com o príncipe Harry, 33 anos, mostra um 2017 intenso. Henrique VIII, parente de Harry, ordenou a decapitação de um ancestral do pai de Meghan. 

O que é a história, né?   

a propósito... 

No fim do ano, a gente fica pensando se o ano foi pior ou melhor que os outros. Faz a contabilidade e as tais retrospectivas de acontecimentos da rua e de dentro de casa. Normal. Mas como disse o poeta, o último dia do ano não é o último dia do tempo. O tempo. 

O tempo passa, eterno como o ar, sem ligar muito para nós. Quem sabe a gente não se preocupa tanto com ele e vive os "momentos". Passadas as sagradas orgias natalinas e os embalos do Réveillon, o tempo será novo como o ano. Perder tempo, ganhar tempo. Matamos o tempo e o tempo nos enterra, disse Machado de Assis. Dizem que o tempo se vinga das coisas feitas sem a colaboração dele. Tempo ao tempo, tempo para nós. Feliz tempo novo para os queridos leitores!    

Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/12/colunas/livros/603822-um-homem-do-pampa.html)


Notícia da edição impressa de 29/12/2017. Alterada em 28/12 às 19h45min 

Um homem do Pampa 


Detalhe da capa do livro REPRODUÇÃO/JC Carlos Nejar - Um homem do Pampa - Dicionário (Mecenas, 312 páginas), é o 13º volume da conhecida e consagrada Coleção Dicionários patrocinada pelo Grupo Zaffari. 

Com planejamento cultural da Opus, realização de Mecenas Editora, TAB Marketing Editorial e Agência Matriz, a obra foi projetada, concebida e editada pelo publicitário, compositor, poeta, escritor e cronista Luiz Coronel. O projeto gráfico e a direção de arte são de Simone M. Pontes, enquanto a tradução espanhol/português é de Janaína de Azevedo Baladão, também responsável pela pesquisa e organização. Um CD acompanha o livro.

Nascido em Porto Alegre em 1939, procurador de Justiça aposentado, Carlos Nejar, que pertence à Academia Brasileira de Letras, é um dos maiores poetas brasileiros em atividade. Também romancista, dramaturgo, contista e autor de obras infantojuvenis, Nejar publicou, em 2014, um grande volume, atualizado, intitulado História da Literatura Brasileira. Muitas vezes premiado, suas dezenas de livros já foram objeto de estudos em universidades brasileiras e estrangeiras. 

O dicionário reúne centenas de verbetes com base nos poemas de Nejar. Algumas pérolas: "Horizonte - Pampa é onde o horizonte/ Dentro de fora: nas barrancas / de um silêncio exercitado."; "Nuvem - Como o boi conhece o dono/ e o dono conhece o boi, a / nuvem conhece o vento."; "Abelhas - Pode amor ser pensamento/que sai de si com as abelhas/ e volta de favos cheio?". O dicionário tem apresentação de Luiz Coronel e textos de Fabrício Carpinejar, Marco Lucchesi, Tristão de Athayde, Ivan Junqueira, Nelly Novaes Coelho, Oscar Gama Filho, Giovanni Pontiero, Eduardo Portella, Cícero Sandroni, Janaína de Azevedo Baladão e outros sobre a obra nejariana. 

Na apresentação, Coronel diz: "Quem por ventura adentrar a poesia de Carlos Nejar tire o chapéu, atenha-se numa atitude de solene devoção, cônscio de que neste palácio não há cômodos para a banalidade, que neste templo inexiste nicho para o trivial". No verbete Livro está escrito: "o livro é a vingança contra o esquecimento. E digeri-los é se alimentar de memória". Com mais esta importante contribuição, o Grupo Zaffari segue apresentando monumentos da literatura brasileira e mundial. 

lançamentos 

Empreendedorismo feminino - Protagonistas de nossas vidas (Edipucrs, 180 páginas), organizado por Letícia Hoppe e Ionara Rech, apresenta uma coletânea de histórias de empreendedoras de várias áreas, que contam como foi e como está sendo sua trajetória profissional. As empreendedoras Maiara Monteiro da Silva, Karla Aprato, Tatiane Ferreira da Silva e Giovana Strano colaboraram. Faz parte do projeto Empreendedorismo Feminino - Desafios e Conexões de um novo tempo, criado na Pucrs. 

Arsène Lupin contra Herlock Sholmes (Jorge Zahar Editor, 312 páginas), de Maurice Leblanc, tradução de Rodrigo Lacerda e André Telles e apresentação de Rodrigo Lacerda, faz parte da Coleção Clássicos Zahar e apresenta o mais famoso e admirado ladrão de casaca, Lupin, travando um duelo com o arquirrival, o detetive inglês Herlock Sholmes, em duas histórias mirabolantes: A mulher loura e A lâmpada judaica. Quem for mais rápido com o raciocínio ou com os punhos, vencerá. 

Música, filosofia e formação cultural (Educs, 196 páginas), organizado pelos professores universitários Raimundo Rajobac e Luiz Carlos Bombassaro, apresenta ensaios de renomados especialistas sobre o estudo do significado e da aplicação da música nos processos formativos, numa perspectiva que ressalta o ouvir, discute as bases éticas da educação, destaca a formação cultural e analisa os múltiplos modos de compreender a experiência formativa da música. 

Jornal do Comércio (http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/12/colunas/livros/603822-um-homem-do-pampa.html)

29 DE DEZEMBRO DE 2017
DAVID COIMBRA

Sobre a entrevista de Marchezan

Foi importante a entrevista que o prefeito Marchezan concedeu ao Timeline ontem. Ele deixou bem claro quem é e como a cidade está.

Marchezan é um político bem-intencionado, e não apenas ele. Conheço a maioria dos políticos gaúchos e sei que grande parte dessa maioria é bem-intencionada. Não falo por bairrismo, falo por ter informação a respeito.

O nosso problema é que um grupo político nunca vê a boa intenção equivocada quando outro grupo está no poder. Vê, tão somente, a má-fé.

Repare nas críticas feitas a Marchezan e a Sartori. São tão violentas e nocivas quanto as que eram feitas a Fortunati e a Tarso. Pois afianço, leitor incréu, que nem Marchezan, nem Sartori, nem Fortunati, nem Tarso querem fazer o mal. Todos eles almejam o bem público, cada qual a sua maneira.

Cada prefeito, cada governador, cada Executivo tem sua forma de encarar a administração pública. Em tese, foi eleito devido a isso. Ou seja: suas propostas devem ser respeitadas como vontade da maioria da sociedade. Claro que não é por essa razão que serão aprovadas sempre e sem discussão. O papel da oposição é, exatamente, o de apontar falhas nos projetos do Executivo. Mas o ideal, para que a democracia funcione, seria que a ideia do administrador fosse aperfeiçoada, e não rechaçada sistematicamente, a priori, só porque ele pertence a uma vertente política diferente de parcela ou da maioria do Legislativo.

No caso de Porto Alegre, Marchezan fez seu diagnóstico e seu prognóstico dos problemas da cidade. Apresentou-os ontem com firmeza, durante o programa. Em resumo, disse que a prefeitura está falida e que, para resolver a situação, será preciso reformar a administração, fazer parcerias com o setor privado e readequar as tarifas do IPTU.

Pode ser que Marchezan esteja equivocado em um ponto ou em outro, mas, em geral, suas propostas são positivas.

Só não sei se conseguirá levá-las adiante.

Todo líder, seja ele um prefeito, um técnico de futebol, um chefe de seção, um empresário ou um síndico de edifício, todo líder tem de saber gerir pessoas, mais do que coisas. Para um líder, é mais saudável saber conversar do que entender de finanças, administração, economia, engenharia ou táticas de jogo. Não basta o líder estar certo, ele tem de convencer as pessoas de que está certo.

As pessoas... as pessoas não são cristalinas, não são diretas, cada uma tem seu tempo, sua carga de história e de experiências pregressas, cada uma tem suas vontades e suas necessidades, e tudo isso faz com que você tenha de usar medidas diferentes ao lidar com elas em separado ou em grupo.

Vê-se que Marchezan está ansioso para fazer o que acha que deve fazer. Ontem, em meio à entrevista, ele demonstrou essa ansiedade. Às vezes, chegava às franjas da irritação ao expor seu ponto de vista, por ter certeza (até demais) de que está certo. Essa angústia, motivada por inegáveis bons sentimentos, decerto que o atrapalha no trato com as pessoas. Aí tudo fica mais difícil. Porque todas as pessoas precisam das outras pessoas.

Em 2018, espero que Marchezan tenha serenidade e tolerância. Espero que os vereadores também tenham serenidade e tolerância. Espero que a cidade tenha serenidade e tolerância com seu prefeito, com seus vereadores, com suas próprias mazelas, porque só assim 2018 será melhor do que 2017. E pior do que 2019.

DAVID COIMBRA

29 DE DEZEMBRO DE 2017
ARTIGOS

PRESENTE DE FIM DE ANO


E que bela a obra dedicada à Montaigne! As letras em Baskerville monotipo dão nitidez e brilho ao texto. E a qualidade do papel oferece ao tato prazer especial.

Capa e contracapa em Colorplan pristina branco, dobradas à francesa, proporcionam ao leitor uma delicada firmeza, criando espaço para valiosas informações sobre a edição.

A ilustração de capa é em monocromo, branco e preto, assinada por Salvador Dalí, inspirada em imagem de Ensaios de Michel de Montaigne, obra publicada em 1947.

Impressionou-me no relato de Zweig a parte em que Montaigne intervém como conselheiro de ambas as partes, no embate entre o rei Henrique III, católico, e o líder huguenote, Henrique de Navarra.

Montaigne convence o protestante Navarra, que recém dizimara as tropas do rei católico, a converter-se ao catolicismo. Evita-se, assim, um derramamento de sangue e garantem-se séculos de paz e glória à França.

Navarra torna-se depois rei Henrique IV de todos os franceses, oferecendo a Montaigne um importante cargo, acompanhado de altíssimo salário. Mas o pensador recusa.

Escreve ao novo rei: "Nunca recebi vantagens materiais por favores prestados a quaisquer líderes. Nunca os pedi, nem os mereci. Igualmente, jamais solicitei pagamento por serviços que me foram contratados. E vejo que sou rico como poucos o sonhariam".

Segue: "Tive oportunidades como nenhum outro as teve, mas nunca pus a mão no que não me pertencia. Tampouco pedi algo a alguém sem dar remuneração condizente. Ainda assim, faço juízo próprio das leis, dando-me por condenado".

Ninguém antes ensinara Navarra a refletir sobre a generosidade e o perdão: "Um grande conquistador deve sentir orgulho ao dar aos inimigos, a quem subjuga pela força, a chance de amá-lo como fazem os amigos".

Neste dezembro, os brasileiros lançam um olhar triste, na busca de um rasgo de céu azul para o país que amamos. Sobre mim, a arte outra vez exerceu o poder da esperança. Ler Montaigne foi o bálsamo que deu-me Stefan Zweig como presente de fim de ano.

GILBERTO SCHWARTSMANN Médico e professor gilberto.ez@terra.com.br

29 DE DEZEMBRO DE 2017
ARTIGO

PORTO ALEGRE E OS RINOCERONTES


Em dezembro, surfando na onda retrógrada na qual navega a sociedade brasileira, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre aprovou um projeto de lei que, entre outras medidas, submete as manifestações públicas à aprovação do município. Ainda, penaliza quem embaraçar ou impedir, por qualquer meio, o livre trânsito de pedestres ou veículos nos logradouros públicos. Tal legislação atinge o núcleo de uma liberdade fundamental: a de manifestação. 

E contraria a Constituição brasileira, que, afivelada a princípios democráticos, assegura amplamente a liberdade de manifestação sem necessidade de autorização do poder público. A Constituição estabelece apenas a exigência de prévio aviso à autoridade competente para evitar a duplicidade de eventos.

Vinculada à liberdade de expressão e ao sistema democrático de governo, a liberdade de manifestação é um instrumento de controle do exercício do poder e efetiva a participação na vida pública. Permite a expressão de ideias e de reivindicações, oxigenando a vida comunitária. A liberdade de manifestação é irmã siamesa da liberdade de expressão, só que realizada de modo coletivo. 

É um direito individual cujo exercício é coletivo. A priori, todo logradouro público é espaço para exercer o direito de reunião. Decerto, manifestações públicas fazem barulho, perturbam o trânsito. Mas quem as quer calar prefere o silêncio do arbítrio, esquecendo que a democracia é ruidosa. E se sabe que paz sem voz não é paz, é medo.

Por fim, se São Paulo já elegeu o Cacareco, se o Rio de Janeiro já elegeu o macaco Tião, Porto Alegre já elegeu os seus rinocerontes. E a peça de Ionesco deve ser lembrada!

Advogado e professor da Escola de Direito da PUCRS e FMP pmelgare@hotmail.com
PLÍNIO MELGARÉ

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017



28 DE DEZEMBRO DE 2017
O PRAZER DAS PALAVRAS
Car@s amig@s

HÁ MUITAS MANEIRAS 

de lutar pelos direitos da mulher mas mudar a flexão das palavras não é uma delas

Apesar de toda a sua genialidade, o velho e bom Machado de Assis não previu, entre as várias espécies de loucura que Simão Bacamarte catalogou, a sanha que leva alguns indivíduos a propor reformas na sua língua materna - exatamente aquela que, como diria Cervantes, ele bebeu junto com o leite da mãe. 

Alguns, talvez entrevendo o tamanho sacrilégio que vão cometer, limitam-se a propor sistemas ortográficos próprios, delirantes, feitos em casa, que ganham os seus quinze minutos de fama na imprensa e terminam melancolicamente na barraca de aberrações do circo gramatical (não é por acaso que a totalidade dessas propostas absurdas - todas elas autoproclamadas "salvadoras" ou "simplificadoras" - venha da pena de autodidatas, que não tiveram em suas vidas um mestre que os ensinasse a evitar tanto desperdício de inteligência e criatividade).

Pois o último grito nesta nau dos insensatos é uma proposta que vai ainda mais fundo que a simples troca de letras: como o leitor pode ver no título desta coluna, trata-se da recomendação de "corrigir" também o sistema morfológico do Português, a fim de "limitar ou eliminar a hegemonia masculina" e "tornar o Português mais próximo do igualitário", como apregoa, de boca cheia, um de seus arautos. Ora, como se aprende nos primeiros meses de qualquer curso de Letras que mereça esse nome, a tal "hegemonia masculina" não existe; usamos o gênero masculino para designar grupos mistos (o brasileiro é feliz - eles e elas) porque, como demonstrei na coluna anterior, ele é inclusivo, ao contrário do feminino, que exclui (a brasileira é feliz - apenas elas).

Infelizmente, explicar isso a esses malucos é tão inútil quanto pregar aos peixes, pois eles são surdos aos ditames da Ciência. Friso que um adepto dessa seita, horrorizado, jamais escreveria assim, mas optaria entre a arroba ou o "x" para substituir a terminação "o" ou "a" - "el@s são surd@s" ou "elxs são surdxs" - e o pior é que sairia com passo firme, orgulhoso, acreditando ter posto mais uma pedrinha na ereção (epa!) da pirâmide da igualde dos gêneros. Para quem não se deu conta, esta proposta estapafúrdia (felizmente limitada a alguns ambientes universitários inexpressivos) é uma tentativa de melhorar aquela moda esquisita de sempre mencionar, lado a lado, os dois gêneros, que andou em voga há poucos anos, lembram? 

O que é uma cortesia perfeitamente aceitável em "senhoras e senhores" fica insuportável em "Quando os professores e as professoras entrarem no recinto, o coro dos alunos e das alunas vai saudá- los (las) com uma polca caprichada". Melhor seria escrever "quando xs professorxs entrarem no recinto, o coro dxs alunxs vai saudá-lxs com uma polca caprichada"? Convenhamos que a nova alternativa é uma emenda muitíssimo pior que o soneto, e que nada se compara a "quando os professores entrarem no recinto, o coro dos alunos vai saudá-los com uma polca caprichada".

Gostaria de encerrar com duas mensagens, já que o Ano Novo está logo ali: aos leitores, peço que não se preocupem com essa loucurada toda, que vai fazer ainda algum barulho mas logo se extinguirá como um foguete de estrelinhas; aos adeptos desta reforma radical, peço que não abandonem a luta pela igualdade de direitos para o homem e a mulher, que é nobre, mas que tomem juízo e procurem maneiras mais sensatas e eficientes de fazê-lo. Ah, e que aproveitem o feriado para ler (ou reler) A Reforma da Natureza, do Monteiro Lobato, onde vão certamente aprender algumas coisinhas.

CLÁUDIO MORENO