DANUZA
LEÃO
Querer demais da
vida
Ser
apenas feliz, para certas mulheres, é pouco. Dizem que não têm vocação para a
vida normal e vão embora
Costuma
ser assim: as pessoas se conhecem, se encantam umas pelas outras, procuram
conhecer os amigos, a família, os gostos pessoais, e assim descobrir se foram
feitos um para o outro, para se unirem e serem felizes, até que a morte os
separe. Aí namoram e casam.
Bem,
para começar, é raro que duas pessoas se unam e sejam felizes até que a morte
as separe, e quando chegam a se descobrir, todo aquele enorme encantamento que
sentiram no primeiro encontro começa a complicar.
Ela
não gosta da mulher do melhor amigo dele -e já começa a implicar-, ele não vai
com a cara da irmã dela -e já começa a implicar-, um gosta de churrascaria, o
outro, de um japonês, e por aí vai.
Começa
então a tentativa de adaptação, cada um abrindo mão de certas coisas para que a
relação dê certo. As adaptações que eram feitas nos primeiros dias de namoro
com enorme prazer, um ano depois podem virar motivo de mau humor, e a verdade
verdadeira é que ninguém gosta de fazer concessões, cada um só quer fazer o que
quer e o que gosta.
É da
natureza humana, e natural, pois se duas pessoas gostam exatamente das mesmas
coisas, das mesmas pessoas, sentem fome e sono sempre na mesma hora, e por aí
vai, vira uma monotonia sem fim. Então que tal por uma vez fazer tudo diferente
e tentar que tudo dê certo, pelo menos por um tempo?
Seria
assim: uma mulher e um homem se conhecem, se olham, e sentem um total
arrebatamento um pelo outro. Nesse momento eles sairiam de onde estivessem -da
praia, do bar, da festa- e passariam a viver só desse amor, só para esse amor.
Nesse mesmo dia iriam morar juntos, sem saber dos defeitos um do outro, se
esconderiam do mundo, dos amigos, das famílias, e abririam mão de seus desejos
mais intensos para agradar ao outro. Não é assim, quando se ama?
E
como é assim, não brigariam por nada, não discutiriam por nada, não implicariam
com coisa alguma, e a vida seria uma total felicidade -por um tempo, é claro.
Mas chegaria o momento em que eles começariam a se conhecer melhor, e a vida
real invadiria um mundo que até aquele momento era só deles; com isso viriam as
complicações, as de sempre.
Teriam
que conhecer os amigos e as famílias, chegaria o dia inevitável em que um deles
-ela- diria que tem horror a futebol, e ele daria o troco dizendo que odeia os
filmes de Woody Allen que foi obrigado a ver, para lhe fazer a vontade. E
chegaria o dia cruel em que falariam pela primeira vez sobre política, e que
não iriam votar no mesmo candidato. A partir daí, viraram um casal feliz,
desses que se vê por aí.
Só
que ser apenas feliz, para certas mulheres, é pouco. Algumas dizem ao marido
que não têm vocação para a chamada vida normal, que vão embora. E ficam espantadas
-quase decepcionadas- quando eles dizem estar de acordo.
Porque
quem viveu momentos tão delirantes não pode se conformar com menos. Querem da
vida muito, tudo, tanto, que não aceitam vivê-la como ela é.
E
vão, cada um para o seu lado, na procura eterna de outros encontros
apaixonantes, mesmo que curtos, sabendo que para encontrá-los -talvez- vão
passar longas temporadas inteiramente sós.
danuza.leao@uol.com.br
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