DANUZA
LEÃO
Eu queria saber
Nós
que passamos a vida à procura de alguma coisa que nem sabemos bem o que é e que
nunca achamos
Este
mundo tem coisas muito curiosas. Gatos e cachorros, por exemplo, servem para quê?
E as girafas? E as flores?
Da
minha janela vejo árvores e passarinhos que não fazem senão voar e pousar nos
galhos, sempre muito inquietos; e alguém já viu passarinho dormir? Será que
eles se afeiçoam entre eles ou a alguém? Será que passarinho pensa? Será que
sofre?
Mas
tem quem sofra por causa deles; tenho um amigo que, quando encontrou o seu
morto na gaiola, ficou triste e entrou em depressão.
Passarinho
eu não sei, mas cachorro e gato sofrem pelo dono, e uma vez, quando fiquei
doente, meu gato não saiu de perto de mim um só instante.
Fico
pensando se é justo ter um cachorro ou um gato. É verdade que quem tem é porque
gosta, portanto trata bem; mas por outro lado, eles só comem o que nós
queremos, o território deles é limitado e só têm vida sexual se a gente
permite, e a gente nunca permite, olha que absurdo.
Dizem
os especialistas que se os machos não forem castrados e as fêmeas operadas, vão
nascer ninhadas e mais ninhadas que serão abandonadas em um parque qualquer, e
os filhotes vão morrer atropelados ou de fome, o que é de cortar o coração.
Mas é
de cortar o coração também ver um gato olhando o mundo pela janela, um gato que
não é dono de sua vida, que não pode passear quando quer e fazer o que lhe
passa pela cabeça -e que nem sei o que seria. E volto a pensar: para que eles
existem?
Girafas,
zebras e leopardos correndo na selva são um lindo espetáculo, mas um hipopótamo
ou um rinoceronte não despertam senão estranhezas. E as baratas? Bem que se
podia passar sem elas, mas ouvi de um ecologista que se todas as baratas do
mundo acabassem, o equilíbrio ecológico seria prejudicado, vai entender.
As
cigarras, essas a gente sabe: seu canto é só alegria, e elas existem para
anunciar o verão.
Frutas
são todas lindas, e só servem para nos alimentar. Mas e o café? Como terá o
primeiro homem inventado descascar o fruto, secar, torrar, moer e coar com água
quente para o prazer de tantos?
E as
borboletas? Não existe nada mais bonito do que uma borboleta voando, e às vezes
penso que elas, como as flores, só existem para embelezar o mundo.
E os
peixes, os sapos? Quem não caçou vaga-lumes e botou num vidro para brincar de
lanterna pode dizer que teve infância?
E nós,
para que existimos? Nós, que às vezes estamos felizes, outras infelizes, que
brigamos com o carpinteiro porque a gaveta não ficou exatamente como se queria,
nós que ficamos de mau humor porque engordamos dois quilos, nós que nos matamos
para ganhar mais dinheiro e morar numa casa maior com mais armários e poder
pagar bem caro a um médico para nos livrar dos tais dois quilos, nós que já fumamos,
já bebemos e ainda comemos mais do que devíamos, que amamos e desamamos sei lá por
que, e passamos a vida à procura de alguma coisa que nem sabemos bem o que é e
que nunca achamos, e estamos, a maior parte do tempo, insatisfeitos, geralmente
sem razão.
Nós,
que vamos aos shoppings para escolher um vestido e um sapato e uma bolsa para
usar numa festa que ainda nem sabemos se vai acontecer, nem se seremos
convidadas, e se formos, talvez nem vamos ter vontade de ir, dá para entender?
Eu
queria muito que alguém me explicasse tudo isso.
danuza.leao@uol.com.br
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