22 de julho de 2012 | N°
17138O
CÓDIGO DAVID | DAVID
COIMBRA
Um brinde em Londres
Da última vez em que estive em
Londres os pubs ainda fechavam às onze da noite. Diziam os ingleses que se
tratava de uma lei antiga, instituída para tentar evitar que os arqueiros do
rei se embriagassem durante as madrugadas, prejudicando-lhes a pontaria pelas
manhãs.
Então, às 23h o dono do pub batia
um sino anunciando que era a última chance de pedir cerveja. E os ingleses se
atiravam sobre o balcão e voltavam de lá com três pints nos braços. A pint,
você sabe, é aquele copázio em que cabe meio litro de cerveja.
Pois cada inglês se sentava com
três pints na frente, um litro e meio de cerveja, e eles bebiam com ruidosa
alegria, pouco ligando se a bebida amornava, e depois de toda a libação saíam
pelas ruas trançando pernas. As mulheres, sobretudo, ficavam muito bêbadas. A
cada quadra podia-se ver uma mulher vomitando ou caída na calçada. Você tentava
ajudar e os ingleses censuravam:
– Só um estrangeiro levanta uma
mulher do chão.
Lembro que as minissaias das
inglesas eram muito curtas, que elas se pintavam muito para sair, mas que não
eram exatamente belas. A verdade é que a Ilha não é conhecida pela formosura
das suas mulheres ou pela excelência da sua culinária. Eles comem feijão no
café da manhã e a salsicha deles é doce e ainda adoram peixe com batata frita e
um bolo de carne estranho.
Já as duas mulheres mais lindas
da Inglaterra em todos os tempos são a Elizabeth Hurley e a Grabrielle Anwar.
Elizabeth Hurley todos lembram dela: é a ex-mulher do Hugh Grant. E a Gabrielle
Anwar, quando jovenzinha de 22 anos, protagonizou uma antológica dança de tango
com Al Pacino em “Perfume de Mulher”. Há poucos anos, já mais madura, Gabrielle
participou do ótimo seriado The Tudors, e mostrou que continua em boa forma.
Agora, em Londres, na cobertura
da Olimpíada, gostaria de cruzar com Hurley ou Anwar, só para ver como elas
andam, se estão em boa saúde e tudo mais. Se não cruzar, tudo bem, pelo menos
há o consolo de saber que os pubs ficam abertos até mais tarde.
Vou indicar um ótimo livro para
você que, nesses tempos olímpicos, quer aprender mais sobre a Velha Albion, e
ao mesmo tempo se divertir. Trata-se de “Soberano”, de C.J.Sansom. É um romance
policial histórico que se passa no reinado de Henrique VIII. Faz parte da
Coleção Negra, da Record. O herói de Sansom é um advogado corcunda que, em meio
à trama, se converte em detetive.
O tempo de Henrique VIII foi um
tempo sombrio. Henrique pode ser considerado o rei mais polêmico da Inglaterra.
Foi ele quem rompeu com a Igreja Católica e criou a Igreja Anglicana. E por que
tomou essa atitude drástica? Por causa de uma mulher. O rei queria se casar com
Ana Bolena, mas, como já era casado com a santarrona espanhola Catarina de
Aragão, tinha de se divorciar. Pediu permissão ao papa para o divórcio, o papa
não concedeu e então Henrique criou sua própria Igreja, que lhe permitiria
fazer o que bem entendesse.
Deve ter sido uma mulher e tanto,
essa Ana Bolena, para enlouquecer o rei a tal ponto. Só que, depois de casar
com o homem, ela continuou enlouquecendo-o. Henrique cansou-se dela, como sói
acontecer com maridos de mulheres mimadas. Para arrematar, Ana não conseguia
dar-lhe um filho homem.
Henrique decidiu livrar-se dela.
Como? O rei concluiu que suportar a fama de ser corno era melhor do que
suportar a convivência com a mulher, alegou que ela o traía com o próprio irmão
(dela) e mandou-a para o cadafalso, onde foi decapitada de um único golpe de
espada por um carrasco mandado vir especialmente da França para a tarefa. Dizem
que o fantasma de Ana Bolena ainda vaga à noite ao redor da Torre de Londres,
com sua bela cabeça debaixo do braço. Vou passar lá uma noite dessas para ver
se vejo essa rainha fascinante.
Ana Bolena bem pode ser
classificada como uma das mulheres mais influentes da História. Além de ter
provocado a mudança religiosa de toda uma nação, foi mãe de uma ruivinha
chamada Elizabeth, que, depois de ser deserdada, presa e quase morta, se
transformaria numa das grandes rainhas da Inglaterra, conhecida no mundo
inteiro como A Rainha Virgem.
O Casamento
Ela ia casar em sete dias. Ele
estava casado havia cinco anos. Mesmo assim, ele a assediava sistematicamente.
Trabalhavam juntos, Leonel e Vitória, bastava levantar o queixo acima da tela
do computador para se avistarem. Assim, a abordagem ficava fácil. Leonel
passava os dias lhe enviando e-mails graciosos, Vitória se esquivava com
doçura.
Era divertido. Leonel exercitava
os músculos da sedução e mantinha no ar uma tênue fantasia que lhe coloria a
vida. Quando soube que ela se casaria em agosto, Leonel intensificou os
ataques. E agora, faltando uma semana para a cerimônia, resolveu apelar.
Enviou-lhe um e-mail com o seguinte texto:
“Vi: tenho uma proposta doida
para te fazer. Vamos fugir? Arrumamos nossas coisas hoje mesmo e amanhã de
manhã embarcamos para Londres. Vamos deixar nossos compromissos e preocupações
com esse inverno triste e viver o verão europeu, ver a Olimpíada britânica,
andar na maior roda gigante do mundo. Tenho algumas economias, podemos passar
pelo menos um mês na Velha Albion, vivendo uma paixão. Depois? Bem, depois
veremos o que fazer do resto das nossas vidas. Mas o certo é que sempre teremos
Londres. Topas?”
Leonel imaginou que nos dias
seguintes ela passaria censurando-o risonhamente pelo desatino romântico,
xingando-o com suavidade de “louco adorável” e chamando-o de volta às
responsabilidades de suas vidas comuns, mas não foi o que aconteceu. O que
aconteceu foi que ela respondeu:
“Topo”.
Simplesmente isso: “Topo”.
Leonel, a princípio, achou que ela estivesse brincando, mas não: nos e-mails
seguintes percebeu que ela falava muito a sério. Vitória QUERIA MESMO fugir do
casamento para viver o verão europeu. Mas que maluca! Que irresponsabilidade! E
o noivo? Ela não pensava no noivo? E os convidados? E os pais dela? E os filhos
de Leonel? Será que ela não lembrava que ele tinha dois filhos?
O pior é que não pensava em nada
disso. No resto do dia ela cobrou diretamente de Leonel as providências.
Levantou-se de sua mesa e caminhou, resoluta, até a mesa dele, enquanto Leonel
afundava na cadeira. Parou diante do computador e perguntou:
– Já está com as passagens?
Leonel gaguejou, desfez-se em
desculpas, inventou compromissos. A tudo ela ouvia, grave, olhando-o no olho,
até que balançou a cabeça e arrematou:
– Verme. Tu não passas de um
verme.
O casamento aconteceu no meio dos
jogos, e Leonel passou o resto do inverno sentindo-se, exatamente, um
minúsculo, rastejante e repulsivo verme.
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