segunda-feira, 23 de julho de 2012



23 de julho de 2012 | N° 17139
PAULO SANT’ANA

O desembargador brilhante

Estava eu esses dias a assistir ao programa Conversas Cruzadas, na TVCOM, que nessa noite era apresentado pelo Cláudio Brito.

Havia quatro debatedores no programa. Desculpem, mas não recordo agora dos nomes deles. Um era delegado de polícia, outro promotor público estadual, outro desembargador e o outro era advogado, representando não me lembro qual entidade.

Discutiam se a lei penal é rígida ou mole. E se a aplicação da lei penal era correta ou era condescendente.

Meus amigos, nunca vi um promotor mais duro, mais apegado à letra fria da lei, ele não queria dar chance a nenhum infrator. E lamentava que fosse tão frouxo o tratamento que a Justiça dá aos criminosos, mesmo aos que praticam crimes desimportantes.

Que promotor severo! Passava a impressão de que era juiz de uma corte marcial nazista. Tenho certeza que a maioria esmagadora dos seus colegas promotores que assistiram ao programa não aprovaram o que aquele promotor disse.

O delegado de polícia, infelizmente, aderiu às teses do promotor e veio com aquela lenga-lenga de que “a polícia prende e a Justiça solta”. Eu já escrevi mil vezes que só quem pode soltar é a Justiça. Ou queriam que a Justiça não soltasse e mantivesse presos todos os que são recolhidos à cadeia?

Alguém tem de soltar os presos e este é o papel da Justiça. Ou queriam que a polícia prendesse e ninguém mais soltasse os presos? Fosse assim e não precisava de Justiça, os delegados julgariam os presos e os sentenciariam, ora bolas!

O terceiro a falar era um advogado. Parecia inteligente, mas infelizmente não era articulado: não dava para entender o que ele dizia, fez uma enrolação gongórica tão confusa que sinceramente me pôs a nocaute a sua falta de clareza.

Até que chegou a vez do desembargador falar. Deu de relho nos três oradores anteriores. Não era afetado, não era pernóstico, falou uma linguagem simples que tenho a certeza foi entendida pelos telespectadores.

Mas o ponto central da argumentação do desembargador era o seguinte: ele disse que tinha de refletir muito antes de condenar uma pessoa, conhecendo que ela seria recolhida à imundície penitenciária do Presídio Central.

O desembargador não pregava a impunidade dos réus. Mas ele disse que era dever de qualquer juiz, antes de mandar recolher um réu ao Presídio Central, refletir se não haveria uma pena alternativa a ser usada, como a de serviços a serem prestados à comunidade ou até mesmo ser alvo de uma prisão domiciliar.

O luminar e espetacular desembargador a que me refiro, sem me citar, filiou-se a teses variadas que tenho pregado na minha coluna há anos, mediante as quais compete sim à Justiça analisar, quanto à pena, em que pocilga penitenciária será posto o réu, caso sua prisão seja decretada. E não disse mas deu a entender que é até melhor não condenar um réu culpado do que mandá-lo para os porões fétidos do Presídio Central e destruí-lo como ser humano.

Vibrei com o desembargador. Ele pareceu perceber uma verdade que prego há 40 anos em minha coluna: quanto mais sujos, inseguros, indecentes e atentatórios à segurança pessoal forem os presídios, mais inseguras e perigosas para a população em geral serão as ruas.

Mas essa minha tese não entra nunca nas cabeças de pedras das pessoas normais.

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