domingo, 7 de julho de 2013

Sobe o pano

ANTONIO PRATA

Sobe o pano

Saindo da clínica, achei que havia chegado a hora de encararmos a verdade: a Olivia não iria nascer

Os amigos haviam nos alertado: "A gravidez dura nove meses mais um século" --só esqueceram de nos avisar que esse século demorava tanto. A espera é angustiante, mas compreensível: produzir um ser humano inteirinho, do zero, com braços, pernas, neurônios, vesícula, cílios, um coração e, muito em breve, infinitas opiniões sobre Deus e o mundo, é um troço tão complexo que não seria despropositado se toda a existência do universo fosse consumida na formação de um único bebê.

Imagino um lance meio "2001 - Uma Odisseia no Espaço": o Big Bang como o momento da concepção, galáxias se formando feito órgãos, estrelas e planetas se multiplicando tais quais pequenas células, tudo se expandindo e se aglutinando, moldando um só corpo. Por fim, 13,7 bilhões de anos após a luz ter fecundado a escuridão, num domingo de julho nos idos de 2013, digamos, um neném gigante faria ecoar o seu pranto intergaláctico. Cai o pano.

Felizmente, não é assim, e cada um de nós (ou melhor, cada dois) pode brincar de Deus, fabricando uma criancinha para chamar de sua. Trinta e oito semanas, dizem os livros, é o que leva para ela estar completamente formada. Pois eis que chegou a 38ª semana, a 39ª, a 40ª e nada de nossa filha dar o ar de sua graça. O quarto estava montado. A mala da maternidade, feita. A cadeirinha, depois de uma batalha hercúlea, fora instalada no carro. O futuro avô viera de Florianópolis. Amigos mandavam SMSs: "E aí? Cadê??".

O ultrassom da última quarta não trazia novidades: a cabecinha ainda não tinha se encaixado, a dilatação não começara e a placenta funcionava perfeitamente, provendo nossa filha dos nutrientes e oxigênio necessários para que seguisse com suas atividades de costume: lutar muay thai durante o dia e dançar foxtrot noite adentro.

Saindo da clínica, achei que havia chegado a hora de encararmos a verdade: a Olivia não iria nascer. Tinha decidido ficar ali no morninho, com aquele cabo HDMI ligado diretamente à barriga, num "all inclusive" que nem o mais farto dos resorts sonharia em oferecer. E quem iria convencê-la a trocar a mordomia intrauterina pelas frias tardes de julho?

Sei que é muita pretensão imaginar que eu tive qualquer influência no processo, colando a boca na barriga da Julia e falando sobre o sol, a praia e a cachoeira, a girafa, o pinguim e o canguru, o doce de leite, a manga e o leitão, "Toy Story" 1, 2 e 3, mas o fato é que, lá pelas três da tarde daquela mesma quarta-feira, começaram as contrações. Quinze horas depois, numa batalha excruciante que só se compara, em dificuldade e emoção, à instalação da cadeirinha, nossa Olivia fez ecoar pelo Itaim seu pranto intergaláctico. Veio ao mundo com 48,5 cm, 3,71 kg e, para sua sorte, é a cara da mãe. Sobe o pano: aproveite o espetáculo, filhota.

Na coluna de 26 de junho, descrevi uma traumática visita à unidade Armênia do Detran. Faltou dizer que ela se deu em 2010. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, desde 2011 o Detran encontra-se sob nova direção (com o mesmo pessoal que implementou o Poupatempo) e a unidade Armênia está bem mais agradável e eficiente. Parabenizo-os pelo empenho civilizatório diante do descalabro kafkiano.

@antonioprata


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