RUTH
DE AQUINO
26/07/2013
22h04
A má-fé do terror oficial
A
lambança na JMJ só se compara à má-fé das versões oficiais dos protestos contra
Cabral
O
papa Francisco bota fé nos jovens. E você? Bota fé na PM e no governo do Rio de
Janeiro? O grau de lambança na logística da Jornada Mundial da Juventude só se
equipara à má-fé das versões oficiais sobre os protestos contra a corrupção e Sérgio
Cabral. Faltou “inteligência” na repressão fardada e infiltrada. Uma repressão
seletiva, que fere manifestantes e jornalistas, mas deixa rolar depredações e
saques com total impunidade – como aconteceu naquela madrugada no Leblon, até hoje
mal explicada. Quem engoliu a história do “pacto com a OAB” para não reprimir
crimes comuns contra lojas e patrimônio público?
PMs
sem identificação e policiais à paisana – os P2, fantasiados de manifestantes,
identificados com uma pulseirinha preta – criaram no Rio um clima de intimidação
física e psicológica. Há relatos de sequestro-relâmpago, ameaças de morte, armação
de flagrantes, acusações montadas de formação de quadrilha. Há detenções arbitrárias
“para averiguação”. Um clima que, como diz Cabral, “afronta o Estado democrático
de direito”.
Também
afronta a democracia o decreto inconstitucional de Cabral exigindo, “em 24 horas”,
das operadoras de telefone e provedores de internet, dados telefônicos e
informações sobre suspeitos. Ele refraseou o decreto, mas a OAB continua a tachá-lo
de ilegal. É essa “a agenda positiva” de Cabral para eleger seu vice Pezão?
Cabral teve a pior avaliação entre 11 governadores, segundo o Ibope. Só 19% o
apoiam hoje.
O
episódio com Bruno Ferreira Teles, manifestante preso “por porte de artefato” perto
do Palácio Guanabara, revelou o festival de contradições da PM. Vídeos e fotos
no Facebook foram essenciais. Em liberdade condicional por habeas corpus, Bruno
provavelmente ainda estaria preso se não fossem essas imagens. O procurador
Eduardo Lima Neto, presidente da comissão criada pelo governo para investigar
vandalismo, o denunciou por “tentativa de homicídio”.
O
que mostram os vídeos e fotos? Bruno com casaco e óculos de proteção, sem
mochila e sem máscara, na linha de frente da manifestação contra Cabral, junto à
grade, gritando. Subitamente, um coquetel molotov é lançado por trás dele. Um
policial à paisana, com camiseta e mochila pretas, tenta prender Bruno. Bruno dá
uma “voadora” no P2. PMs perseguem Bruno e atiram. Ele cai desacordado. Um PM dá
um choque no rapaz com a pistola Taser. Alguém o refreia: “Ele já está no chão!”.
Bruno
é arrastado pela rua por policiais. Recobra a consciência e é algemado. Policiais
mostram o colete metálico que ele usava – como “prova de vandalismo”. Um PM
grita: “Foi ele que tacou o primeiro coquetel molotov”. Bruno nega. “Ele é preso
de quem?”, pergunta um oficial. “Do P2”, responde o PM. Na delegacia, o
subcomandante da PM acusa Bruno formalmente de ter jogado o artefato. Ele é autuado
em flagrante na presença de representantes do Ministério Público e passa a
madrugada na cadeia.
Nas
redes sociais, acusa-se um P2 de ter lançado o coquetel molotov. Não há prova. A
PM diz ser “uma hipótese absurda imaginar que um policial possa cometer um ato
bárbaro contra um companheiro de farda”. O assessor de direitos humanos da
Anistia Internacional, o cientista político Mauricio Santoro, enxerga sinais de
que policiais à paisana desestabilizem passeatas para justificar a reação da PM.
Isso é muito perigoso. Já vimos esse filme antes e ele não acaba bem, não é,
presidente Dilma?
A geógrafa
Carla Hirt, de 28 anos, foi presa, agredida, ferida com bala de borracha e
acusada de formação de quadrilha com mais seis rapazes que não se conhecem. Pagou
R$ 700 de fiança “para não ser levada para (o presídio de) Bangu”. O videógrafo
Rafucko foi preso e algemado – e diz que o PM encheu sua camiseta com pedras
portuguesas para montar uma acusação, rejeitada pela delegada. O sociólogo
Paulo Baía foi vítima de sequestro-relâmpago por encapuzados armados, quando saía
para caminhar no Aterro do Flamengo.
“Disseram pra eu não dar mais nenhuma
entrevista falando da PM.” O estudante Rodrigo D’Olivera Graça, de 19 anos, diz
ter sido colocado por quatro encapuzados “no banco de trás de um Sandeiro
branco” e ameaçado caso não saísse das ruas. Aconselho a comissão de Cabral a
investigar todas as denúncias graves relacionadas aos protestos, se estiver
preocupada com direitos humanos.
Cinegrafistas
e jornalistas passaram a ser alvos de PMs no Rio. Câmeras foram quebradas. Um
policial prendeu “para averiguação” Filipe Peçanha, do Mídia Ninja, que transmite
as manifestações por internet. Outro PM deu golpe de cassetete na cabeça do fotógrafo
Yasuyoshi Chiba, da AFP. A versão da PM era: “Atingido por coquetel molotov lançado
por manifestante”. É condenável divulgar como “verdades” os releases da PM sem
investigar antes. Não bote fé.
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