29
de julho de 2013 | N° 17506
L.F.
VERISSIMO
O poder do
papa
Os
papas já tiveram o poder de reis. A história da Europa é, em grande parte, a
história desta divisão de poder e da luta entre os dois absolutismos, o dos
papas e o dos monarcas.
O
Geoffrey Barraclough (historiador favorito do Paulo Francis quando este ainda
era de esquerda e escrevia no “Pasquim”) tinha uma tese segundo a qual a
rivalidade de Roma com os reis explicava a superioridade da Europa sobre as
sociedades orientais, que já eram civilizadas quando a Europa ainda era terra
de bárbaros, mas governadas por dinastias antigas, rígidas e incontestadas, e
por isso paradas no tempo.
Na
Europa, quem não quisesse se submeter a uma monarquia tinha a opção de se
submeter à Igreja. A troca era de um império teocrático por outro, claro, mas
criou-se o hábito de dissidência e de pensamento dialético, prólogo para o
desenvolvimento científico que viria depois, apesar do obscurantismo da Igreja.
E a
opção determinou que a Europa não fosse um império monolítico, e sim uma
coleção de pequenos Estados. Acima de tudo, o pluralismo reforçou a
independência e a importância das cidades comerciais – Milão, Palermo, Gênova,
Veneza, Marselha, Barcelona, Antuérpia, Southampton, Lisboa, as cidades da Liga
Hanseática (o primeiro ensaio de um mercado comum europeu) etc., – cuja
competição impulsionaria as descobertas e a expansão colonial. Tudo isto porque
os papas eram iguais aos reis, inclusive na pretensão de representarem a
vontade de Deus na Terra, com exclusividade.
Dizem
que certa vez o Stalin reagiu à notícia de que o Vaticano o teria reprovado,
por alguma razão, com a pergunta desdenhosa: “E quantas divisões tem o papa?”
Desde que perdeu seu poder que rivalizava com o dos reis, o papa só tem a seu
dispor a Guarda Suíça, e assim mesmo para fins decorativos. Mas o Vaticano é o
grande exemplo de um Estado cuja potência não se mede com armas – pelo menos
não com armas convencionais.
Atualmente,
a julgar pela recepção que ele teve no Brasil, o arsenal do Vaticano se resume
no sorriso simpático de um homem. A Igreja não tem mais a relevância política e
histórica que teve antigamente, e sacrificou muito da sua autoridade moral com
posições retrógradas e escândalos financeiros e sexuais. Mas a emoção das
multidões que ele mobilizou serviria como uma resposta ao Stalin.
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