14 de julho de 2013 | N° 17491
FABRÍCIO CARPINEJAR
O
apaixonado jamais adia encontro
Quem está apaixonado não desmarca encontro. Cancela
trabalho, família, viagem, mas não suspende compromisso.
Assume prejuízo, enfrenta chefia, suporta calado todos os
dissabores, mas não abre mão. Não nega o que foi firmado.
Mesmo que tenha trocado o mês ou se confundido com a data,
assume o erro como acerto e segue em frente. Troca de turno com colega, compra
amigos, arruma atestado médico.
Quem está apaixonado jamais desmarca encontro. Nem altera
horário. Não tem coragem de pedir para que seja mais cedo ou mais tarde. Não é
capaz de reivindicar 10 minutos a mais ou a menos. Não mexe no assunto. Não
adapta planos. Não negocia prazos.
Aceita a data como um desígnio. Uma audiência de Justiça.
Uma convocação da Receita Federal. Se não for, tem a sensação de que será
preso, condenado por esnobar o amor.
Não brinca com a autoridade do encontro. Receia que não
aconteça de novo, não arrisca zombar do destino. Não oferece chance ao azar.
Teme um imprevisto, penteia o calendário, apressa o relógio e o coração.
Vive o transe de ser feliz, a hipnose de não pensar em um
segundo plano. Quem está apaixonado não arranja desculpa, inventa saídas.
Quem está apaixonado não se presta a solicitar fiado, paga à
vista. Só aquele que realmente não sente saudade é que adia encontro. Se o café
é sempre postergado é que falta vontade.
Adiar compromisso é sinal de desamor. Não precisa de mais
nenhuma prova. Não há aquele interesse máximo, aquela tara, aquela dependência.
O sujeito pode ter uma justificativa nobre: imposição do
emprego, doença, tragédia. Nenhum pretexto servirá para remendar a esperança. Não
se mexe em encontro entre apaixonados. Deixa para adoecer depois, deixa para
morrer depois.
Se alguém liga para reagendar sacrificou a paixão. É aviso
fúnebre, é velório da voz. Significa que não está realmente a fim. Demonstra
que tem um interesse passageiro, efêmero, pouco sério.
O apaixonado enlouquece com a simples hipótese de não ver
mais o outro. Não vai estragar a importância do enlace, diminuir a expectativa,
mostrar desapego.
Eu fiquei imensamente eufórico ao lembrar que nunca
desmarquei nada com minha mulher, Juliana. Fui me gabar para ela: - Amor,
jamais cancelamos nenhum encontro entre nós, não é legal? Juliana me analisou
com desconfiança:
- Fabrício, a gente só teve um encontro e não mais nos
desgrudamos. Eu percebi que a tática para não sofrer com atrasos e remanejos é
permanecer junto desde o primeiro beijo. E não se soltar mais.
Foi o que eu e Juliana fizemos. A paixão é um sequestro. O
amor é quando pagamos o resgate.
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