22/07/2013
- 03h30
Editorial Folha: Nova etapa
A
economia mundial passa por um período de grandes transformações que trará consequências
duradouras para o Brasil.
Chegou
ao fim a fase de bonança externa, que durou de 2004 a 2011 e decorreu da alta
dos preços das exportações brasileiras --ocasionada pela demanda chinesa por
matérias-primas e, mais recentemente, pelo aumento do fluxo de capitais para países
emergentes.
Nesse
período, os termos de troca (a relação entre os preços das exportações e os das
importações) subiram 40%, algo inédito nas últimas décadas. Foi um presente
externo que equivaleu, em seu melhor momento, a uma afluência de riqueza para o
Brasil da ordem de 3% do PIB ao ano.
Graças
a esses fatores, o Brasil acumulou US$ 370 bilhões em reservas internacionais. Os
resultados dessa sobra de recursos foram a persistente valorização cambial --com
a chegada de mais dólares ao país, a cotação cai-- e a redução estrutural da
taxa de juros real (já descontada a inflação), que passou de cerca de 8% no início
da década passada para 2,5%.
Aspectos
internos também favoreceram a aceleração temporária do crescimento. Em 2004,
havia enorme capacidade ociosa no mercado de trabalho --a taxa de desemprego
caiu de 12,2% naquele ano para 5,5% em 2012-- e amplo espaço para a expansão do
crédito --o volume de empréstimos ainda era muito baixo no Brasil.
Políticas
de distribuição de renda completaram o ciclo, propiciando uma grande expansão
do consumo e a ascensão da chamada nova classe média.
As
consequências de tais episódios de abundância de liquidez externa são bem
documentadas na história. Se não houver escolhas domésticas que a direcione
mais para investimentos produtivos e menos para gastos do governo e consumo
privado, a tendência é que se acumulem desequilíbrios.
Alguns
dos principais: valorização excessiva do câmbio (que prejudica a
competitividade da indústria local), aumento da inflação nos setores de serviços
(propiciado pelo ganho de renda) e crescimento desmedido nos preços de ativos,
especialmente imóveis.
São
padrões visíveis no Brasil nos últimos anos, sobretudo após 2008, quando o
governo resolveu dobrar sua aposta no crescimento do consumo e no afrouxamento
dos gastos públicos.
Hoje,
o ambiente é outro. Os EUA superam a crise e retomam uma trajetória de
crescimento --o que deve absorver recursos direcionados aos países emergentes. A
China cresce mais devagar --o que deve forçar uma diminuição dos preços de matérias-primas.
Vêm
pela frente condições externas mais difíceis para o Brasil: não haverá a mesma
abundância de recursos disponíveis, e os termos de troca já estão caindo --desde
2011, a redução foi de 10%.
Nesse
ambiente, são mais rígidos os limites para a expansão do consumo que não seja
abastecido pela produção doméstica. Recorrer às importações para satisfazer à demanda
interna torna-se demasiado custoso. O deficit externo já disparou, e deve
chegar a US$ 80 bilhões neste ano --o modelo é, como se vê, insustentável.
O
resultado é um movimento estrutural de desvalorização do real. Com o dólar mais
caro, diminui o poder de compra do trabalhador brasileiro. Em um cenário
adverso como esse, os bancos reduzem a disposição para emprestar (até porque os
clientes já estão endividados) e o preço dos imóveis tende a estacionar.
As
empresas, por sua vez, param de contratar novos trabalhadores --e não se
descarta que venham a demitir parte de sua mão de obra.
Ao
lado desses novos riscos há oportunidades para corrigir rumos. É necessário que
as estratégias empresariais mudem. O governo, por sua vez, precisa repensar a
inserção do Brasil na economia mundial --o país, voltado para o mercado
interno, ficou à margem das cadeias globais de produção.
A
desvalorização estrutural do câmbio, em si, favorece uma nova etapa de
industrialização --ao menos em tese, a produção nacional ganhará competitividade
sobre os importados, ora mais caros.
Para
que o setor tire proveito desse rearranjo, porém, é preciso focar em
produtividade, redução de custos, infraestrutura e capacidade de inovação. Nada
disso ocorrerá sem a reconstrução da competência gerencial do Estado e das
parcerias com o setor privado.
Outro
ponto crítico é o combate à inflação --mais difícil no novo cenário cambial--,
para evitar que a vantagem obtida com um real mais fraco seja corroída pelos
custos internos ao longo do tempo.
A
agenda dos próximos anos exige renovação. Se o governo insistir em manter sua
estratégia (ou a falta dela), sem reconhecer a necessidade de mudanças, o país
continuará a perder tempo e, provavelmente, passará por adversidades.
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