sexta-feira, 12 de julho de 2013


12 de julho de 2013 | N° 17489
DAVID COIMBRA

Aprendendo a odiar

A Biblioteca Esquecida de Hitler é um livro que conta a história dele, Hitler, através dos livros que possuía. Muito interessante. O homem tinha mais de 16 mil livros divididos em três grandes bibliotecas. Lia um livro por noite. De tudo: de Kant, Schopenhauer e, é claro, Nietzsche, ao seu grande ídolo, o americano Henry Ford, que, além de enriquecer inventando o Modelo T e a linha de montagem, escreveu uma alentada e repugnante obra antissemita intitulada O Judeu Internacional. Era o livro de cabeceira de Hitler.

Quando a II Guerra estourou, Ford tentou tirar todos os exemplares das livrarias e espalhou que não havia sido ele o autor, que outros escreveram e ele só havia assinado. Que nada. Ford era antissemita mesmo, e por isso Hitler o admirava tanto e até o condecorou.

Nesse A Biblioteca Esquecida, o autor conta que Hitler gostava muito da filha do seu fotógrafo pessoal, Henriette Hoffmann Von Schirach, a quem chamava de “meu raio de sol”. Ocorre que, durante um jantar íntimo, isso já em meio à guerra, Henriette reclamou do tratamento dado pelos nazistas às mulheres judias de Amsterdã.

– Não posso acreditar que você saiba sobre elas – disse em tom de queixa a Hitler, que endureceu o rosto, levantou-se em silêncio e, em seguida, rosnou:

– Você é sentimental, senhora Von Schirach! Precisa aprender a odiar. O que as mulheres judias da Holanda têm a ver com você? A partir daquela noite, o raio de sol do ditador afastou-se dele para sempre.

Mas o que me interessou em especial foi o conselho de Hitler à moça: “Você tem que aprender a odiar”. Você tem que aprender a odiar.

Os seres humanos aprendem a odiar, realmente. A maldade pode ser ensinada. Pode se tornar um hábito. Mas, em geral, as pessoas não querem nada disso. Conheço poucas pessoas más, pessoas movidas pelo ódio, que desrespeitam outras pessoas como conduta de vida. Poucas, de fato. A maioria prefere viver em paz. E é por isso que o ser humano busca a rotina. A rotina é a segurança, é a garantia de paz.

O que leva o homem a romper a rotina e meter-se em confronto com outros homens é o descontentamento com sua própria vida. É a frustração. O povo brasileiro está frustrado e por isso rasga a rotina, sai à rua e procura o confronto. As coisas deveriam estar dando certo para o brasileiro, e não estão. Então, o brasileiro grita.

E gritam todos, em todas as instâncias: estudantes invadem a câmara de vereadores, médicos fazem passeata, caminhoneiros fecham estradas, prefeitos vaiam a presidente da República. Ninguém está feliz no Brasil. Ontem mesmo recebi um e-mail de uma entidade, e esse e-mail era também um grito: “Nada muda sem violência!”

Nada muda sem violência, dizia o e-mail.


Eu diria o contrário. Diria que nunca vi algo de bom ser construído com violência. Mas não é a conclusão a que estão chegando muitos dos brasileiros. Como já disse, os brasileiros, por todas as razões que conhecemos, estão frustrados. A frustração lhes dá raiva. E a raiva, tristemente, pode ensiná-los a odiar.

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