08
de julho de 2013 | N° 17485
ARTIGOS
- Paulo Brossard*
O plebiscito e o milagre
Édifícil
mostrar boas razões a autorizar a adoção do plebiscito, subitamente lançado aos
quatro ventos pela senhora presidente, depois de uma visita a seu antecessor na
cidade de São Paulo, em companhia do 40º ministro, como alcunhado o marqueteiro
do reino. A essa descoberta juntou-se outra, a da Constituinte de tal maneira
cerebrina que, no dia seguinte, a própria presidente arquivou a novidade.
No
entanto, o fato certo é que enquanto a presidente insistia em suas suposições,
parcelas significativas de sua “base de sustentação” não ocultavam divergências
com a chefe partidária. E na medida em que a presidente falava mais grosso, a
maioria de seus companheiros se tornava mais explícita, em divergir ainda que
discreta. Já havia ocorrido o extravio da sua popularidade, minguando de 65%
para 57%, e agora a queda foi ainda maior, de 57% para 30%, mas ainda assim
mantendo uma primeira colocação; em face desta novidade, a primeira no curso de
seu governo, houve quem a interpretasse como “oscilação natural” nada
preocupante, enquanto outros descobriam um dado que se ampliaria
inexoravelmente, havendo poucos os que, cautelosamente, esperavam uma ou mais
apurações de opinião para emitir um julgamento.
Se
na primeira apuração a perda foi de oito pontos, a última revelou resultado
alarmante, surpreendendo o próprio Planalto, que esperava queda menor; foi de 27
pontos, significando que a presidente perdera a condição de ser reeleita no
primeiro turno.
Supondo
recuperar o tempo de dormência e inoperância, não fez senão ostentar seu olímpico
desprezo aos sinais ocorrentes. Imaginou um golpe definitivo: formulou consulta
ao Tribunal Superior Eleitoral. Pela clareza, equilíbrio e objetividade, a
resposta foi modelar; para significar a importância dada à consulta formulada
pela senhora presidente, a resposta consignou o pensamento de todos os
Tribunais Regionais Eleitorais.
Todos.
E não deixou de lembrar o disposto no art.16 da Constituição, segundo o qual “a
lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação,
não se aplicando à eleição que ocorra até um ano de data de sua vigência”.
Essa
norma, esclareça-se desde logo, foi inserida na Constituição exatamente para
banir uma legislação casuísta, geralmente concebida e editada em horas tardias,
com efeito transitório e para compor interesses de grupos. Agora, mal referido
o óbice do art.16, não faltariam conspícuos sicofantas a sustentar que seria
possível afastar a incidência in casu do preceito constitucional, mediante
norma que embrulhasse o preceito em regra provisório, que dispusesse sua não
aplicação ao caso.
A
ata da reunião do TSE, presidido pela ministra Carmen Lúcia e de todos os
presidentes de todos os TRE, em linguagem pedagógica registrou que “a justiça
Eleitoral tem processos formais a cumprir para dar conta de suas tarefas
constitucionais e legais. Por isso depende do tempo próprio a que tanto se
possa exercer”.
Dir-se-ia
que a solene resposta dada pela Justiça Eleitoral à consulta formulada pela
presidente da República fosse levada na devida consideração. Ao contrário, o
plebiscito continuou a ser falado. A presidente fez algo que em mais de dois
anos de governo jamais havia feito: pela primeira vez reuniu seu ministério,
contudo, não o reuniu para com ele examinar os problemas e indicar soluções ou
experiências; ao contrário, a presidente revelou aos seus ministros apenas o
que fizera como presidente! Isso se não diz tudo, diz muito.
Outrossim,
sem nenhuma ação concreta no tocante ao propalado plebiscito, voltou a falar
nele como se não se tratasse hipótese abortiva, como se esse instrumento
pudesse ser substituto do Congresso em matéria legislativa e, pelo fato de ter
a participação popular, possuir dotes legislativos e até pendores
constitucionais. Em outras palavras, um engodo, ficando de pé a pergunta – por
que e para quê? À espera de um milagre?
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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