12
de agosto de 2013 | N° 17520
ARTIGOS
- PAULO BROSSARD*
De médicos e
letras
Por
motivos ignorados, o governo, ou sua chefe, interferiu ostensivamente no setor
elétrico ao antecipar a renovação das concessões e impor a redução das contas
de luz; deixou para o futuro prover os meios para a solvência da medida
simpática. Agora parece ter chegado a hora das dificuldades aparecerem em sua
real expressão; alguns alvitres sugeridos foram afastados e o problema
continuou insoluto. Até quando não se sabe. O caso revela o que tem sido dito.
O
governo tem gasto e muito. Mas de maneira inadequada, deixando de lado setores
fundamentais. Baseando sua concepção de política econômica no aumento do
consumo, desprezou investimentos ditos de base ou de infraestrutura, e só
agora, segundo divulgado, teria se convencido da necessidade de rever seu
traçado teórico; ora, os seus efeitos dessa revisão, quando efetivada, não se
colhem no dia seguinte; enquanto isso, o termo de quadriênio se aproxima, a
reeleição tem data certa e os resultados podem ser tardios.
Esse
raciocínio parece explicar sinais de desconforto supostamente experimentado
pela chefe de governo aferrada à modesta queda da taxa inflacionária; longe de
mim contraditá-la, mas me permito notar que enquanto a presidente dá ao fato
caráter de permanência, seu ministro da Fazenda ao mesmo tempo alude à
tendência de aumento da inflação no segundo semestre do ano em curso. E esta
foi, em editorial, observada sensatamente que seria irresponsabilidade negar a
existência de pressões inflacionárias...
Mudo
de assunto. Semana passada, participei do lançamento de mais um livro, e era o
terceiro em período que não fora longo. Dei-me então conta de que os autores
eram altas expressões da medicina, ao mesmo tempo que frequentavam as boas
letras. Pela ordem dos lançamentos, são eles: o Dr. Nei Mário Amaral, autor de
Desesperadamente Vivo, elegante edição da “Buqui”, o Dr. Fernando Lucchese, Não
Sou Feliz, Por Quê?, e cuja copiosa produção é editada pela L&PM, e o Dr.
James Freitas Fleck, o último a ingressar nas cidades das letras, com o volume
Conexão Anticâncer, as múltiplas faces do inimigo interno, em bela edição da
Movimento.
Desnecessário
dizer que todos os três volumes têm traços mais ou menos acentuados com as
atividades profissionais dos autores. Na roda de médicos a que cheguei,
ocorreu-me lembrar que parece que os médicos voltaram a ser escritores, pois se
vários fundadores da Academia de Letras eram médicos ilustres e ao longo do
primeiro centenário a prática se repetiu, o mesmo ocorreu no Rio Grande do Sul;
no jornalismo, Fábio de Barros e Raul Pilla, ambos professores de Medicina,
Fábio de Barros, sob o pseudônimo de Vitoriano Serra, durante anos exerceu o
jornalismo, dominava as letras antigas, gregas e latinas e a literatura
ocidental, predominantemente francesa e alemã; Raul Pilla, durante decênios,
escreveu na imprensa no Rio Grande, São Paulo e Rio de Janeiro artigos
preferencialmente de natureza política, pois durante toda sua vida também
exerceu atividade política, sendo parlamentar e dirigente partidário; sua linguagem
tinha a correção, nobreza e limpidez, assim como invejável poder de síntese que
o caracterizava.
Outro
consumado mestre da pena foi Olintho de Oliveira, como crítico de arte, Ramiro
Barcelos, o autor da insuperável sátira Antônio Chimango, mais adiante Cyro
Martins e Dyonélio Machado, médicos e autores consagrados; e pedindo perdão
pelas omissões e para encerrar com um contemporâneo, o Dr. José A. Camargo,
notabilidade cirúrgica nacional e internacional e que semana por semana escreve
admiráveis crônicas em sua simplicidade e humanidade. Teria muito a dizer, mas
o tempo acabou, quer dizer, o tempo não, o papel.
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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