16
de agosto de 2013 | N° 17524
DAVID
COIMBRA
A menina da banda
Queimaram
os instrumentos da banda daquela escola de Eldorado do Sul. Na verdade,
queimaram a escola inteira, mas o que os alunos mais lamentaram foi a perda dos
instrumentos. Vi pela televisão uma aluna chorando em meio aos destroços da
sala da banda. Depois, ela se ajoelhou em frente ao xilofone que jazia destruído
no chão, tomou de uma baqueta e começou a bater tristemente nas teclas. Foi
tirando um som melancólico, não sei se chegou a fazer música, a reportagem
terminou antes que os acordes se juntassem.
Fiquei
pensando naquela menina. Ela toca xilofone e, é evidente, sente-se importante
por isso. Lembrei da banda do colégio em que eu estudava, o Costinha, na Zona
Norte profunda. Achava bonito aquilo de tocar na banda, embora eu mesmo nunca
tivesse tocado. Uma vez cheguei a tentar o tarol, mas não tive paciência para
seguir em frente. Ninguém faz música no tarol. Você não chega a uma festa, pega
o tarol e encanta as meninas. Não. Não nasci para o tarol. Definitivamente.
Havia
concurso de bandas de colégio naquela época, e a banda do São João sempre
vencia. O desfile do 7 de Setembro era chamado de “A Parada da Juventude”. Passávamos
por muito ensaio durante o ano para desfilar no 7 de Setembro e o fazíamos com
garbo, mas, depois, descobrimos que desfilar no 7 de Setembro era apoiar os
militares ou coisa que o valha, e começamos a boicotar o desfile do 7 de
Setembro e até a banda perdeu um pouco do seu encanto.
Mas,
agora, vendo a menina às lágrimas diante do seu xilofone queimado, vendo-a
bater com dor nas teclas meio derretidas, agora penso que o ato singelo de
tocar numa banda de colégio ainda pode ser algo construtivo para a
personalidade de uma criança. E penso que, assim como há adolescentes capazes
de incendiar a escola em que estudam, há outros que se comovem diante de um
instrumento quebrado, há os que gostam do lugar em que vivem e das pessoas com
as quais convivem, há os que sentem orgulho de tocar xilofone.
Ela
toca xilofone.
A
brutalidade pode ser facilmente desencadeada, uma brincadeira pouco inteligente
de quatro guris pouco inteligentes. A brutalidade pode ser simples. Mas a
felicidade também. A menina de Eldorado do Sul toca xilofone e isso faz com que
se sinta bem. É só do que ela precisa. Do xilofone e da banda do colégio. Simples.
Como a vida tem de ser.
Nenhum comentário:
Postar um comentário