sexta-feira, 21 de setembro de 2012



21 de setembro de 2012 | N° 17199
DAVID COIMBRA

A culpa do povo

O Brasil é uma porcaria porque o povo brasileiro é uma porcaria. E, antes que alguém proteste, protesto eu que não vai aí nenhuma consideração racial, pela límpida razão de que raça não existe. Inclusive, o que há de melhor no Brasil é a miscigenação. Entre o final dos anos 30 e a arrancada dos 40, Stefan Zweig viveu seis meses no Rio e escreveu um livro ingênuo em quase tudo, Brasil, o País do Futuro.

O livro só não era ingênuo na percepção que Zweig teve da macia integração de povos diferentes no Brasil, ao contrário do que ocorria na Europa belicosa e racista. O estrangeiro chega aqui e vira brasileiro no mesmo dia. Chamam-no de alemão, se for loiro; de turco, se for de algum país vagamente árabe; de japonês, se tiver olhos amendoados; e tudo isso significa que ele será igual a qualquer outro para partilhar uma cerveja ou para ser assaltado.

O problema do brasileiro não é este. O problema do brasileiro é moral. Há quem diga que “as elites” brasileiras têm culpa de tudo o que há de ruim no país. Trata-se de um pensamento elitista, que acredita que a “boa elite” constrói um país mais justo. As elites são tão ruins quanto o resto da população que refocila sob elas.

Tome o exemplo da corrupção: um povo que não é corrupto não elege, repetidamente, Congressos corruptos. O brasileiro elege. No Exterior, o brasileiro tem fama de ser ladrão. É o que nós somos. Somos ladrões, egoístas, trapaceiros e vulgares.

E somos tudo isso do alto das elites que sobrevoam São Paulo de helicóptero ao subsolo de quem sobrevive com a Bolsa-Família no Nordeste profundo. O brasileiro, em geral, e quando falo em geral é, sim, uma generalização, a sua avó pode ser uma exceção, pois o brasileiro em geral é um deficiente moral, seja qual for sua classe social ou sua conta bancária. Nosso Congresso nos representa bem.

O Brasil de hoje não tem jeito, nem tem saída. Certas fronteiras morais foram ultrapassadas, e agora não há mais como voltar. Não é o crescimento econômico que vai ajudar o país, como se acredita. Se o governo destinar R$ 20 mil mensais vitalícios a cada brasileiro, o Brasil não vai melhorar. Talvez piore.

A única solução para o Brasil está no título do pueril livro de Stefan Zweig. É pensar no país do futuro. Nas crianças. Os brasileiros, nós todos, devíamos fazer um pacto: tudo o que construiremos, daqui para frente, será para as crianças. Esqueçamos de nós mesmos, nós velhos, nós adultos, e pensemos nas crianças. Só elas, daqui a 30 ou 40 anos, terão chance de viver num país em que as pessoas não tenham medo de ser assaltadas e, depois, atropeladas pelo próprio carro roubado, como ocorreu dias atrás com um homem de 80 anos de idade em Porto Alegre.

Só elas poderão, talvez, sair de casa sem ter de levar um “kit assalto”, como recomendam especialistas em segurança. Só elas, quem sabe, se orgulharão de seus eleitos, em vez de se envergonhar deles. Só elas terão possibilidade de morar num lugar em que as pessoas se respeitam, e não desconfiam umas das outras.

As crianças. Só as crianças podem fazer com que, bem depois do nosso desaparecimento, o Brasil seja, de fato, o país do futuro.

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