16 de setembro de 2012 |
N° 17194QUASE PERFEITO |
Fabrício Carpinejar
Filho único do amor
“Tenho 30 anos, ele, 42. Nunca
casou, é jovial sem ser ridículo. Viajamos, nos divertimos. A receita parece
dar certo. Amigas sabiam do passado negro dele. No e-mail, enquanto ele dormia,
vi comunicação com outras meninas. Por que homens precisam de outras janelas
quando uma porta está aberta? Mirna”
Querida Mirna,
Já matou a charada
intuitivamente: ele é o solteirão convicto. Não se interessa em casar. Sua
rotina é falar com várias amigas ao mesmo tempo e manter sua dominação
territorial. Não entrega a carteira de sedutor. Acompanhado ou não, mantém uma
rede de contatos sempre atualizada.
É como um chefão preso; continua
dando ordens de dentro do presídio. Seus amigos mandam as últimas notícias da
farra e o mantém informado dos movimentos de conhecidas.
Homem sem antecedentes
matrimoniais até os 40 é pior do que boneco inflável. Poderá encher ou esvaziar
seu ego que ele não mudará a concepção de independência. Dificilmente se dispõe
a trocar o estado civil e abdicar da fama junto às mulheres. Prefere o conforto
da privacidade ao trabalho de ceder espaço e abdicar do próprio passado. É um
tipo decidido, costuma ter profissão consolidada, que serve como desculpa para
a falta de tempo.
Seu namorado nasceu para relações
curtas e efêmeras. Deve preferir namorar no inverno, ideal para programas a
dois e viagens românticas, mas encerra a relação no verão, quando deseja estar
com condicionamento físico em dia e aproveitar a liberdade das baladas.
Não é o perfil que trai, é o que
termina e não oferece chance para intimidade mais longa. É inconcebível a ideia
de morar com outra pessoa e partilhar seus segredos e perder suas manias. É o
filho único do amor. O filho mimado. Não admite dividir o quarto.
Saída de
emergência
“Vamos não vamos, nos perdemos,
voltamos. Ele mudou de cidade, mas sempre ia me ver. Uma semana antes de eu ir
para a Suécia, ele pediu que eu ficasse, propôs morar com ele. Foi da boca para
fora. Ele vasculha minhas fotos e mural no Facebook, mas não manda mensagem.
Será que não sou nada? Graça”
Querida Graça,
Vocês criaram aquilo que chamo de
“romance de saída de emergência”. É um relacionamento que não conhece paz,
harmonia e calma, adora crises e cresce com a possibilidade do fim.
Quando estão perto de romper em
definitivo, as juras são renovadas e alimentam a ilusão de que o relacionamento
engatou de vez. Em seguida, com a estabilidade, a convivência retoma o
batimento e voltam a provocar um ao outro por uma nova declaração e picos de
audiência cardíaca.
Ele ama você, mas não ama a vida
que pode ter com você.
Ele ama você, mas odeia estar
amando. Compreende o amor como uma maldição, uma pegadinha do destino. Pretende
ficar próximo, mas rejeita o cenário de simbiose e dependência.
Confia que o amor é uma
fragilidade a ser evitada. Atrapalhará sua liberdade de ir e vir, prejudicará
os negócios e o desempenho profissional. O amor é uma espécie de inimigo
insaciável, a exigir disponibilidade para gentilezas, mimos e cuidados.
Ele experimenta a seguinte crise:
não se separa e também não se entrega. Procura se livrar do amor, mas não de
sua companhia.
Isso explica a vigília em
silêncio (vasculhando seu Facebook) e a natural resignação diante dos
adiamentos e promessas quebradas (como a do aeroporto).
Entendeu a contradição?
Não construiria minha vida para
chamar seu retorno. Não mudaria os hábitos ou inventaria viagens loucas para
atrair seu desespero. Vai sofrer muito.
Não pode ser metade do que você é
porque ele não é inteiro.
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