domingo, 16 de setembro de 2012


DANUZA LEÃO

Tudo é notícia

A última das novidades é que se pode decidir (em termos) sobre nossa própria morte e deixar tudo escrito

Todo dia aparece uma novidade que ocupa o noticiário; passa o tempo, e um dia vem outra, muitas vezes desdizendo a primeira. Um exemplo: há anos os dermatologistas dizem que não se pode sair de casa, nem para ir na banca de jornal, sem protetor solar; alguns, mais radicais, mandam usar protetor até em escritórios onde a luz é fria, e raros são os liberais, que deixam que se tome dez minutos de sol às 7h da manhã -e mesmo assim, usando protetor no corpo inteiro.

Acontece que não se vai à praia só por prazer; praia, aliás, é das coisas mais desconfortáveis que existem, e onde se vai, sobretudo, para pegar uma cor; só que, com o protetor, passamos o verão inteiro cor de bicho de goiaba (branca), o que não é justo. Aí eu vejo centenas, milhares de pessoas tomando sol até três, quatro da tarde, gente bronzeada mostrando seu valor; abro uma revista e vejo fotos das mais lindas atrizes, nas mais maravilhosas praias, todas parecendo irmãs de Gabriela, e fico pensando. Será que o sol da Sardenha e de St. Tropez é diferente do nosso?

Afinal, achar um lugarzinho na areia, morrer de calor debaixo do sol e sair branquinha não tem nenhuma graça, e um passeio de barco é um castigo que não se deve desejar a nenhum inimigo: o barco balança, a comida é ruim e pouca, e o gelo acaba na primeira meia hora. Branca para sempre? Mas que castigo.

Mas eis que surge uma nova onda; segundo ela, usando o tal protetor, o cálcio, tão importante na vida até mesmo dos bebês, não é absorvido pelo organismo, e a falta de cálcio é um convite à osteoporose, o que faz total sentido. A vida é um problema.

Durante um bom tempo, falou-se muito de bullying, e as psicólogas e educadoras deram as mais inteligentes opiniões sobre o assunto, que afinal nem é tão novo -só o nome é novidade. Sempre se soube o quanto as crianças podem ser cruéis, e desde que o mundo é mundo maltratam os colegas que não são iguais a elas, ou porque têm cabelo vermelho, ou porque usam óculos e por aí vai; vão aprender, mas só com o tempo -e nunca mais se falou no tal de bullying.

A última das novidades é que se pode -ou se deve- decidir (em termos) sobre nossa própria morte, e deixar tudo por escrito, isto é, como encarar a hora final. É uma ideia, mas uma ideia -data vênia- dolorosa, pensar e depois escrever como programar nossos últimos minutos. E quem dá a ordem ao médico para desligar os aparelhos? E se houver ainda uma esperança de vida e o médico tiver se enganado? E se, e se, e se? Um pesadelo, e até o momento, não me vejo com coragem de enfrentar o assunto; mas mesmo sem querer, pensei nele outro dia.

Foi curioso; eu sofro de insônia, e já acordo ligada, sempre. Mas ontem, quando acordei, estava sonolenta. Sabe quando a gente diz "estou morrendo de sono?", coisa que aliás não acontece nunca aos insones? Pois foi assim. Não sei quanto tempo durou, mas foi muito bom eu estar "morrendo de sono" e poder ficar na cama, aproveitando esse momento raro, dormindo mais um pouquinho. E pensei: isso não se pode deixar por escrito, mas seria bem bom terminar a vida assim: morrendo de sono.

Mas quem pode nos dar essa felicidade? Um parente, um amigo, o médico? Sei lá, pois delegar a alguém essa responsabilidade não é fácil. E quem quer ter esse poder? Um filho, um amigo? Não penso que eu aceitaria, se alguém me pedisse.

O que me leva a uma só conclusão: a vida já foi mais simples, e a morte também.

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