DANUZA LEÃO
Tudo é
notícia
A última das novidades é que se pode decidir (em termos) sobre
nossa própria morte e deixar tudo escrito
Todo dia aparece uma novidade que ocupa o noticiário; passa
o tempo, e um dia vem outra, muitas vezes desdizendo a primeira. Um exemplo: há
anos os dermatologistas dizem que não se pode sair de casa, nem para ir na
banca de jornal, sem protetor solar; alguns, mais radicais, mandam usar
protetor até em escritórios onde a luz é fria, e raros são os liberais, que
deixam que se tome dez minutos de sol às 7h da manhã -e mesmo assim, usando
protetor no corpo inteiro.
Acontece que não se vai à praia só por prazer; praia, aliás,
é das coisas mais desconfortáveis que existem, e onde se vai, sobretudo, para
pegar uma cor; só que, com o protetor, passamos o verão inteiro cor de bicho de
goiaba (branca), o que não é justo. Aí eu vejo centenas, milhares de pessoas
tomando sol até três, quatro da tarde, gente bronzeada mostrando seu valor;
abro uma revista e vejo fotos das mais lindas atrizes, nas mais maravilhosas
praias, todas parecendo irmãs de Gabriela, e fico pensando. Será que o sol da
Sardenha e de St. Tropez é diferente do nosso?
Afinal, achar um lugarzinho na areia, morrer de calor
debaixo do sol e sair branquinha não tem nenhuma graça, e um passeio de barco é
um castigo que não se deve desejar a nenhum inimigo: o barco balança, a comida é
ruim e pouca, e o gelo acaba na primeira meia hora. Branca para sempre? Mas que
castigo.
Mas eis que surge uma nova onda; segundo ela, usando o tal
protetor, o cálcio, tão importante na vida até mesmo dos bebês, não é absorvido
pelo organismo, e a falta de cálcio é um convite à osteoporose, o que faz total
sentido. A vida é um problema.
Durante um bom tempo, falou-se muito de bullying, e as psicólogas
e educadoras deram as mais inteligentes opiniões sobre o assunto, que afinal
nem é tão novo -só o nome é novidade. Sempre se soube o quanto as crianças
podem ser cruéis, e desde que o mundo é mundo maltratam os colegas que não são
iguais a elas, ou porque têm cabelo vermelho, ou porque usam óculos e por aí vai;
vão aprender, mas só com o tempo -e nunca mais se falou no tal de bullying.
A última das novidades é que se pode -ou se deve- decidir (em
termos) sobre nossa própria morte, e deixar tudo por escrito, isto é, como
encarar a hora final. É uma ideia, mas uma ideia -data vênia- dolorosa, pensar
e depois escrever como programar nossos últimos minutos. E quem dá a ordem ao médico
para desligar os aparelhos? E se houver ainda uma esperança de vida e o médico
tiver se enganado? E se, e se, e se? Um pesadelo, e até o momento, não me vejo
com coragem de enfrentar o assunto; mas mesmo sem querer, pensei nele outro dia.
Foi curioso; eu sofro de insônia, e já acordo ligada, sempre.
Mas ontem, quando acordei, estava sonolenta. Sabe quando a gente diz "estou
morrendo de sono?", coisa que aliás não acontece nunca aos insones? Pois
foi assim. Não sei quanto tempo durou, mas foi muito bom eu estar "morrendo
de sono" e poder ficar na cama, aproveitando esse momento raro, dormindo
mais um pouquinho. E pensei: isso não se pode deixar por escrito, mas seria bem
bom terminar a vida assim: morrendo de sono.
Mas quem pode nos dar essa felicidade? Um parente, um amigo,
o médico? Sei lá, pois delegar a alguém essa responsabilidade não é fácil. E
quem quer ter esse poder? Um filho, um amigo? Não penso que eu aceitaria, se
alguém me pedisse.
O que me leva a uma só conclusão: a vida já foi mais
simples, e a morte também.
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