MAURICIO
STYCER
Tristes tardes
Programas vespertinos de
televisão apostam na ideia de que "é isso que o público quer". Duvido
SÃO 17H de quarta-feira quando
uma moça, apresentada como advogada, surge na tela. Diante dela, sentada, uma
senhora carrancuda pergunta qual é o problema que a traz ali. "Já tentei o
exame da OAB duas vezes e não passei", ela explica, antes de perguntar se
vai ser bem-sucedida na terceira tentativa.
Sem mover um músculo do rosto,
Mãe Dináh dá a receita. Primeiro, pense positivamente. Depois, coloque um ovo
numa panela com leite e acrescente a mensagem com o pedido: "Eu quero
passar". Deixe ferver. "Você vai ver como consegue
tranquilamente", assegura a vidente.
A cena se passa ao vivo, no palco
da TV Gazeta, em São Paulo, durante o programa "Mulheres", uma
espécie de decano das atrações vespertinas na televisão.
No ar desde 1980, primeiro com o
nome "Mulheres em Desfile", o programa ajudou a fixar a ideia de que
o público deste horário, supostamente feminino, está interessado em programas
descontraídos, em ritmo de conversa na sala de estar, sobre todo tipo de
bobagem.
A produção precária da Gazeta e o
jeitão descontraído de Catia Fonseca, apresentadora do "Mulheres",
ajudam a passar a impressão de que a conversa, seja sobre esoterismo, fofoca,
moda ou gastronomia, está de fato ocorrendo na casa da sogra.
Por justiça e mérito, Catia é uma
campeã em aparições no "Top 5" do "CQC", dedicado a gafes e
situações ridículas exibidas na televisão. Esta semana, por exemplo, comentando
uma foto indiscreta da atriz Kristen Stewart que vazou na internet, a
apresentadora sublinhou: "Ela tá com a mão assim, tapando o fiofó".
"Mulheres" sofre hoje a
concorrência direta de duas atrações com formato semelhante, "Muito
+", na Band, e "Programa da Tarde", na Record. Ambos exploram a
mesma premissa -de que é preciso entupir o público com bobagens no meio da
tarde-, mas dispõem de mais recursos, embalagem "moderna" e
apresentadores mais famosos.
Comandante do "Muito
+", Adriane Galisteu não aparece tanto quanto Catia Fonseca no "Top
5" do "CQC", apesar de também merecer, mas é campeã em matéria
de capas da "Caras". Esta semana, ela mostrou no ar a enésima revista
que a exibe sorridente anunciando que está "pronta para ter o segundo
filho".
Seus companheiros de programa não
fizeram nenhuma piada a respeito, mas logo deram início ao que Galisteu chamou
de "fofocaiada" -uma sessão de comentários sobre notícias publicadas
em revistas e sites do mesmo ramo que a "Caras". Dois atores de
"Avenida Brasil" foram criticados com severidade por se recusarem a
comentar fofocas sobre o suposto namoro deles.
Na Record, Ana Hickmann passou
quase uma hora na casa de praia de Gugu Liberato, conversando sobre assuntos
tão palpitantes quanto o implante de cabelos do apresentador e a cor da cueca
que ele usa para dormir.
Numa entrevista com Sabrina Sato,
um repórter perguntou: "A primeira vez que você fez amor foi com o Dhomini
ou com o Felipe?". Ao que a moça respondeu, espantada: "Mas o
programa é da tarde".
Contando isso assim, selecionando
os "melhores" momentos, chega a parecer engraçado. Mas é triste.
Com base em pesquisas, números de
audiência, intuição ou simples preconceitos, esses programas vespertinos
apostam na ideia de que "é isso que o público quer". Duvido. Na minha
opinião, expressam simplesmente a incapacidade de oferecer algo melhor.
mauriciostycer@uol.com.br
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