18
de setembro de 2012 | N° 17196
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Venha, por
favor
Eu
espero alguém que não desista de mim mesmo quando já não tem interesse. Espero
alguém que não me torture com promessas de envelhecer comigo, que realmente
envelheça comigo. Espero alguém que se orgulhe do que escrevo, que me faça ser
mais amigo dos meus amigos e mais irmão dos meus irmãos. Espero alguém que não
tenha medo do escândalo, mas tenha medo da indiferença.
Espero
alguém que ponha bilhetinhos dentro daqueles livros que ela tem certeza que vou
ler até o fim. Espero alguém que se arrependa rápido de suas grosserias e me
perdoe sem querer. Espero alguém que me avise que estou repetindo a roupa na
semana. Espero alguém que nunca desista de conversar mesmo quando não sei mais
falar. Espero alguém que, nos jantares entre os amigos, dispute comigo para
contar primeiro como nos conhecemos.
Espero
alguém que goste de dirigir para nos revezarmos em longas viagens. Espero
alguém que confie se a porta está fechada e o café desligado, se meu rosto está
aborrecido ou esperançoso. Espero alguém que prove que amar não é contrato, que
o amor não termina com nossos erros.
Espero
alguém que não se irrite com a minha ansiedade. Espero alguém que possa criar
toda uma linguagem cifrada para que ninguém nos recrimine. Espero alguém que
arrume ingressos de teatro de repente, que me sequestre ao cinema, que cheire
meu corpo suado como se ainda fosse perfume.
Espero
alguém que não largue as mãos dadas nem para coçar o rosto. Espero alguém que
me olhe demoradamente quando estou distraído, que goste de me telefonar para
narrar como foi seu dia. Espero alguém que procure um espaço acolchoado em meu
peito quando cansada. Espero alguém que minta que cozinha e só diga a verdade
depois que comi. Espero alguém que leia uma notícia, veja que haverá um show de
minha banda predileta, e corra para me adiantar por e-mail. Espero alguém que
ame meus filhos como se estivesse reencontrando minha infância e adolescência
fora de mim.
Espero
alguém que fique me chamando para dormir, que fique me chamando para despertar,
que não precise me chamar para amar. Espero alguém com uma vocação pela metade,
uma frustração antiga, um desejo de ser algo que não se cumpriu, uma melancolia
discreta, para nunca ser prepotente. Espero alguém que tenha uma risada tão
bonita que terei sempre vontade de ser engraçado.
Espero
alguém que comente sua dor com respeito e ouça minha dor com interesse. Espero
alguém que prepare minha festa de aniversário em segredo e crie conspiração dos
amigos para me ajudar. Espero alguém que pinte o muro onde passo, que não se
perturbe com o que as pessoas pensam a nosso respeito. Espero alguém que vire
cínico no desespero e doce na tristeza. Espero alguém que goste de domingo em
casa, de acordar tarde e de andar de chinelos, e que me pergunte o tempo antes
de olhar para as janelas.
Espero
alguém que me ensine a me amar porque a separação apenas vem me ensinando a me
destruir. Espero alguém que tenha pressa de mim, eternidade de mim, que chegue
logo, que apareça hoje, que largue o casaco no sofá e não seja educada a ponto
de estendê-lo no cabide. Espero encontrar uma mulher que me torne novamente
necessário.
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