sábado, 15 de setembro de 2012



16 de setembro de 2012 | N° 17194
PAULO SANT’ANA

A espera

Escrevi no último domingo que, quando eu era criança, havia na frente de minha casa um coqueiro em que um casal de canários-belgas fazia ninho e de lá emitia cantos de estupenda beleza.

Pois inúmeros leitores me mandaram dizer que cometi um engano e, pelas razões que alegaram, acho que o cometi mesmo.

Eles me mandaram dizer que o canário-belga é uma ave exótica (não faz parte da fauna brasileira) e que certamente não eram belgas os canários que me deliciavam com seus trinados em minha meninice.

Mandaram dizer mais: 1) os canários-belgas só fazem ninho em gaiolas, não sobrevivem sequer um mês no meio silvestre e em liberdade, não poderiam, assim, morar no coqueiro da minha infância; 2) em liberdade, os canários-belgas morrem de fome ou de frio; 3) entre os canários-belgas, assim como os nossos canários-da-terra, quem canta é o macho. O canto serve para a corte durante o acasalamento.

Feitos, então, os esclarecimentos, declaro que não raro um cronista se equivoca, ainda mais na lembrança de fatos ocorridos 60 anos atrás.

A espera pelo prazer anseia. A espera pelo castigo aterroriza. A espera pelo amor palpita. A espera pelo rompante de ciúme da parceira delicia.

A espera pela dor angustia. A espera pelo silêncio azucrina. Enquanto a espera pela fé suscita a dúvida, a espera pela morte assombra.

A espera pela vingança entusiasma. A espera pelo dentista gela.

A espera pela guerra tensiona. A espera pela fortuna é um devaneio.

A espera pela pobreza faz o homem tombar. Já a espera pela promoção de cargo no serviço dilacera.

A espera pela separação desnorteia e a espera pelo matrimônio empolga.

A espera pelo dia seguinte traz agitação. E a espera na sala de espera é constrangedora, um olhando para o outro e logo desviando o olhar, igual quando se está dentro do elevador lotado.

Na infância, a espera para ser adulto é angustiante, principalmente entre os adolescentes que não veem chegar o dia em que poderão dirigir automóvel.

Já na maturidade, está sempre à nossa espera o sonho de voltar a ser criança.

A espera pela fila da consulta e da cirurgia no SUS desespera.

Escrevi que no engarrafamento na BR-101, em Laguna, domingo passado, lamentavelmente os policiais rodoviários multavam todos os motoristas que usavam o acostamento para diminuir um pouquinho a angústia de três horas andando a dois quilômetros por hora. Centenas de multas, quando deveriam os policiais se dedicar naquela excepcionalidade somente a organizar aquele caos.

Responderam-me diversas pessoas, entre as quais algumas autoridades, afirmando que é necessário observar a lei e até atentar para que também o acostamento serve para socorro em caso de acidente, discordando completamente de mim.

E eu prossigo dizendo que em caso de engarrafamento-monstro, não se justifica multar quem recorre ao acostamento.

Finalmente: dia 11 de setembro de 2001, quando foram derrubadas as duas torres em Nova York, milhares de carros trafegaram durante horas contra a mão em Manhattan.

Será que foram multados? Respondam por favor!

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