sábado, 15 de setembro de 2012



15 de setembro de 2012 | N° 17193
NILSON SOUZA

Crônica para ler no bonde

Andei lendo sobre o grande escritor Malba Tahan, pseudônimo de um modesto professor de escola pública que transformou a Matemática em tema de histórias encantadoras, além de ter revelado profundo conhecimento do mundo árabe sem jamais ter viajado ao Oriente.

O carioca Júlio Cezar de Mello e Souza, que não era meu parente apesar do sobrenome bonito, também militou no jornalismo – como bico, pois em 1918 os professores já ganhavam mal – antes de se transformar no reconhecido autor de mais de cem livros, entre os quais o best-seller O Homem que Calculava. E foi na seção de literatura do seu jornal que tentou emplacar sua primeira obra literária – um conto curto para ser lido no bonde.

Ponto na história de Malba Tahan, quem quiser que busque mais informações sobre ele – e vale a pena. O que me chamou a atenção na biografia, e o que gostaria de compartilhar com os heroicos leitores e leitoras deste texto de mais de 30 linhas, é exatamente essa questão da leitura rápida, da literatura de ocasião, pensada para ocupar a atenção dos passageiros do tempo.

O livro de bolso, que já foi moda nos países que viajam de trem ou metrô, também virou literatura longa numa sociedade que leva a internet na palma da mão. Outro dia observei seis pessoas numa parada de ônibus: três falavam ao celular, uma consultava sua caixa de mensagens, outra digitava torpedos e a última segurava uma pasta junto ao corpo, provavelmente um tablet, que só não estava visível por motivos de segurança. Livros, nem pensar.

A rendição às poucas letras é tamanha, que até a própria Academia Brasileira de Letras promoveu recentemente um concurso de microcontos para Twitter, sob o pretexto de atrair escritores (leitores?) jovens. Milhares mandaram os seus recados, e a vencedora, uma conterrânea de Malba Tahan chamada Bibiana (nome pra lá de literário), até que escreveu uma coisa interessante e divertida: “Toda terça ia ao dentista e voltava ensolarada. Contaram ao marido sem a menor anestesia. Foi achada numa quarta, sumariamente anoitecida”.

Dá, sim, para escrever pouco e dizer muito. Mas esta economia de palavras e pensamentos não pode servir de justificativa para a preguiça. Veja-se, por exemplo, o conto Os Trinta e Cinco Camelos, escrito pelo homem que calculava as suas histórias: nem curto nem longo, com diálogos significativos, enredo engenhoso e final surpreendente. Dá para ler no bonde, no ônibus, no trem-bala, no avião e até na internet. Não perca.

Se você ainda não leu – e chegou, com fôlego, ao final desta crônica –, considere-se habilitado para a aventura. Bom proveito.

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