14
de setembro de 2012 | N° 17192
DAVID
COIMBRA
A atriz e o
julgamento
Li
que a atriz Mayana Alves, uma morena com aragem de miss, que algum dia deve ter
feito muito sucesso em alguma novela, ou talvez faça agora mesmo, pois li que
essa atriz assiste ao julgamento do mensalão como se fosse filme de suspense.
Mayana não consegue despegar os grandes e amendoados olhos da tela azul da TV,
e vibra a cada condenação, como se ganhasse um Kikito.
Sei
que nem todos os brasileiros se sentem tão fascinados assim pelo julgamento
quanto Mayana, mas todos os que conheço estão, como ela, torcendo pela
condenação dos réus. Muitos acreditam que a danação dos eventuais corruptos
significará um marco para o país: será um sinal de que a nação não tolera mais
a impunidade, e, daqui para frente, tudo será diferente.
Já
eu aqui não acredito em nada disso. Duvido que o Brasil vá avançar um palmo devido
a esse julgamento, exatamente por causa do espírito que embala a morena Mayana
e a maioria da população no acompanhamento dos votos dos juízes. Porque o
espírito que os move é um espírito de justiçamento, não de justiça.
Tome
outro julgamento em outro país. O do racista Breivik, que assassinou 77 pessoas
na Noruega no ano passado. Dificilmente qualquer gênero de corrupção será mais
grave do que matar uma pessoa, quanto mais 77. No entanto, os noruegueses não
assistiram ao julgamento de Breivik “torcendo” pela punição mais dura possível.
Certas
pessoas “do povo” que foram entrevistadas, assim como entrevistada foi a atriz
Mayana, disseram apenas esperar que, durante o seu período na prisão, o
assassino compreendesse como estava errado ao fazer o que fez.
E,
depois da sentença de 21 anos de reclusão numa cela confortável e asseada, com
TV a cores e banheiro limpo, nenhum norueguês reclamou da brandura da lei. Nem
os familiares das vítimas. Breivik saiu da sala do tribunal empertigado e
sorridente, arrogando-se vitorioso, lamentando não ter executado ainda mais
gente. Ainda assim, não houve, na Noruega, nenhuma manifestação de repúdio.
Confesso
ter ficado um pouco chocado no início. Era civilidade demais. Depois refleti. O
norueguês confia no sistema. O brasileiro suspeita do sistema. Onde está o
problema, neste caso? No brasileiro ou no sistema? O brasileiro confiaria mais
se o sistema fosse melhor? Ou o sistema seria melhor se o brasileiro confiasse
mais nele? Como tornar o brasileiro mais consciente e o sistema mais justo?
Não
sei.
Sei
que nunca seremos noruegueses. Nunca seremos tão civilizados. Mas, olhando
assim de longe para eles lá no alto, no lado de cima do Equador, penso que,
pelo menos, poderíamos tentar.
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