03
de junho de 2012 | N° 17089
Artigos ZH
TOGAS NO DIVÃ
Um
Supremo formal, mas nada discreto
Juristas
e magistrados dizem que código de conduta poderia ajudar a evitar episódios
constrangedores
Com
11 integrantes e dois séculos de existência, o Supremo Tribunal Federal (STF)
foi concebido para reunir o mais elevado cabedal jurídico do país, com a missão
de garantir o cumprimento da Constituição Federal.
Todavia,
nem mesmo o rigor formal que barra a entrada na Corte de mulheres com ombros
desnudos ou penteado extravagante impediu que nos últimos tempos o STF
protagonizasse sucessivas polêmicas, com ministros envolvidos em contendas
políticas ou trocando o linguajar empolado por bate-bocas constrangedores.
– O
colegiado é um ninho de víboras – resumiu, esta semana, Marco Aurélio Mello,
com a experiência de quem há 22 anos está no STF.
A
mais recente celeuma foi o mal explicado encontro entre o ministro Gilmar
Mendes, o ex-presidente Lula e o ex-ministro do STF Nelson Jobim. Mendes afirma
ter sido chantageado por Lula, que teria oferecido proteção na CPI do Cachoeira
em troca do adiamento do julgamento do mensalão. Lula e Jobim negaram o teor da
conversa. Mendes reagiu, dizendo que era vítima de uma central de boatos
operada por “bandidos, chantagistas e gângsteres”. Já Celso de Mello disse que
Lula poderia sofrer processo de impeachment, caso seguisse presidente.
Embora
o STF esteja cada vez mais atuante, com decisões importantes no vácuo da
omissão do Congresso, o episódio reacendeu o debate sobre o comportamento da
cúpula do Judiciário. No entendimento de juristas, políticos e ministros de
Cortes superiores, nenhum dos três envolvidos agiu de forma correta. Na
avaliação predominante, porém, Mendes não poderia ter se encontrado com Lula no
escritório de um advogado, em um compromisso fora de sua agenda oficial.
–
Imagina o que aconteceria nos Estados Unidos se um ministro da Suprema Corte
fosse a um escritório de advocacia? O mundo cairia – compara o deputado Miro
Teixeira (PDT-RJ).
Essa
não foi a primeira vez que Mendes se envolve em discussão. Depois de se
desentenderem no plenário do STF, em 2009, ele e Joaquim Barbosa trocaram
ofensas pela imprensa. Mendes chamou Barbosa de “preguiçoso” e “despreparado”.
O revide foi virulento. Barbosa classificou o contendor de “violento” e
“atrabiliário” – que significa propenso à briga, à cólera – , e o acusou de
aparelhar o Supremo com “interesses monetários e partidários”.
Estudioso
prega isolamento
Há
dois meses, Barbosa também bateu boca pelos jornais com o então presidente
Cezar Peluso. Classificado de “inseguro” e com “temperamento difícil” por
Peluso, Barbosa disse que o colega era “tirano, desleal e caipira”.
Para
o ministro Guilherme Caputo Bastos, do Tribunal Superior do Trabalho, a
frequência com que essas diatribes vêm ocorrendo demonstra a necessidade de um
código de conduta para a magistratura.
Com
a ressalva de que é amigo de Jobim e Mendes, e de que dificilmente recusaria um
encontro com um ex-presidente, Bastos diz que faltam regras claras para reger
os ministros de cortes superiores.
– O
STF deveria capitanear um debate sobre a criação de parâmetros de comportamento
– prega.
Na
opinião de Bastos, o destempero cresceu a partir de um protagonismo exacerbado
dos ministros, fruto das transmissões ao vivo das sessões.
Nos
últimos anos, a imprensa flagrou ministros admitindo ter julgado com a “faca no
pescoço” (Ricardo Lewandowski, no recebimento da denúncia do mensalão) e
trocando inconfidências em plenário sobre o voto dos colegas (Lewandowski e
Cármen Lúcia, na mesma ocasião).
Para
o jurista Dalmo Dallari, o excesso de exposição cria uma imagem negativa do
STF. Professor da Universidade de Paris e com experiência em cortes europeias,
Dallari defende que o Supremo seja transferido de Brasília, a exemplo do que
ocorre na Alemanha:
– A
cúpula judiciária tem de ficar longe do centro do poder político. E ministro
não tem nada de dar entrevista, fazer acusações, mexericos. Isso prejudica a
autoridade do Judiciário.
fabio.schaffner@gruporbs.com.br
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