quarta-feira, 13 de junho de 2012


MARCELO COELHO

Gente fina é outra coisa

Seria, a meu ver, um grande passo para a reforma política se, ao lado da Ficha Limpa, viesse a Lei Grecin

EIS UMA boa notícia na pré-campanha para a Prefeitura de São Paulo. O candidato José Serra vai dar um tempo na clássica combinação calça bege e camisa azul.

É o que informou a Folha deste domingo. Entram os jeans, a camisa branca e -lance ousado- os sapatênis. Há também novidades nos óculos, mais atualizados.

Na verdade, o antigo visual tucano me parecia adequado ao candidato; alguma dose de risco existe na mudança. Mas por que não?

O estímulo para isso, do ponto de vista político, vem do marketing do adversário, Fernando Haddad. Com poucos eleitores a conhecê-lo, o petista se apresenta como "homem novo para um tempo novo".

Nada mais velho, aliás, do que falar em tempos novos para uma cidade que, a cada dia que passa, sai menos do lugar.

Não importa -o aspecto visual é tudo na política hoje em dia. Por isso mesmo está nas livrarias o "Guia de Estilo para Candidatos ao Poder - E para Quem Já Chegou Lá".

É uma publicação da editora Senac e tem três autores: Luci Molina, jornalista que já fez um livro em companhia de Lila Covas, Milla Mathias, advogada e consultora de estilo, e Sergio Kobayashi, que "coordenou diversas campanhas" desde 1984. Vejo na internet que ele foi assessor de Mário Covas (1930-2001).

O gênero "tucano fino" é recomendado, de forma geral, ao longo do livro, embora não faltem elogios à transformação visual operada por Duda Mendonça em Lula. O caso Maluf, outro sucesso do marqueteiro, foi omitido. Evidentemente, não interessa aos autores do livro glorificar a farsa, a mentira, a empulhação eleitoral pura e simples.

Torne-se a coisa mais agradável, contudo, e já será um progresso. O terno verde dos candidatos nanicos, enunciando sílaba por sílaba o que leem nos "teleprompters", seria assim aposentado com proveito.

Terno? Os autores me corrigem. Paletó e calça do mesmo tecido atendem pelo nome de "costume". Terno, como a palavra indica, exige uma terceira peça, o colete.

Essa é fácil. Mas desafio o mais elegante político a distinguir entre os diversos tipos de sapato exemplificados no livro. Quando deixar de lado o "barcroft" e usar o "derby"? Saiba que o "full brogue" só pode ser usado em ocasiões informais. É, digamos assim, o contrário do "monkstrap".

Perto dessa sofisticação, outras dicas do livro parecem deslocadas. Por exemplo, a de evitar meias cobrindo as canelas quando se usa bermuda.

Há omissões. Posso estar enganado, mas não vi nenhum anátema contra pintar o cabelo. Seria, a meu ver, um grande passo para a reforma política se, ao lado da Ficha Limpa, viesse a Lei Grecin, tornando inelegíveis os usuários do produto. Outra omissão: os autores apontam o erro de usar cinto e suspensório ao mesmo tempo -mas nesse ponto valeria ser mais radical. Suspensórios deveriam ser evitados "tout court".

Tiveram sua moda durante alguma bolha do mercado financeiro aí por 1990, mas a desconfiança que inspiram só é comparável, a meu ver, àquela provocada pela gravata clara com camisa escura.

O livro acerta nesse ponto: a opção "resulta num visual de mafioso". Não é isso o que queremos, certamente. Afinal, diz o primeiro parágrafo, "a sociedade nos toma por aquilo que parecemos ser". Uma vez que "os políticos são eleitos pela imagem que transmitem", continuam os autores, "é dever deles aprimorá-la".

Por que não? Mas será possível? Temo que o costume perfeitamente combinado, com sapatos pretos (o livro restringe o uso do marrom) e a gravata discreta, não se diferencie muito, aos olhos de parcela da população, do visual mafioso abominado pelos consultores de estilo.

Seria então melhor mudar de roupa o tempo todo? Esquecer o paletó e chegar ao extremo da camiseta regata? Ninguém ousaria chegar a tanto. Quem sabe aquelas camisetas que os jogadores mostravam no final das partidas, com mensagens evangélicas ou familiares, fossem a melhor inovação.

Escreveriam seus slogans, de preferência em inglês: "Change!", "yes, we can", "young candidate", e sua eficácia comunicativa cresceria bastante. Um simples "agora vai!", dependendo do caso, daria conta do recado. Uma última recomendação dos autores merece ser lembrada. "Se quando você se sentar, o bolso abrir demais, está na hora de comprar uma calça um ou dois números maior". Vai que alguma coisa cai lá de dentro.

coelhofsp@uol.com.br

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