CRISTIANE
SEGATTO
As garotas e a imagem corporal
distorcida: quando casar sara?
Estudo
revela que até mulheres de 75 anos se preocupam excessivamente com o corpo
Como
sofrem as adolescentes e as garotas nos primeiros anos da juventude! Quem
observa de fora, mas próximo o suficiente para demonstrar solidariedade, se
pergunta por que a natureza precisa ser tão malvada nessa fase da vida. Por que
tantas mudanças hormonais em pouco tempo, por que tantas adaptações cerebrais,
por que tantos desafios a enfrentar de uma só vez?
A
infância protegida vai ficando para trás, as meninas são compelidas a sair dela
e a assumir responsabilidades num ambiente que pode ser libertador e ao mesmo
tempo, e quase sempre, hostil. Tudo isso sem ter um cérebro completamente
pronto para enfrentar a vida adulta. Sem ter a serenidade de entender que a
vida é dura, mas nela tudo passa. Como convencer uma adolescente de que somos
capazes de superar quase todos os obstáculos que a vida nos impõe? E que, na
maioria das vezes, as coisas acabam bem?
Acho
que não temos o direito de tentar convencer ninguém de coisa alguma. Só observar
e apoiar em todas as horas. Esses fenômenos biológicos e comportamentais devem
ter um propósito nobre. Talvez seja uma prova de resistência. Uma maratona
dupla. Uma corridinha de 84 quilômetros para preparar as garotas e os garotos
para o que vem depois. Quem sobrevive à adolescência e aos primeiros anos de
juventude fica pronto para o que der e vier. O casamento, a maternidade, a
maturidade, a velhice, a morte.
São
muitas as aflições enfrentadas pelas meninas (sucesso escolar, popularidade, a
conquista de um lugar no mundo, as amizades, os amores correspondidos e os não
correspondidos). Uma das mais cruéis é a preocupação com a imagem corporal. Cuidar
do corpo, procurar estar dentro do peso normal, sentir-se satisfeita com as
formas refletidas no espelho é saudável. Contribui para a autoestima, tão
importante nessa e em todas as fases.
O
que exige atenção é a imagem corporal distorcida. Se a menina é magra, tem umas
dobrinhas absolutamente normais na cintura e deu para dizer que está gorda, é preciso
observá-la e tentar entender o que está por trás dessa convicção.
Em
alguns casos (na imensa minoria, felizmente) esse comportamento pode ser indício
de transtornos alimentares graves como anorexia ou bulimia. Em situações assim,
é fundamental que a menina tenha acompanhamento psiquiátrico.
Quase
sempre, porém, a insatisfação com o próprio corpo não se transforma numa
patologia tão grave. Ainda assim, é um martírio que começa na pré-adolescência
e não tem data para acabar.
Descobri
isso nesta semana. Sempre achei que a excessiva preocupação com o corpo fosse
suavizada pelo tempo. Para algumas mulheres, vale a previsão da vovó: “quando
casar sara”. Outras continuam bastante preocupadas mesmo depois do casamento,
mas a maturidade costuma levar a vários tipos de libertação – inclusive contra
os padrões de beleza inatingíveis. Aí a imagem corporal deixa de ser distorcida
para se colocar no eixo da realidade.
Parece
que não é bem assim. Pelo menos essa foi a conclusão de um estudo divulgado
pela Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. Segundo voluntárias
ouvidas em todo o país, sentir-se gorda é uma insegurança da qual a mulher
nunca se livra. Mesmo quando o peso dela é considerado normal.
A
pesquisa foi realizada com 1.800 mulheres com idade média de 59 anos. No grupo
acima dos 50, a maioria (62%) disse que o peso ou as formas do corpo têm um
impacto negativo sobre a qualidade de vida. E muitas têm transtornos
alimentares.
Dois
terços da mulheres disseram pensar em peso diariamente. Mais de 40% olham no
espelho todos os dias com a intenção de ver se engordaram. A mesma parcela sobe
na balança mais de uma vez por semana. Cerca de 3% relataram sofrer de compulsão
alimentar, 8% usam laxantes. Nos últimos cinco anos, 36% das mulheres passaram
metade do tempo fazendo dieta.
Elas
usam vários métodos pouco saudáveis na tentativa de perder peso: pílulas
milagrosas (7,5%), excesso de atividade física (7%), diuréticos (2,5%), vômitos
(1%). Esse comportamento foi relatado inclusive por mulheres de 75 anos ou mais.
“O
esteriótipo é acreditar que transtornos alimentaress são problemas de
adolescentes e de mulheres jovens, mas a realidade é outra”, diz Cynthia Bulik,
diretora do programa de transtornos alimentares da Universidade da Carolina do
Norte.”Muitas desenvolvem transtornos alimentares pela primeira vez depois dos 50
anos”.
Para
muitas dessas mulheres, as causas dos problemas são grandes mudanças
familiares, como divórcio, perda do companheiro, ausência dos filhos e perda do
emprego. “Muitas mulheres estão encarando uma incerteza financeira que elas
nunca pensaram que enfrentariam nessa idade”, diz Bulik.
Tão
importante quanto essas, uma causa fundamental é a pressão cultural para
parecer jovem para sempre. São tantos produtos, cirurgias, procedimentos
destinados a impedir que o mundo veja a mais natural das rugas...Se a mulher se
deixa envolver por essa teia, é possível que acabe escrava de comportamentos
nada saudáveis de controle de peso ou de bizarrices estéticas.
A
equipe de Bulik ressalta que esses problemas precisam estar no radar dos médicos.
“Muitos não pensam na possibilidade de uma mulher acima dos 50 estar sofrendo
de transtornos alimentares”, diz. “Metade das nossas pacientes têm mais de 30
anos. Há dez anos não era assim”.
Pensar
no assunto pode ajudar as mulheres a observar os próprios hábitos e a ensaiar a
libertação. Ninguém precisa se submeter aos padrões amalucados de beleza para
se sentir bonita, desejável e querida.
Se
muitas mulheres se submetem aos padrões e lutam contra a própria natureza, por
outro lado o sentimento de rebeldia é cada vez mais presente e mobilizador. As
ruas e as praias do Brasil estão cheias de gordinhas vestidas com estampas,
cores, decotes generosos. Abandonaram o preto e assumiram o corpo que têm e a
beleza que há nele. Estão desavergonhadas – e isso é bom.
Não
se trata de fazer apologia da obesidade. Excesso de peso é um problemaço,
responsável por terríveis doenças como problemas cardiovasculares, câncer e uma
lista gigantesca de outros males. Mas ser gorda, infeliz e reprimida só piora a
situação. Uma boa forma de responder às cobranças sociais é investir em amor próprio,
liberdade e cores. Muitas cores.
E
você?
Acha
que mulheres de todas as idades sofrem com imagem corporal distorcida? Como
lidar com isso e com o preconceito contra as gordinhas? Queremos ouvir sua história.
Cristiane
Segatto
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