26 de junho de 2012 | N° 17112
CLÁUDIO MORENO
Homens e mulheres (16)
37 - O século 17 ficou famoso pelas fascinantes
mulheres que reuniu. Ousadas e sedutoras, acrescentaram à sensibilidade natural
de seu sexo uma formação intelectual e uma independência pessoal incomuns no
mundo feminino até então. Nas suas memórias – todas escreviam, e muito! –, há
valiosos registros de opiniões e impressões sinceras e corajosas destas
mulheres sobre si mesmas e sobre seu assunto favorito, o amor e os homens.
Uma das Condessas de Salisbury, que há muito
deixara para trás a mocidade, foi convocada a depor na Casa dos Lordes, num
processo de crime passional cuja acusada regulava mais ou menos com ela em
idade.
A estratégia da defesa para inocentar a ré era
muito simples: o depoimento da condessa, que já tinha mais de 75 anos, serviria
para provar que as paixões iam se extinguindo com o passar do tempo, até perder
completamente seu efeito sobre as ações humanas.
O testemunho da condessa, no entanto,
arrastava-se em declarações vagas e evasivas, até que o próprio juiz,
impaciente, formulou a questão do modo mais explícito possível: “Madame,
queremos saber em que idade o sentimento, a paixão, o desejo de amar abandona o
coração das mulheres!”.
A condessa, então, que sempre tinha sido uma
das figuras de destaque do “grand monde”, convivendo com todas as elegantes e
coquetes da corte inglesa – dizia-se, aliás, que ela própria estava longe de
ser uma santa –, ficou cabisbaixa por alguns segundos, pensativa, como se
examinasse a ponta dos sapatos; depois, olhou bem nos olhos do juiz e declarou,
serenamente: “Excelência, acho que o senhor deveria perguntar para uma mulher
mais velha do que eu”.
38 - Ortega y Gasset ainda não era filósofo nem
famoso quando viajou da Argentina à Espanha num navio de linha.
A bordo, pôde conviver, encantado, com um grupo
de jovens turistas americanas e, embora não se tornasse íntimo de nenhuma,
dirigia-se a cada uma delas de um modo cortês e galanteador – “como um homem
fala com uma mulher que se encontra na plenitude de seus atributos femininos”.
Pois uma delas, sentindo-se ofendida por aquelas atenções especiais, exigiu
literalmente que ele a tratasse como a qualquer outro ser humano.
Ao se dar conta, atônito, de que a americana
mostrava-se extremamente modesta ao sugerir que houvesse algo mais importante
do que ser uma mulher, Ortega respondeu com aquele estilo que o tornaria
inconfundível: “Não conheço esse personagem que você chama de ser humano. Só
conheço homens e mulheres. Como quis a Fortuna que você não fosse um homem, mas
uma mulher – e uma bela mulher, sem dúvida –, tento me comportar à altura”.
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