27 de junho de 2012 | N°
17113
ARTIGOS ZH - Luiz Fernando
Cabeda*
O juiz encurralado
Os episódios e detalhes que são
revelados a cada semana da Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, conseguem
surpreender até quem já está muito cansado de ver a ousadia com que grupos
criminosos bem articulados tomam de assalto bens e programas públicos,
especialmente aqueles que orientam políticas de ação social.
O fato mais recente foi o
afastamento do juiz da causa que exerceu o controle jurisdicional das
investigações policiais que se estenderam por um ano e meio em Goiás.
Ele reconheceu que não tinha mais
condições de atuar no caso por estar exposto às ações dos criminosos. Sua
atitude surpreendente decorreu principalmente de dois fatos: seus pais foram
visitados por policiais ligados aos crimes, que, com isso, fizeram ver que a
família do magistrado estava vulnerável a represálias, ainda que ele próprio já
dispusesse de escolta armada e carro blindado.
Segundo, o relator da ação de
habeas corpus no Tribunal Regional Federal concedeu liberdade ao mentor do
bando, Carlos Cachoeira, e ainda votou pela anulação de toda a investigação, já
que as escutas telefônicas, que tiveram trechos amplamente divulgados pela
televisão, foram consideradas insuficientemente fundamentadas. Desqualificou a
prova, ainda que ela tenha mostrado um resultado estarrecedor.
A libertação do preso só não se
consumou porque ele é acusado por outro motivo, estabelecido pela polícia e
pelo Judiciário do Distrito Federal. Também a anulação do inquérito da Polícia
Federal foi obstada, em virtude do voto de dois juízes que o legitimaram, por
ora. Até que surja outro Napoleão de birô querendo reescrever a derrota de
Waterloo.
Faz muito pouco tempo que a juíza
Patrícia Acioli foi assassinada. Pois o poder de fogo do grupo investigado no
Distrito Federal e sua potencial letalidade podem ser avaliados neste pequeno
trecho copiado da ação de habeas corpus:
“São muitos os envolvidos (dois
delegados de Polícia Federal, seis delegados da Polícia Civil, 30 policiais
militares, dentre eles três tenentes-coronéis, um major, um capitão, dois
sargentos, quatro cabos e 18 soldados, um servidor administrativo da Polícia
Federal, um policial rodoviário federal, dois agentes da Polícia Civil e dois
servidores municipais) que fazem parte do esquema delituoso, sob o comando de
Carlinhos Cachoeira...”.
É preciso que o Judiciário encare
de modo sistemático e planejado todas as implicações de sua atuação prática, ao
estabelecer o Direito, o que não se resume a manifestações retóricas sobre
independência institucional que sempre estiveram tão ao gosto dos rebarbativos
retóricos, as chamadas proclamações de gabinete. Isto quer dizer com absoluta
clareza: é preciso encarar o medo do medo.
*Magistrado
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