11
de junho de 2012 | N° 17097
ARTIGOS
- Paulo Brossard*
300%
preparado
Não
faz muito, a honrada senhora presidente da República proclamou que muito se
fala no agravamento da crise que se estende na Europa, mas que ela não
atingiria o Brasil, que ostentava a cômoda situação de estar “300% preparado”
para enfrentar a crise (sic). E, referindo-se aos que, ao seu juízo, apostam
nela, como em 2008, terminarão amargando sua má previsão.
Sua
olímpica posição é absoluta. No entanto, sua equipe econômica, senão a própria
presidente, estaria a examinar a hipótese de terminar o ano com o resultado
primário menor que o projetado que, até ontem, era inquestionável; a implacável
redução da atividade econômica explicaria a mudança.
O
mesmo fenômeno levara-a a encomendar um “choque de investimentos” levando-se em
conta o mau resultado da economia no primeiro trimestre e o agravamento da
crise europeia. Mas nada disse a respeito do tipo de investimentos encomendado,
o que muito importa.
Desnecessário
dizer que nem de longe questiono a sabedoria das posições oficiais, mas também
me parece induvidosa a existência de fatos que não podem ser ignorados nem
menosprezados, como os divulgados pelo IBGE acerca do PIB relativo ao primeiro
trimestre do ano em curso, cujo crescimento se limitou à constrangedora escala
de 0,2%, em relação ao último trimestre do ano passado.
Esse
resultado, qualquer que seja a qualificação que se dê, jamais será bom nem
sequer satisfatório, tanto mais quando se apregoava desde o começo do atual
quadriênio que atingiria 3%, 4%, 6% senão mais.
O
melancólico crescimento de 0,2% levou o BNDES a estimar que o resultado anual
do PIB possa ficar em 2%, o que seria nada brilhante. É verdade que o douto
ministro da Fazenda saltou sobre o mofino 0,2% para prever, olhos cerrados,
que, no já trimestre em curso, o crescimento será extraordinário, de modo a
permitir crescimento consagrador para o ano inteiro, hipótese caprichosa que
nem todos admitem.
Voltando
a terra e à dura realidade, é de lembrar-se que segundo mapeamento do BNDES, nos
próximos quatro anos, os investimentos privados declinarão em R$ 35 bilhões, o
que não é auspicioso. E, embora se apregoe que tudo vai maravilhosamente bem,
empresas de vulto estão adotando medidas que só em tempos adversos são tomadas.
Assim,
por exemplo, em consequência da queda de 20% no mercado de caminhões no ano em
curso, a Mercedes-Benz concluiu acordo com o Sindicato de Metalúrgicos do ABC
para a suspensão, por cinco meses, do contrato de trabalho de 1,5 mil
trabalhadores de sua fábrica do ABC paulista.
Em
50 anos de sua atividade entre nós, é a primeira vez que a empresa se serve
desse mecanismo a fim de evitar a demissão de funcionários, notando-se que já
recorrera a férias coletivas e licenças remuneradas, para contornar a retração
da demanda; saliente-se que tais expedientes têm sido utilizados por outras
empresas de grande porte.
Muito
mais haveria a aditar ao exposto, mas este é bastante para mostrar que não é
por prazer, e seria um prazer mórbido, mas porque alguns efeitos oriundos do Mercado
Comum Europeu ou da China já chegaram e, querendo ou não, já atingiram setores
nada desprezíveis da nossa economia. E queira Deus que fique por aí.
Por
derradeiro, parece-me oportuno ponderar que enquanto o governo está voltado
para a massa de veículos produzida e não vendida, baixando o IPI e alargando o
prazo, descuida dos investimentos que cabe ao poder público implantar e
aumentar, de modo a aparelhar o empreendimento econômico aos tempos novos que
hão de vir.
Isso
sem considerar o pesado endividamento das famílias e a insolvência crescente de
número significativo de adquirentes e sem negar a utilidade de suas
providências, considerando a importância desse setor da economia.
Por
falar em insolvências, deixei de mencionar, o que seria imperdoável, que o
onímodo titular da Fazenda informou que o governo preparava um projeto de lei,
suponho, para acabar com ela... Se tiver êxito, será candidato certo e forte ao
Prêmio Nobel de Economia.
Ainda
bem que podemos dormir tranquilos, uma vez que o nosso país está “300%
preparado” para enfrentar a crise que flagela outros povos...
*JURISTA,
MINISTRO APOSENTADO DO STF
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