ELIO
GASPARI
Apenas uma briga feia de sócios
O
ministro Gilmar Mendes deve romper o segredo de seu litígio com o ex-procurador-geral
O
MINISTRO Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, fez muito bem ao quebrar o
sigilo da conversa que Lula teve com ele no escritório de Nelson Jobim,
catituando a postergação do julgamento do mensalão.
Também
fará bem se pedir à Justiça que levante o segredo em que correu o seu litígio
com o ex-sócio e ex-procurador-geral da República (1981-1985), Inocêncio Mártires
Coelho.
Em 1998,
os dois criaram o Instituto Brasiliense de Direito Público, "conceituado
centro de estudos e reflexões sobre o Direito" que oferece cursos de
graduação, especialização, extensão e mestrado. Neste ano, ele abriu cem vagas
no seu vestibular.
Mendes
e Coelho se desentenderam em 2010 e levaram seu litígio à Justiça. Doze dias
depois da apresentação das razões de Coelho, Mendes solicitou e conseguiu que o
processo tramitasse em segredo de Justiça. O artigo 155 do Código do Processo
Civil informa:
"Os
atos processuais são públicos, correm todavia, em segredo de Justiça os
processos:
1 - Em
que o exigir o interesse público.
2 - Que
dizem respeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversão desta
em divórcio, alimentos e guarda de menores".
O
repórter Leandro Fortes teve acesso a documentos do processo. Se nele há interesse
público envolvido, vai na direção da transparência, não do segredo. Mártires
Coelho dirigia o instituto e foi afastado por Gilmar.
No
processo, seus advogados acusam o ministro de ter exigido que "lhe fosse
dada uma percentagem dos valores doados ao IDP a título de patrocínio para
custear seus eventos extracurriculares, tais como congressos, seminários (...).
O motivo/razão para a cobrança desse 'pedágio' era simples, pelo menos aos
olhos do cobrador: sem o seu inegável prestígio e sua notória influência, ninguém
financiaria tais atividades".
Segundo
o documento, o ministro se disse "cansado de ser garoto-propaganda do IDP".
Atualmente,
o IDP lista 26 "instituições e empresas conveniadas". Entre elas estão
a Câmara dos Deputados, o Ministério do Trabalho, a OAB do Piauí, um Tribunal
Regional do Trabalho e 15 associações e sindicatos de servidores públicos.
Empresa
privada, daquelas que o dono tem que se preocupar com o balanço, nenhuma.
O
processo foi extinto em setembro do ano passado, a pedido de Mártires Coelho. Ele
deixou a sociedade e recebeu R$ 8 milhões. A assessoria de Gilmar Mendes
informou que irregularidades detectadas numa auditoria feita no IDP "foram
sanadas" e o dinheiro pago ao ex-sócio, obtido por meio de um empréstimo
bancário.
A
essa altura, com a divulgação das razões dos advogados de Inocêncio Mártires
Coelho, o segredo de Justiça tornou-se um ônus para Gilmar Mendes e nunca é demais
repetir o juiz Louis Brandeis, da Corte Suprema dos Estados Unidos: "A luz
do sol é o melhor desinfetante". (Sabendo que a Corte Suprema pagava
pouco, Brandeis resolveu ficar rico antes de ir para lá.)
Um
ex-procurador-geral da República e um ministro do Supremo Tribunal não
organizam um educandário comercial sem amparo nas leis. Quando esse educandário
firma convênios com entidades públicas, deve ter sido achada base legal para
fazê-lo. Tudo bem, mas é mais fácil um juiz do Tribunal Constitucional da
Alemanha ou da Corte Suprema dos Estados Unidos se associar a um mágico de
feira antes do que se meter em semelhante iniciativa.
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