25 de junho de 2012 | N° 17111
ARTIGOS - Paulo Brossard*
Os
aloprados
Se não estou em erro, nas eleições de 2006, ocorreu um fato
inédito, a negociação de “dossiê” supostamente comprometedor de um candidato ao
governo de São Paulo.
Segundo informações da polícia divulgadas pela imprensa, a
peça em referência fora elaborada por dois sedizentes empresários estabelecidos
em Cuiabá e oferecida ao “então chefe do Grupo de Informações do PT, Jorge
Lorenzetti”, que, por sua vez, credenciou dois militantes para examinar os
documentos oferecidos e encaminhar a negociação;
parece que tudo se processou nesse sentido, uma vez que, já
em São Paulo, no Hotel Ibis Aeroporto, reuniram-se vendedores e compradores,
estes levando consigo o preço avençado de R$ 1.700.000 – um milhão e setecentos
mil reais, quando, “na madrugada de 15 de setembro”, no mencionado hotel, a
presença da Polícia Federal causou a dispersão da reunião, restando no local a
massa de dinheiro destinada ao pagamento do “dossiê”.
O fato, por sua evidente gravidade, chegou ao conhecimento
do então presidente da República, Luiz Inácio da Silva, o qual minimizou o caso
e como se fosse de somenos disse que era coisa de “aloprados”. Recorrendo a
esse vocábulo da gíria que tem, entre outros, o sentido de amalucado ou meio
irresponsável... nisso ficou, e o vocábulo presidencial correu mundo. E, por incrível
que possa parecer, não se falou mais no assunto e em branca nuvem se passaram
seis anos! Os aloprados marcaram presença na cidade das letras.
Passados seis anos, o caso voltou à tona. Ainda, pela
imprensa, se ficou a saber que o Ministério Público Federal oferecera denúncia
contra nove aloprados compradores e não sei quantos vendedores do “dossiê”, e o
juiz competente da 7ª Vara Criminal da Justiça Federal do Estado de Mato Grosso
recebeu a denúncia.
Este o resumo dos dados, aliás, já divulgados, que dão ideia
da insigne gravidade registrada entre nós e só depois de seis anos ressuscita
do túmulo em que jazia, podendo comprometer o processo partidário e parlamentar
e, em consequência a representação popular, envenenando a higidez dos poderes
Executivo e Legislativo. Esse o aspecto, sobre todos, que a mim mais
impressiona. A demora, seis anos, a despeito da objetividade dos fatos, foi
mais que exagerada e evidentemente nociva à decência institucional.
De outro lado, quem recorre a esse expediente para ter uma
vantagem eleitoral, uma vez eleito, terá escrúpulo em cometer uma ilicitude
ainda que graúda? Vale lembrar que o então candidato, que seria o beneficiário
deste expediente, é hoje o ministro da Educação.
Quer dizer, essa prática, tolerada por ser coisa de
aloprados, vicia e contamina o exercício da política, que há de ser limpa e
nobre ou não será política. Se os aloprados, na designação presidencial,
possuem a habilidade de juntar R$ 1,7 milhão num repente, não devem ser tão
aloprados como disse o passado chefe do governo.
Com efeito, o fato de terem abandonado no hotel a dinheirama
levada para pagamento do “dossiê”, está a mostrar que só podem ser afeitos a
dispor de somas fartas, ou os aloprados de aloprados não têm nada... O fato é
lamentável sob todos os aspectos e tanto mais surpreendente quando o episódio
teve como cenário o “Partido dos Trabalhadores”, e o trabalhador sabe o que custa
de trabalho, zelo, competência profissional e dedicação para embolsar o seu
salário, honradamente havido.
*Jurista, ministro aposentado do STF
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