ELIANE
CANTANHÊDE
Como não se fazem mais
BRASÍLIA
- De uma família abastada de Caruaru (PE), Fernando Lyra poderia ter sido
empresário, advogado rico ou viver dos louros e lucros da companhia do pai. Não
só optou pela política como desdenhou o conforto da Arena e aderiu com paixão
ao MDB.
Ele,
aliás, sempre foi um apaixonado. Foi assim que articulou o Grupo Autêntico do
MDB, num momento em que o regime só autorizava o bipartidarismo, o sim ou não. Quis
o não de fato, aguerrido, foi além do não de fachada, consentido.
Lutou
ao lado de grandes nomes -como Alencar Furtado, Francisco Pinto e Lysâneas
Maciel, cassados pelo regime-, aproveitando brechas como a anticandidatura de
Ulysses Guimarães nos anos 1970 e as Diretas-Já, na década seguinte.
Bacharel
formado em Caruaru, o forte de Fernando Lyra nunca foi a teoria, mas a prática.
Tinha uma inteligência política rara, aliada a uma simpatia pessoal que abria
portas e foi de grande utilidade ao construir pontes e definir alianças.
Derrotadas
as diretas, em 1984, dedicou a paixão ao plano B: a eleição indireta de
Tancredo Neves. Os "autênticos" torciam o nariz, mas ele soube
digerir a realidade: a oposição não teria chance com um adversário frontal dos
militares, como Ulysses, mas, sim, com um moderado que unisse a oposição e atraísse
os dissidentes do regime. Alguém melhor do que a raposa mineira do antigo PSD?
Impossível.
A
Fernando Lyra coube seduzir a esquerda, o que lhe valeu o Ministério da Justiça
da Nova República. Acabou com a censura (seu grande orgulho) e deixou para a
história uma definição impecável do velho adversário e então seu chefe, José Sarney:
"a vanguarda do atraso".
Assim
como enfrentou os militares sem ser cassado e aderiu a Tancredo sem deixar de
ser autêntico, Fernando Lyra sobreviveu 35 anos a um infarto, sem perder a
inteligência política, a paixão e a simpatia. Ótimo político, grande figura.
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