27
de fevereiro de 2013 | N° 17356
MARTHA
MEDEIROS
Infiltrações
“Aqui
tudo parece que é ainda construção, e já é ruína”.
Conversava
com um amigo sobre o vexame que foi a abertura daquele buraco no conduto
Álvares Chaves na semana passada, durante um dos temporais mais enérgicos
ocorridos em Porto Alegre, e nos veio à lembrança essa parte da letra da música
Fora da Ordem, do Caetano Veloso.
Não
é o caso de tratar desse assunto isoladamente (por mais absurdo que seja o fato
de um investimento tão alto numa obra de drenagem resistir apenas quatro anos),
mas de analisarmos o contexto todo: vivemos num país maquiado, em que se as
coisas “parecerem” benfeitas, já está ótimo.
A
Arena também serviria como exemplo de uma obra entregue às pressas para cumprir
calendário, mesmo sem condições básicas de uso. Mas também não pode ser visto
como um caso isolado. Há outras tantas em andamento, todas com prazo máximo de
15 meses para serem concluídas (até o início da Copa), e me pergunto: o
corre-corre não comprometerá o bom acabamento de viadutos, pontes, prédios e
estradas?
Com
a intenção de viabilizar orçamentos, não se estará sacrificando a qualidade do
material empregado? Os funcionários em atividade estão bem preparados ou fazem
um serviço matado, a toque de caixa? Dá pra confiar na espinha dorsal do
Brasil?
Há
que se ter cuidado com infiltrações. De todos os tipos, aliás. Com a
infiltração de inconsequentes em meio a uma torcida, capazes de disparar um
artefato com poder destrutivo em direção a outras pessoas, sem levar em conta
que o gesto poderá ferir gravemente alguém ou até mesmo matar – como matou o
garoto boliviano de 14 anos.
Com
a infiltração de médicos e enfermeiros sem ética dentro de hospitais, que
desligam aparelhos que mantêm vivos os pacientes, a fim de “desentulhar a UTI”.
Com a infiltração de políticos desonestos nas entranhas do poder, que mesmo
acusados por crimes diversos assumem cargos de presidência de instituições.
Por
fora, bela viola. O Brasil hoje é visto como um país moderno e estável. É uma
aposta mundial considerada certeira, um candidato VIP a juntar-se às
superpotências. Mas como andará o esqueleto desse país que se declara tão
sólido? Na verdade, o Brasil é um jovem com osteoporose precoce, um país descalcificado,
que fica em pé à custa de aparências, comprometido com sua imagem pública, mas
que segue com uma infraestrutura em frangalhos.
Aqui
pouco se investe seriamente em educação, em treinamento de pessoal, em
qualificação de mão de obra, em fiscalização, em responsabilidade social, tudo
o que alicerça de fato uma nação. Nossa mentalidade “espertinha” faz com que
não gastemos muito dinheiro com o que fica oculto, com o que não dá para
exibir. O resultado? Por dentro, pão bolorento.
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