10 de fevereiro de 2013
| N° 17339
CLAUDIA TAJES
Coisas de lá e de cá
A nossa jornada não estará
completa até que todas as nossas crianças, desde as ruas de Detroit até às
montanhas da Appalachia às ruas pacatas de Newtown, saibam que as protegemos e
acarinhamos, e que não permitiremos que lhes façam mal. Trecho do discurso do
Obama na sua segunda posse como presidente dos Estados Unidos.
Ah, se o Obama andasse pelo
centro de Porto Alegre. É triste ver o bando de indiozinhos que esmola por lá.
Sentadas no chão, as mães índias ainda meninas seguram seus bebês no colo,
enquanto os outros muitos filhos correm entre as pessoas.
Talvez quem circule
rotineiramente pela Rua da Praia e arredores nem note mais, mas, para um
visitante eventual, o quadro é chocante. Na segunda-feira, um gurizinho de, no
máximo, cinco anos pedia comida ou moedas. Insistente, levou um cascudo de um
homem de pasta e cabelo pintado de preto. Como dizia o meu pai: isso tem tudo
para dar errado. Como diria o Obama: falta muito para completar a nossa
jornada.
Mundo, mundo, vasto mundo. O
americano Justin Jedlica, de 32 anos, fez mais de 90 operações plásticas para
ficar igual ao Ken, o boneco que namora a Barbie. Nada mais previsível do que
encontrar, em um evento patrocinado, a ucraniana Valeria Lukyanova, de 21 anos,
que gastou um milhão e meio de dólares para ficar igual à boneca da cintura
fina.
Quando alguns já se perguntavam
que espécie de bebê o novo par geraria (talvez o Manequinho da Estrela, o
boneco que tinha pipi e fazia xixi), Justin dispensou Valeria com a seguinte justificativa:
ela é muito artificial. Pior que, pela foto, o Justin de hoje se parece mais
com a cantora Rosana, aquela de “Como Uma Deusa”, que com o Ken. Acho que vai
precisar de mais cirurgias.
A maravilha de existir tanto
autor bom é que, a cada dia, a gente pode encontrar o melhor livro do ano.
Neste domingo, o meu é Teoria Geral do Esquecimento, do angolano José Eduardo
Agualusa.
Em poucas linhas: na Luanda de
1975, para escapar da guerra civil e do medo que a acompanhou desde sempre, a
portuguesa Ludovica ergue uma parede separando o seu apartamento do resto do
prédio. E do mundo. Ali fica durante durante 28 anos, apenas com um cachorro
chamado Fantasma, livros lidos e relidos, seus poemas e a fome a rondar. Uma
frase: “Poupo na comida, na água, no fogo e nos adjetivos”.
Desculpe a pretensão, mas acho
que descobri a razão para o péssimo atendimento dos zero-oitocentos e dos
quatro-mil-e-etc para os quais o pobre do consumidor é obrigado a ligar a fim
de resolver assuntos com companhias diversas. Com grande visão de negócios,
essas empresas contratam mulheres com TPM aguda para trabalhar em seus call
centers. É a única explicação. E mais: em um lance de gênio, são contratados
também homens que sofrem de TPM.
Assim, os dias de fúria, em que a
regra é tornar as coisas ainda mais difíceis do que as operadoras de telefonia
e as prestadoras de serviço em geral já tornam, são criativamente aproveitados
no atendimento ao cliente. E talvez lancem uma luz sobre a capacidade de
complicar tudo das/dos atendentes. Se não for isso, o jeito é chamar um
exorcista, porque nem o Procon nos salva. Um pequeno exemplo.
“Protocolo meia meia meia mole
meia dura, Solange na linha, falo com quem? (...) Pois não, senhora Maria, em
que posso ajudá-la? (...) A senhora precisa cancelar a linha de telefone do seu
avô, correto? (...) Por qual motivo? (...) Falecimento, entendo. Senhora Maria,
eu preciso confirmar alguns dados do seu avô, certo? Nome completo? (...) RG?
(...) CPF? (...) Data de nascimento? (...) Peso? (...) Altura? (...) Tipo
sanguíneo? (...) Quantidade de relações sexuais por semana? (...) A senhora não
sabe? Nesse caso, nós não podemos prosseguir com o seu atendimento, senhora
Maria. (...)
Essa exigência é para a sua
própria segurança. (...) Ocorre que essa é a regra da nossa empresa no mundo
todo, senhora Maria. A solução seria o seu avô ligar pessoalmente para estar
fazendo a solicitação de cancelamento... Entendo que ele faleceu, senhora
Maria, mas sem isso fica impossível abrir o processo. Posso ajudá-la em mais
alguma coisa, senhora Maria? A FDP agradece a sua ligação e lhe deseja um bom
dia, senhora Maria.”
Para quem gosta, que este seja um
Carnaval de paz. Para quem não gosta, só a paz já está de bom tamanho.
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