DANUZA
LEÃO
Não chore,
Guilhermina
Ser
rejeitado pelo Country é o castigo por querer pertencer ao clube mais gagá do
Brasil
Passei
a detestar clubes desde o dia em que, há muitos anos, presenciei uma conversa
entre alguns sócios de um famoso clube do Rio, o Country. Nesse tempo a
garotada tinha a mania de roubar carros, dar umas voltas no quarteirão e depois
largá-los em qualquer lugar. Detalhe: não eram ladrões, apenas adolescentes
brincando de transgredir.
Só que
nesse dia a polícia viu, e foi atrás; os meninos, apavorados, entraram no
estacionamento do Country (eram filhos de sócios), e a polícia foi atrás. O
final dessa história não importa, mas nunca esqueci do que ouvi. Segundo esses
sócios, a polícia não tinha o direito de entrar num clube privado, que tal? Foi
a partir daí que comecei a detestar clubes e, mais ainda, os que ditam as
regras dos clubes.
No
Country é assim: a pessoa que pretende ser sócia, em primeiro lugar compra um
título -entre R$ 500.000,00 e R$ 1.000.000,00; depois paga o mico de ter seu
nome estampado num quadro, e se arrisca a pagar um mico ainda maior, o de não
ser aceito (as famosas bolas pretas), e ter que fingir que nada aconteceu.
Ninguém
jamais saberá porque a pessoa levou bola preta, e também jamais saberá quem deu
a(s) bola(s) preta(s). Esse é um ato de covardia, e como no clube ninguém tem
assunto, um prato para os sócios. O alvo predileto dos que votam costuma ser
mulheres solteiras e bonitas; eles sabem, intuitivamente, que a elas jamais
terão acesso. E tem o grupo das mulheres, que pressiona os maridos para votar
contra, porque não querem no clube mulheres solteiras e bonitas, ai ai.
O
Country é um clube decadente, frequentado por pessoas -excetuando algumas
poucas- tão decadentes quanto. Gente que não tem coragem de se expor, e passa a
vida almoçando, jantando, casando, traindo, roubando, dando pequenos golpes
dentro da própria família, protegida pelas paredes do clube; lá tudo pode e
tudo é perdoado, desde que aconteça entre os sócios.
É como se fosse um país
dentro de outro país, com um presidente, seus ministros, suas fronteiras, suas
leis. Não sei onde tem mais mofo, se nos sofás ou nas cabeças desses
frequentadores, que adoram seus privilégios: as piscinas, as quadras de tênis,
a liberdade de assinar as notas para pagar no fim do mês -quando pagam.
Como
os sócios estão, em boa parte, falidos, podem comer seu picadinho -ruim-
lembrando dos velhos tempos. Bom mesmo vai ser no dia em que um deles escrever
um livro contando as histórias do clube, que devem ser de arrepiar, mas vai ser
difícil: quando você fica sócio, passa automaticamente a fazer parte de uma
sociedade secreta, tipo uma máfia, onde a ormetà (voto de silêncio) é sagrada.
Tudo pode -e põe tudo nisso-, desde que seja só entre eles.
Logo
que cheguei de férias soube do affair Guilhermina Guinle, que tentou ser sócia
do clube mas foi bombardeada por bolas pretas. Pensei, pensei, e não entendi.
Por que uma mulher bonita, charmosa, rica, de sucesso, quer ser sócia do
Country? E pensei que, como todos os que já receberam as tais bolas pretas, ela
mereceu: é o castigo de querer pertencer ao clube mais gagá do Brasil.
Dá
para entender que uma pessoa pague uma fortuna pelo título de um clube em que
alguns poucos vão decidir se ela pode frequentá-lo? E é possível alguém querer
frequentar um lugar em que é preciso pedir licença para entrar, e essa
permissão ser dada -ou não- por um pequeno grupo cujo momento de gloria é a
reunião do clube, onde podem dar vazão às suas frustrações e se vingar da vida?
Não dá para entender mes-mo.
Aliás,
seria uma boa ideia desapropriar aquele belo terreno que dá frente para a av.
Vieira Souto e fazer ali um jardim público onde os atuais sócios poderiam ir
dar seus passeios e falar mal da vida dos outros, sem pagar um só tostão.
O
papa se demitiu, os meteoros estão caindo, o mundo se acabando, e o Country
continua acreditando em suas bolas pretas. É de chorar.
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