17
de fevereiro de 2013 | N° 17346
MARTHA
MEDEIROS
Sempre gostei de ver resgatadas
algumas palavras antigas
Vocabulário
vintage
Eu
havia combinado de buscar minha filha na casa de uma amiga por volta das 18h. Pouco
antes desse horário, ela me ligou toda excitada dizendo que haviam resolvido
assistir a um DVD e que alguém havia providenciado marshmallow com morangos e
todas as outras gurias iriam ficar até mais tarde, então, mãe, mamãezinha,
deixa eu ficar mais um pouco!!!
Respondi:
“Tudo bem, me liga quando esse frege terminar”.
Silêncio
abissal do outro lado da linha. Minha filha recuperou seu tom de voz normal e
respondeu um seco: “Tá, eu ligo”. Parecia que tinha recebido a notícia da morte
de um parente.
Assim
que desliguei, não contive o riso. Frege! Minha filha deve ter ficado em estado
de choque. Que língua mamãe estaria falando?
Na
mesma hora, lembrei de uma passagem do ótimo Eles Foram para Petrópolis, livro
que publica uma troca de correspondência virtual entre os jornalistas Ivan
Lessa e Mario Sergio Conti. São textos eletrizantes, inventivos, inteligentes,
que nos fazem matar a saudade de Paulo Francis, de quem os dois sempre foram
amigos, aliás.
Em
certa passagem do livro, eles salientam ser “imprescindível tirar uma
palavrinha lá da cozinha, dar uma limpada, um bom brilho e depois tacar na
cristaleira da sala de jantar para as visitas admirarem”. E concluem: “Uma gíria
e um bordão podem e devem pedir o boné e se mandar. Uma palavra, não.”
Concordo
e dou fé (também tirando da cozinha uma expressão empoeirada). Sempre gostei de
ver resgatadas algumas palavras antigas que, em vez de denunciarem a
decrepitude de quem as escreve, acabam por dar ao texto um ar vintage, que,
como se sabe, é ultramoderno.
Em
vez de dizer que fulana ficou estressada, não é muito mais divertido dizer que
ela teve um faniquito? Temos medo de bandidos, mas simpatizamos com os
pilantras. E quem é aquela dando em cima do seu marido? Uma boa de uma bisca. Vá
lá salvá-lo antes que a sirigaita o leve no bico.Antigamente as expressões eram
mais leves, e leveza hoje é uma qualidade revolucionária.
Esgotado
o tempo regulamentar, busquei minha filha na casa da amiga e vi que seu
cotovelo estava esfolado. “O que aconteceu?”, perguntei quando ela entrou no
carro. “Nada demais, mãe, levei um boléu”. Não era caso pra achar graça, mas
achei.
*
Coluna publicada originalmente em 15 de agosto de 2010. A colunista Martha
Medeiros está em férias.
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