sábado, 16 de fevereiro de 2013



17 de fevereiro de 2013 | N° 17346
MARTHA MEDEIROS

Sempre gostei de ver resgatadas algumas palavras antigas

Vocabulário vintage

Eu havia combinado de buscar minha filha na casa de uma amiga por volta das 18h. Pouco antes desse horário, ela me ligou toda excitada dizendo que haviam resolvido assistir a um DVD e que alguém havia providenciado marshmallow com morangos e todas as outras gurias iriam ficar até mais tarde, então, mãe, mamãezinha, deixa eu ficar mais um pouco!!!

Respondi: “Tudo bem, me liga quando esse frege terminar”.

Silêncio abissal do outro lado da linha. Minha filha recuperou seu tom de voz normal e respondeu um seco: “Tá, eu ligo”. Parecia que tinha recebido a notícia da morte de um parente.

Assim que desliguei, não contive o riso. Frege! Minha filha deve ter ficado em estado de choque. Que língua mamãe estaria falando?

Na mesma hora, lembrei de uma passagem do ótimo Eles Foram para Petrópolis, livro que publica uma troca de correspondência virtual entre os jornalistas Ivan Lessa e Mario Sergio Conti. São textos eletrizantes, inventivos, inteligentes, que nos fazem matar a saudade de Paulo Francis, de quem os dois sempre foram amigos, aliás.

Em certa passagem do livro, eles salientam ser “imprescindível tirar uma palavrinha lá da cozinha, dar uma limpada, um bom brilho e depois tacar na cristaleira da sala de jantar para as visitas admirarem”. E concluem: “Uma gíria e um bordão podem e devem pedir o boné e se mandar. Uma palavra, não.”

Concordo e dou fé (também tirando da cozinha uma expressão empoeirada). Sempre gostei de ver resgatadas algumas palavras antigas que, em vez de denunciarem a decrepitude de quem as escreve, acabam por dar ao texto um ar vintage, que, como se sabe, é ultramoderno.

Em vez de dizer que fulana ficou estressada, não é muito mais divertido dizer que ela teve um faniquito? Temos medo de bandidos, mas simpatizamos com os pilantras. E quem é aquela dando em cima do seu marido? Uma boa de uma bisca. Vá lá salvá-lo antes que a sirigaita o leve no bico.Antigamente as expressões eram mais leves, e leveza hoje é uma qualidade revolucionária.

Esgotado o tempo regulamentar, busquei minha filha na casa da amiga e vi que seu cotovelo estava esfolado. “O que aconteceu?”, perguntei quando ela entrou no carro. “Nada demais, mãe, levei um boléu”. Não era caso pra achar graça, mas achei.

* Coluna publicada originalmente em 15 de agosto de 2010. A colunista Martha Medeiros está em férias.

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