MAURICIO
STYCER
Renovar ou repetir?
Depois
de "Salve Jorge", há alívio no ar com perspectiva de que "Amor à
Vida" seja, ao menos, decente
Neste
ano comemoram-se 50 anos da primeira telenovela exibida de forma diária no
Brasil, "2-5499 Ocupado", um texto argentino adaptado por Dulce
Santucci, com Tarcísio Meira e Glória Menezes como protagonistas, exibida na TV
Excelsior entre julho e setembro de 1963.
Não
cabe aqui descrever a rica história do gênero no Brasil, onde adquiriu uma
especificidade única, nem detalhar as diferentes etapas do seu desenvolvimento,
quase sempre em paralelo com o próprio país.
O
fato é que a novela, desde o início da década de 1970, tornou-se o principal
produto da televisão, e ainda hoje ocupa um espaço notável no cotidiano do
brasileiro.
Item
mais nobre desta indústria, a chamada "novela das oito" (hoje, "das
nove"), da Globo, é uma espécie de instituição nacional há mais de 40 anos.
Mesmo com a audiência em queda, sofrendo a concorrência de outras mídias, ela
permanece como referência em matéria de entretenimento.
Veja,
por exemplo, "Salve Jorge", encerrada há duas semanas, depois de
acumular as mais baixas audiências da história neste horário. O último capítulo
registrou 46 pontos no Ibope (cada ponto equivale a 62 mil domicílios na Grande
São Paulo), sendo responsável por 76% dos aparelhos ligados no horário. Para um
fracasso, os números impressionam.
A
novela de Gloria Perez foi um ponto fora da curva não apenas em matéria de
ibope. "Salve Jorge" destoou, também, de um movimento, que parece em
curso, de renovação do gênero. Mesmo que não tenha uma política clara neste
sentido, a Globo tem apoiado produções nitidamente destinadas a dar um novo
impulso à indústria.
"Cordel
Encantado" (2011), "Avenida Brasil" e "Cheias de Charme",
ambas em 2012, apresentaram novidades interessantes e, em alguns aspectos,
fixaram novos padrões. A primeira mostrou o potencial de uma história mágica
filmada com técnicas de cinema. A segunda introduziu padrão de seriado
americano em um novelão. E a terceira contou uma história infantil em ritmo de
internet.
Não
bastasse, os três folhetins chamaram a atenção pela qualidade dos textos, o
cuidado com a produção e os elencos bem dirigidos.
"Avenida
Brasil" e "Cheias de Charme", cada uma à sua maneira,
conseguiram ainda retratar o fenômeno de mobilidade social vivido pelo país nos
últimos anos.
Exibida
logo depois de "Avenida Brasil", "Salve Jorge" passou a
impressão de ser uma novela do século passado. Fiel ao estilo que a notabilizou
a partir da década de 1990, Gloria Perez propôs, mais uma vez, o que a crítica
Esther Hamburger chama de "novelas de intervenção" ""histórias
calcadas em situações reais, destinadas a mobilizar a população e prestar serviços""
sem se dar conta de que isso já não é mais tão necessário nos dias de hoje.
Depois
deste "desastre" há um clima de alívio no ar com a perspectiva de que
"Amor à Vida" seja, ao menos, uma novela decente.
Walcyr
Carrasco está imprimindo ritmo alucinante à trama, o que mostra sensibilidade às
demandas do espectador atual. Também tem recorrido a diferentes "golpes
baixos" (vilão gay, discurso contra aborto, participação especial de
Neymar), mas parece-me não ter nada de novo a dizer. Seu objetivo, dá a
entender, é apenas o de recuperar a audiência perdida por "Salve Jorge".
mauriciostycer@uol.com.br
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