quinta-feira, 27 de junho de 2013

josé luiz portella

 

27/06/2013 - 03h00

Manifestações: agora é fazer

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Estamos diante da realidade mais difícil para nós: fazer. Fazer bem feito. A rua mostrou as insatisfações. Cabe resolvê-las.
O Brasil tem energia, capacidade de improviso, criatividade, decisão rápida. Que, muitas vezes, por atropelar o tempo mínimo necessário para um bom projeto, leva à má execução.
Diferentemente dos orientais, que pensam muito, demoram na decisão, passam por várias instâncias, são minuciosos na confecção do plano de implementação, nós vamos rápido demais nessas fases. Só que, na implantação, eles são rápidos e precisos. Nós, lentos e imprecisos.

De cara, é fundamental que, entre tantas reivindicações, saibamos PRIORIZAR. Que é outro ponto fraco que temos. Priorizar quer dizer escolher o que deve vir primeiro. Selecionar, entre tantas coisas importantes, as que terão a primazia de atendimento.
Em geral, nossos gestores públicos, privados e os parlamentares confundem prioridade com relevância.

Se alguém diz que vai começar pela saúde, o outro replica: "Mas educação também é prioridade. E a habitação, o transporte, a segurança, também o são". Na verdade, há muita coisa importante em um país ainda tão carente como o nosso. O segredo e a coragem do governante é decidir o que fazer primeiro. Isso implica exclusão.
Dentre os importantes, escolher quem vem antes.

350 km de metrô = ao Trem de Alta Velocidade. Metrô vem bem antes do que TAV. Porque não dá para fazer tudo ao mesmo tempo. O recurso escasso é o dinheiro. A grana não é infinita. Você pode escolher subsidiar mais ou menos o transporte. Isso significa diminuir os recursos para o investimento. A escolha vai resultar em transporte mais barato, e ruim por mais tempo.

Quanto menos nele se investe, mais apertado fica, mais velho, sem reposição. Quebra mais, não melhora. Para a população mais vulnerável e carente, que sofre mais quando se mobiliza, que tem vale transporte, bilhete único, paga meia como estudante, a prioridade é mais: metrô, corredores de ônibus, emprego na periferia, integração do sistema. É melhor investir mantendo uma tarifa acessível. Tarifa zero impede o investimento. É uma escolha.
Friedrich Nietzsche, bom filósofo, dizia que não existem fatos, só interpretações.

As manifestações trazem toda sorte de reclamos e sentimentos que cada um pode interpretar como quiser. Pode-se ficar esmiuçando o que as manifestações significam e querem dizer.

Nada contra. Isso permite visão de futuro mais acurada. Contudo, nada nos impede - nem deve impedir - que solucionemos, de imediato, as questões que já estão postas, como a reforma política e a mobilidade nas grandes cidades. " Vontade política" é condição necessária mas insuficiente.

Sobretudo precisamos optar pelo melhor caminho de implantação das melhorias. É o tal de planejamento. Que pode ser ágil, mas sem perder a qualidade. Foi o que não ocorreu com a Copa do Mundo, que é bom mau exemplo. Escolhidos como sede, tínhamos tudo para planejá-la de modo a ser a grande referência de mudança nas grandes cidades. Especialmente nos transportes.

Foram milhares de discursos vazios, cheios de espetáculo. Deixaram Ricardo Teixeira e seus aliados, instalados no Comitê de Organização, fazer o que queriam, quando estava em jogo um projeto do país.

Autoridades de todos os níveis e esferas, parlamentares e parte minoritária da imprensa, engoliram a bazófia de Teixeira de que seria uma copa da iniciativa privada, sem dinheiro público em estádios. Apenas na infraestrutura urbana. Há mais de 6,8 bilhões de dinheiro público. A maior parte em estádios. E Teixeira caiu fora, docemente.
Felipe Trueba/Efe
A arena Pernambuco é nova e moderna. Mas para chegar até ela só tem uma linha de ônibus e o terminal não tem nenhuma sinalização para a Copa das Confederações
A arena Pernambuco é nova e moderna. Mas para chegar até ela só tem uma linha de ônibus e o terminal não tem nenhuma sinalização para a Copa das Confederações

Tivéssemos planejado direito, estaríamos com bom sistema de transporte e sem estádios elefantes brancos. Nas manifestações, a pauta primeira não seria a mobilidade. Outro erro é achar que as coisas se resolvem só com os planos. Temos vários. Nas gavetas.É preciso saber implantar. E operar.

Ter um projeto de implantação é prioritário. Somos piores na implantação do que nos planos. E temos mais dificuldades ainda em operar. Quer dizer, manter a coisa funcionando.
Inaugurar hospitais e escolas não é tão difícil. São obras. Operar e mantê-los como se deve é que são elas.

Ótimo que a insatisfação tenha vindo à tona. Só o inconformismo muda. Todavia, não devemos perder outra chance. A hora para planejar e implantar o que estamos querendo é agora. De fazer bem feito.

Depois de tanto tempo dormindo, ao nos despertarmos, cabe-nos enfrentar nosso maior obstáculo: ter disciplina, persistência e prazer de ver a coisa funcionar.
Luiz Carlos Murauskas - 6.dez.2007/Folhapress

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